As pressões do governo federal e, especialmente, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra a política de juros do Banco Central (BC) aparentemente começaram a fazer efeito.
De acordo com o programa WW, da CNN Brasil, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, teria comunicado à equipe econômica do governo Lula que está disposto a aumentar a atual meta de inflação de 3,25% para 3,5%.
O anúncio deve ser feito na reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), que está agendada para a próxima quinta-feira, 16 de fevereiro. O CMN é formado pelo presidente do BC (Roberto Campos Neto) e pelos ministros da Fazenda (Fernando Haddad) e do Planejamento (Simone Tebet).
A assessoria de imprensa do Banco Central não comenta sobre o tema.
Os mercados regiram mal à possível mudança da meta de inflação. O Ibovespa fechou com queda de 1,7%. O dólar, por sua vez, teve alta de 1,59%, com a cotação do dia fechando a R$ 5,27. As curvas médias e longa de juros futuros também subiram.
Uma onde de agentes do mercado financeiro criticou veementemente a proposta de mudança. Todos repetiram, quase em uníssono: quem mexe na meta é porque está disposto a aceitar mais inflação.
“Por que o assalariado brasileiro precisa conviver com inflação mais alta? Não entendo essa lógica”, disse Mario Mesquita, economista-chefe do Itaú Unibanco, em almoço com a imprensa na quarta-feira, 8. “Sobe a meta, sobe a projeção de inflação; é muito provável que isso aconteça", afirmou ele, lembrando que todos os países vizinhos trabalham com metas, como Chile (3%), Colômbia (3%), Peru (2%) e até o México (3%).
O economista Nilson Teixeira, da Macro Capital, corroborou.
"Mudar a meta de 3,25% para 3,5% em 2023 não faz sentido. A projeção do Copom com juros estáveis é de 5,5%. A expectativa é de que a inflação subirá um pouco com essa mudança da meta. Assim, BC não cumpre a meta mesmo se for de 4,0% (tolerância de 1,5 ponto percentual)", escreveu Teixeira, que foi economista-chefe do Credit Suisse, no Twitter.
Perda de credibilidade
O estabelecimento da meta de inflação é atribuição do CMN - que pode redefini-la, seja a deste ano, sejam as próximas, já na semana que vem. Anteriormente, qualquer mudança estava prevista para ocorrer na reunião de junho do órgão.
O recuo de Campos Neto seria uma forma de reduzir a intensa pressão do governo para uma imediata redução de taxa de juros, hoje em 13,75%, e de uma revisão da meta de inflação para um patamar mais alto – deputados do PT falavam em até 4% de inflação como meta.
Ao admitir um aumento da meta para 3,5%, Campos Neto estaria tentando estabelecer um teto para o aumento.
“A mudança da meta, se confirmada, pode corroer a credibilidade do Banco Central, o que prejudicaria a própria política de combate à inflação”, afirma o economista Mauro Rochlin, professor da FGV-RJ.
Ele lembra que um dos pilares do Regime de Metas de Inflação é a credibilidade do BC, que afeta diretamente as expectativas do mercado.
O argumento da equipe econômica do governo é que o Brasil está há dois anos sem cumprir a meta de inflação, e os 3,25% atuais – com banda de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo de tolerância – seriam desproporcionais em relação aos juros de 13,75%, bem mais altos que em outros países do Primeiro Mundo.
“Uma maior leniência com a inflação não ajuda a combatê-la e, por outro lado, rever essa meta estimula o aumento dos juros longos”, acrescenta Rochlin, que coordena os cursos de MBA da FGV.
As pressões sobre Campos Neto pela revisão da meta da inflação cresceram na semana passada, depois que o Copom (Comitê de Política Monetária) – órgão do BC encarregado de estabelecer as diretrizes da política monetária e definir a taxa de juros –, na primeira reunião do ano, decidiu manter os juros em 13,75%.
Em entrevistas e pronunciamentos, o presidente Lula primeiro questionou a independência do BC, assegurada por lei desde 2021, depois atacou a meta atual de inflação. O espaço para discutir a revisão da meta de inflação é mais factível no CMN, onde o governo tem mais peso.
“O que tinha de ser repassado do que ocorreu lá fora, como o preço do petróleo, já foi feito. O importante é manter a inflação sob controle, mas esse tom agressivo do presidente Lula só vai ampliar a má vontade do mercado com o governo”, diz o economista Carlos Honorato, professor da FIA Business School, que considera mal conduzido esse debate sobre a mudança da meta. “Seria preferível negociar.”
A assessoria de imprensa do Ministério da Fazenda distribuiu uma nota declarando "desconhecer a origem da informação e estranha que ela tenha sido divulgada no momento em que o ministro da Fazenda e o presidente da República se encontram em viagem para os Estados Unidos. Sobre a meta da inflação, cabe reafirmar que ela é definida pelo Conselho Monetário Nacional".
A resposta definitiva só virá depois da reunião do CMN no dia 16.