Com apenas um de 48 meses de mandato, os sinais emitidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva têm confundido os investidores. Afinal, como será seu terceiro mandato?

Será mais parecido com o primeiro, em que prevaleceu o pragmatismo do lado fiscal, ou mais semelhante aos anos da ex-presidente Dilma Rousseff, com o descontrole das contas públicas?

Enquanto o investidor estrangeiro demonstra certa confiança, acreditando que a retórica sobre o lado fiscal é pior do que o fato em si, os gestores Bruno Coutinho, da MAR Asset, e André Raduan, da Genoa Capital, avaliam que o governo vem emitindo sinais contraditórios entre responsabilidade fiscal e estímulo da economia.

“Saímos divididos da eleição, com o Lula tendo que endereçar sua base, ao mesmo tempo em que ele não pode criar uma crise econômica, porque vai atrapalhar o País e sua governabilidade”, afirmou Raduan na terça-feira, dia 31 de janeiro, durante painel no Latin America Investment Conference (LAIC), evento promovido pelo Credit Suisse.

Segundo o gestor da Genoa, que tem R$ 14,1 bilhões em ativos sob gestão, não dá para imaginar que Lula será “super pragmático” como foi em 2003 no trato das contas públicas, entendendo que ele vai entregar algo “PT raiz”, como aumento do salário mínimo. Ao mesmo tempo, ele vê a equipe econômica tentando controlar a situação, para que não fuja do controle.

“Tem sinais de que freios de arrumação estão sendo colocados, mas vai ser um governo que sempre estará olhando para a base dele”, diz Raduan. “O ruído que estamos vendo é isso, duas comunicações diferentes.”

Coutinho também demonstrou dúvidas sobre o rumo da política econômica do atual governo. Embora não acredite numa ruptura, com descontrole fiscal, ele alertou que caso ocorra uma desaceleração súbita da economia, existe um alto risco de o presidente repetir alguns erros cometidos por sua sucessora, como o uso de bancos públicos para estimular a economia.

“Lula tem uma característica muito parecida com a de Dilma, que é a intolerância com a desaceleração”, disse o gestor da MAR Asset, que tem R$ 2,6 bilhões em ativos sob gestão. “A Dilma apertou todos os botões possíveis para que a essa redução de ritmo não aparecesse, e o que vemos no Lula é algo semelhante, a não aceitação da desaceleração”, completou.

Segundo ele, esse é um movimento natural, que está ocorrendo em todo mundo, depois que as políticas de estímulos monetários e fiscais durante a pandemia tiveram o efeito de acelerar a inflação.

Raduan demonstrou preocupação com as falas de Lula criticando a independência do Banco Central e a meta de inflação, que para 2023 foi estabelecida em 3,25%. Mesmo acreditando que o presidente não gastará capital político para tentar reverter a questão da independência, ele vê com preocupação a ideia de elevar a meta de inflação, avaliando que resultará numa perda de confiança desnecessária do mercado.

“Tem esse arranjo de, por essa via, tentar evitar a desaceleração da economia, mas não existe um trade off, a economia está em desaceleração. E nós estávamos caminhando para o início do corte de juros”, afirmou.

Alocação cautelosa

Diante dessas dúvidas, os dois gestores demonstraram cautela quanto a alocações em renda variável. Coutinho afirmou que a MAR está de olho em nomes em que tem convicção, especialmente em empresas com setores que podem ser consolidados.

Uma delas é a PetroReconcavo, diante das oportunidades apresentadas pela abertura do mercado de gás natural a partir de 2021.

Ele afirmou ainda que está um pouco exposto em nomes sensíveis ao PIB, caso da SBF e da Zamp, avaliando que as ações podem reagir fortemente caso o governo não busque forçar o crescimento da economia. “Essas empresas podem até dobrar de preço”, afirmou.

A Genoa adotou uma postura um pouco mais conservadora, apostando em segmentos de utilities e concessões públicas, sem abrir nomes. “Estamos em empresas que não dependem de crescimento e que não sofrem com juros altos”, disse Raduan.