A ascensão do Spotify, passando de uma pequena startup sueca para o maior serviço de streaming de música do mundo, é revisitada na Netflix. Recém-chegada ao catálogo, a minissérie “Som na Faixa” refaz a jornada da empresa que hoje soma mais de 433 milhões de usuários, sendo 188 milhões deles pagantes, e vale US$ 17 bilhões.
Ao reconstruir a trajetória do Spotify, a produção inevitavelmente resgata o que fez do serviço um exemplo de inovação empresarial. Quando a startup surgiu, em 2006, ainda não se acreditava em plataforma para o streaming de música, com acesso instantâneo a milhões de canções.
E muito menos que o serviço pudesse gerar um modelo de negócios, por se tratar de um serviço gratuito. Até porque o Spotify foi uma resposta ao Pirate Bay, que também nasceu na Suécia. A ideia era oferecer algo melhor que o site de compartilhamento de arquivos, mas manter a proposta de não se cobrar por isso (pelo menos não pelo acesso à música).
Dividida em seis episódios, a minissérie registra o período em que a indústria da música mudou para sempre, aderindo à revolução digital – ainda que a contragosto inicialmente. Embora esta transformação fosse vista como inevitável, o processo para garantir investidores e convencer gravadoras foi longo.
Cada um dos episódios conta de uma perspectiva diferente a origem do Spotify – resultado da junção das palavras inglesas “spot” e “identify”. A primeira delas segue os passos do sueco Daniel Ek (interpretado por Edvin Endre), um prodígio na área de Tecnologia da Informação, que iniciou a carreira construindo sites.
Seu maior sonho era trabalhar no Google. Mas, ao se candidatar a um emprego e ser descartado, por não ter curso superior, ele decide montar a própria empresa e competir com os grandes do Vale do Silício. Após se tornar um milionário com a venda da Advertigo, de anúncios online, ele vê uma oportunidade de negócio no segmento da música.
Como a pirataria era um assunto quente naquela época, com os ataques à Pirate Bay por violação de direitos autorais, Ek pensou em um player de música que fosse gratuito, mas muito rápido. E, desde o início, ele queria poder contar com o aval das gravadoras, para não cair na problemática de conteúdo ilegal.
Inicialmente, Ek procura Martin Lorentzon, que se torna sócio e cofundador do Spotify. Interpretado por Christian Hillborg, Lorentzon também ganha um episódio com o seu ponto de vista. Um tipo excêntrico e sem medo de correr riscos, ele financia inicialmente a empreitada e, mais tarde, corre atrás de outros investidores.
Para oferecer mais olhares sobre o nascimento do Spotify, a minissérie também dedica episódios a outros personagens que teriam sido importantes para o sucesso do serviço – presente atualmente em mais de 180 países.
Vemos a história de Andreas Ehn (Joel Lützow), o diretor-chefe de tecnologia da empresa. É ele quem precisa superar todos os obstáculos técnicos relacionados ao streaming. Entre eles, garantir a instantaneidade do acesso à música escolhida, a partir do clique do usuário, algo que inicialmente só se conseguia com um atraso.
Há ainda a ascensão pela ótica de Per Sundin (Ulf Stenburg), executivo da Sony que acaba apoiando Ek e ajuda na transição à era digital. Como Sundin travava batalha contra a pirataria na Suécia, ele viu a solução no Spotify, passando a fazer lobby para o serviço nos EUA, onde foi lançado em 2011, estourando, a partir daí, em popularidade.
Outro episódio traz a visão da advogada Petra Hansson (Gizem Erdogan), que encabeçou todas as difíceis negociações com as gravadoras. A produção apresenta Petra como autora da ideia que assegurou a entrada das gravadoras no projeto.
Como Ek não queria abrir mão da gratuidade do Spotify, ela pensou na possibilidade de o usuário pagar apenar por um serviço premium. Daí nasceu a opção que dá ao assinante a chance de criar as suas listas de reprodução.
“Som na Faixa” foi inspirada em livro investigativo “Spotify Untold”, lançado em 2019 pelos jornalistas Jonas Leijonhufvud e Sven Carlsson. Embora os fatos tenham servido de base aqui, respeitando os principais acontecimentos, trata-se de uma versão com alguns elementos ficcionais.
Até porque a história avança para 2024 em seu último capítulo, trazendo a perspectiva de uma artista inventada. Vivida por Janice Kamya Kavander, Bobbie T. é uma cantora amiga de infância de Ek que se torna uma ativista contra o Spotify. Alegando que o modelo de negócios explora os artistas, com a maior parte da receita acabando nas mãos das gravadoras e do próprio Spotify, ela leva o serviço aos tribunais, em 2026.
O episódio final provavelmente é inspirado nas guerras de artistas contra o Spotify, como Taylor Swift. Em 2014, a cantora americana retirou todas as suas músicas da plataforma por ser contra o modelo gratuito e exigir um pagamento mais justo aos artistas.
Mas o boicote foi apenas temporário. A cantora acabou se rendendo em 2017, recolocando todo o seu catálogo no serviço. Provavelmente por entender que aquele era o futuro da música – o que Ek reforça no desfecho.