O alto volume de ações trabalhistas no Brasil encarece significativamente as contratações e promove insegurança jurídica para investidores internacionais, que têm dificuldade em precificar riscos de expansão ou de operação no País. A explicação mais comum para a judicialização em massa passa por uma legislação complexa. Mas, para o advogado e professor Paulo Sérgio João, o verdadeiro estopim está em outro lugar: na mágoa.

Com mais de cinco décadas de atuação e uma carreira marcada pela docência na PUC-SP, Paulo acompanha de perto o que acontece nos corredores dos fóruns trabalhistas. Em sua visão, a forma como as demissões são conduzidas no Brasil continua sendo um dos maiores gatilhos de abertura de processos.

É importante que no momento da saída tenha justificativa de por quê o contrato não vai continuar. No momento da despedida, o trabalhador se sente magoado. O que ele vai dizer em casa? Não sabe o porquê. Isso muitas vezes cria esse volume de litígios que funciona como uma forma de vingança praticamente”, disse em entrevista ao programa Humanamente Possível, do NeoFeed.

Ao comparar a Justiça do Trabalho com um mar de ressentimentos, Paulo defende que “o trabalhador não busca apenas uma indenização”, mas sim uma reparação simbólica e ser ouvido. Por isso, chama atenção para a responsabilidade das lideranças em conduzirem os desligamentos com mais preocupação e humanidade.

Apesar das mudanças trazidas pela reforma trabalhista de 2017 (por exemplo, a imposição de honorários de sucumbência para trabalhadores que perdem a causa), o advogado acredita que a estrutura jurídica brasileira continua baseada num modelo do século passado, mesmo que tenha aberto espaço para relações mais flexíveis.

A Justiça do Trabalho hoje tem muitos processos de motoristas de aplicativo pretendendo vínculo de emprego. E a gente tem constatado cada vez mais que esses trabalhadores não querem ser celetistas, eles querem uma forma de proteção social”.

Outro ponto sensível está no modelo híbrido de trabalho, que ganhou força após a pandemia, mas segue sendo mal aproveitado.

A gente aprendeu que não é a hora que define a produção, é a produção por ela mesmo. Mas eu acho que a gente perdeu a chance de ter um mundo melhor, porque terminou a pandemia, a gente pegou o caderno lá do passado e voltamos a praticar todos os absurdos que eram praticados antigamente”.

Para Paulo, o que pode fidelizar talentos e reduzir a judicialização é o equilíbrio entre produtividade e proteção, flexibilidade e responsabilidade e liberdade com segurança jurídica.