Setembro é normalmente o início do período de planejar o futuro dos negócios, fazer estimativas de investimentos, determinar metas e projetos prioritários para o próximo ano.

O processo de preparação do plano anual dura normalmente entre dois e quatro meses, dependendo da complexidade da empresa. Debates, brainstormings, desenho de cenários, contratação de consultorias. Enfim, apresentações e analises são geradas na tentativa de chegar a uma proposta de resultado para o ano seguinte.

Atuei como CEO de três empresas de segmentos distintos e percebo que a dinâmica do processo é bem semelhante. Charts e seus respectivos anexos são orquestrados com o objetivo de aprovar um plano entre os diversos stakeholders.

Em um contexto “normal”, fazer este plano detalhado não é uma tarefa simples. Agora imagina no atual cenário global em que há mais dúvidas do que certezas. Quem nunca desejou ter uma bola de cristal?

A necessidade humana de querer prever o futuro é antiga. Penso, porém, que neste momento nebuloso, o papel dos conselheiros se torna ainda mais relevante em ajudar o time de liderança a refletir sobre o impacto das escolhas.

Independentemente se você atua em Conselhos de Administração ou Consultivo de empresa de capital aberto, fechado, familiar de grande ou pequeno porte, acredito que existem três perguntas que podem contribuir para a construção de um orçamento mais robusto para 2021.

São elas:

1) O que podemos melhorar, deletar e acrescentar?

O ano de 2020 colocou a prova todas as indústrias e setores. Fomos impactados de alguma forma. O mundo experimentou acertar e errar no menor espaço de tempo. Agilidade foi a palavra de ordem.

Nas minhas interações em conselhos e mentorias para startups, temas comuns que tem demandado um olhar de lupa para serem turbinados são: produtividade da cadeia logística e de suprimentos; eficiência da área comercial; ou então a simplificação da organização e dos processos para ganhar eficiência.

As empresas que incorporam velocidade ao modus operandi vão demandar menos reuniões, maior foco, menos níveis hierárquicos e times de trabalho mais enxutos. Colaboradores se tornam cocriadores mais engajados. Isso é uma melhoria importante que a pandemia trouxe a muitas organizações.

Entender quais as iniciativas que ajudam a construir um pensamento de longo prazo e que devem ser adicionadas ao plano é também papel do conselho. Compreender como a transformação digital está sendo endereçada na empresa. Ou, então, como questões Sociais, Ambientais e de Governanca (ESG) estão sendo desdobradas na organização.

E não deixe de dedicar tempo para o pipeline de inovação em produtos, serviços e canais que vão fazer a empresa continuar a agregar valor e ter melhores resultados. São perguntas estratégicas com respostas não óbvias que devem ser discutidas nas reuniões de conselho.

Mapear processos e antigos comportamentos que já não fazem mais sentido e deletá-los, pode deixar a empresa mais leve. Então, não deixe de encorajar o time de liderança a exercer o desapego.

Como conselheiros, estimule o management a criar sua própria lista do que melhorar, acrescentar e deletar em 2021.

2) O que é essencial e quais são as prioridades?

2020 tem sido o ano de fazer de tudo, se virar nos trinta, tentar buscar novos caminhos, alternativas nunca experimentadas. Diria que será o ano em que participamos de vários torneios: basquete, tênis e futebol com a mesma equipe para tentar ganhar algum campeonato.

Depois de ter tentado de tudo para sobreviver, no entanto, chegou o momento de eleger as três prioridades que devem concentrar o foco, os investimentos e o monitoramento preciso da execução.

Em uma mentoria de uma startup, notei que o plano estratégico tinha dezenas de iniciativas em segmentos diversos, literalmente atirando para tudo quanto é lado. Esse é um caminho um tanto perigoso quando não se tem recursos financeiros e pessoas suficientes. “Less is more” voltou com tudo para 2021.

Após definida as prioridades, devemos perguntar se a organização tem as competências e pessoas certas para que o plano seja desafiador, porém exequível. Não adianta colocar o sushiman para fazer a melhor pizza em uma semana. Isso levara tempo e dinheiro. Como conselheiros, devemos estimular a liderança a graduar a empresa e seus talentos frente às novas exigências.

Provocar a (re)descoberta do que é essencial na empresa é também uma missão do conselho.

3) Por que nossos clientes vão continuar comprando da gente?

A maioria dos Conselhos tende a olhar com profundidade questões financeiras como fluxo de caixa, rentabilidade, capex, endividamento, etc. Por outro lado, refletir sobre os planos de marketing e vendas com maior intensidade torna-se importante em um cenário tão incerto.

Por isso, penso que independentemente do background, o conselho pode estimular a liderança a elaborar sobre esses três tópicos:

- Satisfação do Cliente: sabemos que é muito mais caro adquirir novos clientes do que manter uma base fiel que aumente o lifetime value da marca. Hoje, mais do que nunca o tal UPS (unique selling proposition, proposta única de valor) ficou ainda mais relevante para que marcas tenham destaque em um mercado pulverizado. Portanto, fazer a pesquisa de satisfação todos os anos para medir o NPS (Net Promoted Score) da sua marca e do seu principal concorrente é fundamental para ter a visão clara do porque o cliente está satisfeito, quais são os vetores positivos comparado ao seu principal concorrente. Não adianta tirar nota alta se o concorrente tirou nota maior.

- Omnichannel: qual é a estratégia que interliga diferentes canais com o objetivo de estreitar a relação entre online e offline. No varejo é quando há uma convergência do virtual e do físico. Com a pandemia, tivemos experiências diversas com e-commerce e novos padrões foram estabelecidos, inconscientemente. O consumidor está preparado para esperar 10 dias utéis para receber uma mercadoria? Ou então, qual a embalagem de delivery que a empresa enviará o produto? Ela vai surpreender o cliente? São perguntas sobre como ter uma experiência encantadora.

- Causa: Consumidores cada vez mais querem comprar produtos e serviços que aportam uma causa na qual se identificam. Inclusão, diversidade, meio ambiente, ciência, saúde, educação… Enfim, são diversas causas que uma empresa pode se apropriar. E, independentemente da causa escolhida, ela precisa ser verdadeira e coerente com os planos, ações e investimentos da companhia. Empresas com causas fortes tendem a gerar mais valor aos acionistas no longo prazo.

Estas são as três perguntas básicas que conselheiros deveriam incluir durante o processo do budget/orçamento 2021. Parece simples. E realmente são. Porém, lembre-se que simples é diferente de simplório.

Aprendi que como conselheira é muito mais importante fazer perguntas do que dar respostas. Em um mundo em que não existem receitas prontas e há escassez de recursos, perguntas promovem reflexões e ajudam nas melhores escolhas.

*Anna Chaia é conselheira da vivara, Burguer King e mentora Endeavor de startups

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