O rápido desenvolvimento de ferramentas de Inteligência Artificial (IA) poderá aumentar a uniformidade e a interconexão dos sistemas financeiros e torná-los mais difíceis de regular. Neste sentido, representam uma ameaça de causar uma crise no mercado financeiro.
O alerta é de Gary Gensler, presidente da Securities and Exchange Commission (SEC), agência independente responsável pela regulação do mercado de capitais dos Estados Unidos.
"Esta tecnologia estará no centro de futuras crises financeiras, pois está ligada a este poderoso conjunto da economia em torno de escala e redes", disse Gensler, em entrevista ao jornal The New York Times.
O uso de ferramentas de IA, como o ChapGPT, inicialmente causou euforia em vários setores da atividade produtiva, com as possibilidades de gerar muitos dados e organizá-los de forma hierárquica e rápida.
Mas, aos poucos, a euforia começou a virar alvo de preocupações quanto às possíveis consequências do uso desses dados.
Gensler vem advertindo sobre os riscos de ferramentas de IA interferirem no mercado financeiro desde 2020, quando foi coautor de um artigo sobre aprendizado profundo e estabilidade econômica no qual explorou o tema.
“A ampla adoção do aprendizado profundo pode aumentar a uniformidade, a interconexão e as lacunas regulatórias, deixando o sistema financeiro mais frágil”, escreveu Gensler no artigo de 2020.
Agora, o presidente da SEC voltou a repetir que o risco é grande porque um pequeno grupo de empresas que atuam no desenvolvimento de IA tende a fornecer a maioria das ferramentas das quais dependem os negócios e as finanças.
“Quanto mais centralizado o sistema, mais amplo ele se torna, com todos dependendo das mesmas informações – o que torna mais provável uma falha”, advertiu.
A ameaça, segundo ele, é que os modelos de IA podem colocar as prioridades das empresas à frente dos interesses dos investidores.
Gensler questiona se as empresas divulgarão suas descobertas antes de agirem em seu próprio benefício. A SEC propôs uma regra em julho para tratar exatamente disso, com o objetivo final de evitar esse conflito de interesses.
"Você não deve colocar o consultor à frente do investidor, não deve colocar o corretor à frente do investidor", disse Gensler, sugerindo que as empresas devem ser responsabilizadas por proteger os consumidores de sua própria tecnologia.
Mentalidade de rebanho
Outro ponto abordado por Gensler é a mentalidade de rebanho que tem prevalecido entre os consultores do mercado de ações.
Uma diferença fundamental é que os investidores de varejo são apenas um pequeno subconjunto do mercado geral.
Se a IA está dando maus conselhos, argumenta Gensler, isso pode afetar um grupo muito maior de pessoas -- e, no momento, não existe uma estrutura legal para regular esse tipo de possibilidade.
“Os consultores de investimentos sob a lei têm um dever fiduciário, um dever de cuidado e lealdade para com seus clientes”, disse Gensler. “E se você estiver usando um algoritmo, você tem o dever de agir com o mesmo cuidado.”
O possível impacto da IA nos mercados não preocupa Greg Jensen, codiretor de investimentos da Bridgewater Associates, o maior fundo de hedge do mundo.
No mês passado Jensen disse que usar chatbots para negociar ações era uma “missão tola”. “Se alguém vai usar grandes modelos de linguagem para escolher ações, isso é impossível, é um caminho sem esperança”, disse ele, desprezando grandes riscos.
Gensler, no entanto, fez a advertência mirando o longo prazo, quando essas ferramentas de IA estarão mais desenvolvidas.