Depois de dois anos de estudos e um seed money de R$ 7 milhões de investidores como Marcelo Hallack, da Prisma Capital, e o banqueiro João Ayres Rabello Filho, a nova healthtech do empresário Mauricio Barbosa, o fundador da Bionexo, finalmente vai sair do papel. No próximo dia 5 de dezembro, será inaugurada a clínica Elibré para portadores de transtornos do humor, como depressão, ansiedade e bipolaridade, e dependentes químicos.
O projeto é bastante ambicioso. Ao contrário da maioria das startups do setor, seu foco não é a prevenção e sim o tratamento psiquiátrico. A ideia é combinar uma plataforma de alta tecnologia com o cuidado presencial. Barbosa, aliás, escolheu a dedo seus parceiros de empreitada.
Para participar da construção da plataforma Elibré, ele convidou Solange Plebani. No fim dos anos 1990, como sócia da Wheb Sistemas, ela foi uma das desenvolvedoras do premiado Tasy, software de gerenciamento de custos e qualidade assistencial-hospitalar, usado atualmente por instituições de saúde no mundo inteiro.
Quando a Wheb foi comprada pela Philips, em 2010, Solange foi chamada para trabalhar na multinacional holandesa, onde ficou por pouco mais de 11 anos. Agora, a executiva entra para o time da Elibré, como sênior digital partner da Apus Capital, empresa de capital de risco fundada por Barbosa. “Desenvolvemos um conjunto de sistemas para a integração do ciclo de cuidado do paciente”, explica Solange.
Essa é uma das grandes deficiências no tratamento do paciente que requer internação psiquiátrica no Brasil. A jornada doente é fragmentada - a assistência durante a internação é interrompida no pós-alta. Mudam-se os protocolos de abordagem, adotam-se novas condutas e trocam-se medicamentos. Pacientes, familiares e até os profissionais de saúde ficam perdidos.
Sem o cuidado integrado, a adesão ao tratamento é menor, os sintomas tendem a recrudescer e os riscos de novas hospitalizações aumentam. “A plataforma é uma extensão da nossa oferta de valor”, afirma Barbosa. “A gente não acredita que nosso trabalho com o hospital seja suficiente para evitar a reinternação. Precisamos oferecer mais do que isso.”
Com psiquiatras, enfermeiros e psicólogos disponíveis 24 horas por dia, sete dias por semana, a ferramenta digital permitirá o acompanhamento do paciente depois da alta hospitalar. No futuro, conta Solange, as funções da plataforma serão ampliadas. Com o recurso da inteligência artificial, por exemplo, servirá de instrumento para prever os riscos de recaída e auxiliar no diagnóstico à distância, além de oferecer conteúdos de qualidade sobre os transtornos mentais.
A inspiração para a Elibré surgiu quatro anos atrás, quando Barbosa enfrentou uma crise de depressão. O empresário quis saber de seu médico como seria tratado, caso necessitasse ser hospitalizado e ficou assustado com o que ouviu. Último recurso no manejo dos transtornos mentais, quando todo os recursos terapêuticos extra-hospitalares se esgotam, a internação psiquiátrica no Brasil é cercada por estigmas e ineficiências.
Os centros de tratamento ou são adequados do ponto de vista técnico ou apenas oferecem as facilidades típicas dos hotéis cinco estrelas. Raramente combinam qualidade em saúde com alta hospitalidade. O empresário percebeu que apenas uma plataforma digital não seria suficiente. Era preciso construir um hospital.
Ele então reuniu um grupo de médicos vindos dos melhores centros de tratamento e pesquisa em saúde mental do país e juntos fundaram a Elibré. Localizada na Granja Viana, nos arredores da capital paulista, em uma área tranquila, cercada de muito verde, a clínica, na primeira etapa de implantação do projeto, conta com 16 leitos e não atenderá convênios, apenas pacientes particulares. As diárias giram em torno de R$ 3,5 mil a R$ 5,5 mil.
Uma equipe multidisciplinar, composta por 51 profissionais, estará à disposição dos pacientes, 24x7. Aos 16 médicos, juntam-se enfermeiros, psicoterapeutas, terapeutas ocupacionais, educadores físicos. “Vamos oferecer modalidades terapêuticas que nenhuma outra clínica consegue oferecer”, diz o psiquiatra Henrique Paiva, professor de pós-graduação da USP e CEO da Elibré.
Técnicas inovadoras, como a estimulação magnética transcraniana e os medicamentos à base de cetamina, para o controle dos sintomas mais severos da depressão, requerem profissionais bem treinados. Apesar dos avanços da medicina, no Brasil, os distúrbios psiquiátricos seguem mal diagnosticados e maltratados. Nós somos o país mais ansioso do mundo e o quinto, mais depressivo.
Enquanto as taxas globais de suicídio caem no Brasil e nos Estados Unidos, os índices sobem. Todos os anos, 12 mil brasileiros, no mínimo, se matam. Nove em cada dez são portadores de doença psiquiátrica - entre 50% e 60% têm depressão. Agravados pelo SARS-CoV-2, os transtornos mentais exigem urgência.