A série “La Casa de Papel”, atualmente em sua quinta e última temporada, já faz parte da cultura pop. Os macacões vermelhos e as máscaras de Salvador Dalí (1904-1989) usados pela gangue se espalharam pelo mundo, principalmente nas festas à fantasia, no Halloween e até mesmo nos protestos de rua.

Um dos títulos em língua não-inglesa mais assistidos da Netflix, visto por cerca de 65 milhões de assinantes, “La Casa de Papel” se tornou um exemplo bem-sucedido de “história local com impacto global.” Mas como reproduzir o fenômeno da série espanhola protagonizada por ladrões que viraram símbolo de resistência no mundo todo? Existe alguma fórmula?

“A proposta é sempre agradar primeiramente ao público do país onde é feita a produção, com identidade, diversidade e representatividade próprias”, afirmou Verónica Fernández, diretora de conteúdo da Netflix na Espanha, durante o Iberseries Platino Industria (IPI), em Madrid, que teve cobertura do NeoFeed. “Quando o resultado é um sucesso global, até nós nos surpreendemos.”

Embora não tenha a receita do sucesso, Verónica deu algumas pistas de como vencer as barreiras culturais na produção de conteúdo. “É mais complicado para o público de outros países entender os códigos de uma comédia, por exemplo”, disse a diretora.

Por que as séries policiais e de suspense, como “La Casa de Papel”, têm apelo mais internacional? “Nós não rimos das mesmas coisas, mas reagimos da mesma maneira, de um modo rápido e intuitivo, diante de ladrões e assassinos”, contou a diretora, no encontro realizado no Matadero, um antigo frigorífico transformado em centro cultural no centro da capital espanhola.

Outro fator também citado por Verónica são as tendências. “Um exemplo é o que aconteceu com os thrillers nórdicos nos últimos anos”, disse ela, referindo-se a séries como “Trapped” (Islândia), “Deadwind” (Finlândia), “The Valhalla Murders” (Islândia) ou “Borderliner” (Noruega).

Hits na Netflix, essas produções geralmente transportam o espectador para lugares gelados, isoladas e sombrios, estabelecendo um ambiente ideal para a aparição de assassinos e criminosos. “São usados aqui códigos mais universais e mais reconhecíveis em qualquer cultura”, comentou Verónica.

Os ladrões com a máscara de Salvador Dali

No caso de “La Casa de Papel”, o colorido espanhol foi fundamental para chamar inicialmente a atenção do espectador de outras partes do planeta. A começar pela escolha da máscara que os ladrões usariam nos assaltos épicos – minuciosamente orquestrados pelo Professor (interpretado por Álvaro Morte).

A imagem do pintor surrealista Dalí, reconhecido mundialmente como um louco genial, deu mais impacto às primeiras cenas de assalto à Casa da Moeda. E o uniforme dos ladrões, os macacões vermelhos, também contribuíram para dar forte identidade à gangue.

O fato de a série criada por Álex Pina ainda ter incorporado a canção italiana antifascista “Bella Ciao” em sua trilha sonora também reforçou a conotação de liberdade e resistência. E isso fez subir a popularidade do programa, sobretudo em países da América Latina, com passado de ditaduras militares.

“Temos uma comunidade criativa enorme na Espanha”, contou Verónica, que acompanha de perto a produção de audiovisual do país. O projeto de “La Casa de Papel” não nasceu na Netflix, mas foi comprado pela plataforma, que lhe deu a visibilidade para virar um fenômeno.

Produzida pela Vancouver Media, a série foi exibida inicialmente em 2017, em canal aberto de TV na Espanha, o Antena 3, com 15 episódios. Apostando no seu potencial, a Netflix comprou os direitos, lançando-a em seu catálogo. Com o sucesso mundial, o serviço de streaming se associou à produtora para a realização de novas temporadas.

E, antes mesmo do final da série, previsto para novembro, a Netflix já prepara uma adaptação sul-coreana, que terá lançamento em todos os mercados. O astro local Yoo Ji-Tae, mais conhecido internacionalmente pelo filme “Oldboy” (2003), de Park Chan-Wook, foi escolhido para encarnar o Professor.

O impacto da gangue espanhola de assaltantes também chegou aos EUA. Ainda que a Netflix não tenha optado por um remake falado em inglês (apesar de algumas especulações), a plataforma vai produzir o que a mídia americana está chamando de “a sucessora de ‘La Casa de Papel’”.

Com a espanhola Paz Vega e o americano Giancarlo Esposito no elenco, a história de “Jigsaw” vai girar em torno desaparecimento de US$ 70 bilhões de uma instituição financeira de Manhattan. E como o enredo da série tem sido apresentado? Como “o maior roubo já realizado”, o que não deixa dúvidas sobre a provável fonte inspiração.