Desde que o Banco Central começou a anunciar os detalhes do PIX, sua plataforma oficial de pagamentos instantâneos, o mercado financeiro vem digerindo sobre os impactos da ferramenta no setor. E eles serão enormes para toda a cadeia.
Dezenas de bilhões de reais que hoje são faturados pelos bancos com TEDs e DOCs deverão sumir, os boletos provavelmente desaparecerão e o dinheiro físico, definitivamente, ficará cada vez mais escasso. Novos players também entrarão na disputa.
Mas, nos bastidores, os principais bancos do País têm vivido uma tensão muito maior do que a perda de receita com essas operações. O NeoFeed apurou que uma disputa está prestes a acontecer e ela tem data marcada para ser iniciada: 5 de outubro.
Trata-se do dia em que começam os registros das “chaves” para o recebimento de pagamentos pelo PIX no chamado Diretório de Contas Transacionais (DICT). Isso estava marcado para o dia 3 de novembro, mas o BC antecipou essa fase para outubro.
“Vai ser uma corrida para proteger a base de clientes. Estamos muito preocupados com isso”, diz um banqueiro com o qual o NeoFeed conversou. “Por enquanto, antes do PIX ser lançado, é uma disputa em um mar de águas limpas. Depois, será uma briga em águas sujas”, diz ele.
Para operar no PIX, o usuário terá de registrar uma conta de pagamento no celular, no email, no CPF ou no CNPJ. E será por essa conta que ele transferirá ou receberá dinheiro – tanto das pessoas físicas como jurídicas. Isso, em tese, “amarraria” o cliente a uma única conta.
Atualmente, por meio dos TEDs e DOCs, é possível escolher a conta que bem entender. Ao fazer uma transação de celular para celular, de um celular para uma maquininha, ou o pagamento por meio de um QR Code, por exemplo, haverá uma única conta cadastrada.
“No meio do caminho, se quiser, esse cliente poderá mudar a conta cadastrada. Mas, uma vez registrada, dificilmente ele vai alterar”, diz um executivo do mercado. Por isso, os bancos estão preocupados.
“Às 9h01 do dia cinco de outubro, meus clientes começarão a receber mensagens e serão bombardeados com informações para cadastrarem com a gente”, diz ao NeoFeed outro banqueiro com uma base de alguns milhões de clientes.
No fim das contas, a guerra é para saber quem “ficará” com o dinheiro dos clientes. “Pouca gente se ateve a isso até agora. O DICT é a espinha dorsal do PIX. Ele vai definir para onde o dinheiro vai correr”, diz esse mesmo banqueiro. Trata-se, portanto, de uma corrida silenciosa para reter o cliente e o dinheiro em “casa”.
Os bancos, principalmente os grandões, precisarão ser rápidos. Até agora, entre bancos, fintechs e cooperativas de crédito, 980 instituições já se cadastraram para atuar no PIX. “Vai haver uma briga pelos celulares dos clientes”, diz essa fonte. “O que acontecerá será uma disputa como a que acontece pela conta-salário.”
As empresas de telefonia sabem disso e também estão se movimentando. Executivos das grandes teles já se posicionaram dizendo que vão entrar no PIX e podem até criar wallets digitais plugadas na plataforma que realiza transações em 10 segundos, 24 horas por dia, nos sete dias da semana.
O impacto para teles como TIM, Claro, Oi e Vivo é grande. O PIX vai possibilitar que as empresas consigam religar uma conta que foi paga com atraso com mais agilidade. Hoje, demora-se até três dias para receberem a informação de pagamento. Com o PIX, isso aconteceria instantaneamente.
O segundo ponto é o de que a plataforma do BC pode trazer uma economia de R$ 1 bilhão para todas as operadoras. Essa é a quantia que o setor gasta com o custo de comissão de recarga e com pagamento das faturas. “Queremos ser recebedores do PIX para reduzir o nosso custo operacional”, diz Renato Ciuchini, vice-presidente de estratégia e transformação da TIM Brasil.
Mas as grandes empresas de telecomunicação devem ir além da economia e transformar o PIX em uma nova frente de negócios. “Estamos discutindo soluções de como poderíamos integrar o sistema do pré-pago com o PIX e transformar essa carteira digital virtual em uma carteira de pagamentos que vai além do pré-pago”, afirma Ciuchini.
As teles sabem que têm em mãos um ativo valiosíssimo: uma grande base de clientes espalhados por todo o País. Só a TIM, por exemplo, tem 55 milhões de usuários e está fazendo uso disso para gerar novos negócios. Um deles é com o C6 Bank.
Desde meados de julho, a instituição financeira tem uma parceria com a operadora TIM na qual os usuários do TIM Controle ganham bônus de 4 GB ao abrirem uma conta no banco e outros 4 GB ao pagarem a fatura no app do C6.
Para o C6, o objetivo dessa parceria é ganhar escala, trazer para sua base uma grande parcela dos 55 milhões de clientes da operadora. Para a TIM, isso traz mais receita e até uma parte do equity do banco. “Nas três primeiras semanas, foram abertas 200 mil novas contas por clientes da TIM”, diz Max Gutierrez, head de produto e pessoa física do C6.
O executivo afirma que o banco não mirou o PIX quando firmou a parceria com a TIM, mas acredita que muitos registrarão a “chave” com o banco. “A briga que acontece no mercado é por relacionamento com o cliente”, diz Gutierrez. “Acreditamos que o cliente terá um relacionamento conosco e, consequentemente, virá.”
Há, entretanto, quem veja um certo exagero na questão da corrida pelos registros das chaves. Um executivo de uma bandeira de cartões diz que, provavelmente, “as pessoas vão registrar várias chaves em vários e-mails e telefones ao mesmo tempo”.
“Vai ser como chip de celular pré-pago. Os clientes acabam tendo de várias operadoras.” E completa. “O que decide o relacionamento do cliente com o banco não é para onde o dinheiro entra ou sai, mas sim quem dá crédito.”
Gutierrez, do C6 Bank, enxerga um ponto interessante no advento do PIX. “Vai ficar mais claro para todos com quem os clientes têm relacionamento”, diz ele. Na opinião dele, a chave registrada no celular será a principal dos usuários. “Não vai mais adiantar para um banco dizer que tem 25 milhões de usuários. Vai valer o que tem mais contas de PIX”, diz ele.
O fato é que muitos não acreditavam que o Banco Central lançaria o PIX neste ano, como vem apontando. “Houve um negacionismo do mercado”, diz um dos banqueiros consultados pelo NeoFeed.
Agora, estão todos correndo, já sabendo que o PIX é apenas a ponta de um iceberg. É a portinha de entrada para o open banking. E, aí sim, o impacto será ainda maior.
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