PORTO ALEGRE - Julio Mottin Neto, CEO do Grupo Panvel, caminha pela sede da companhia, em Eldorado do Sul, na grande Porto Alegre, e vai mostrando as engrenagens logísticas da empresa. Passa pelo Centro de Distribuição de 16 mil metros quadrados e, em seguida, entra em uma sala de controle.
Ali, em várias telas, consegue analisar, ao vivo e a cores, o tempo que os pedidos levam para chegar na casa dos clientes que fazem compras digitais. Orgulha-se ao mostrar que a maioria delas está levando até duas horas. Mas, a partir de 15 de julho, Mottin Neto terá de olhar mais um indicador: o tempo das entregas de seus parceiros.
É que nesta semana o Panvel vai lançar o seu marketplace de produtos. Inicialmente, vai começar com dois sellers, mas a meta é agregar mais parceiros. O grupo vai disponibilizar equipamentos, como aparelhos de medição de pressão e glicose, e também produtos de alimentação saudável.
“Teremos uma curadoria muito importante. Não vamos fugir de saúde e bem-estar”, diz Mottin Neto ao NeoFeed. “Será uma experiência omnichanel. Os produtos oferecidos no marketplace serão encontrados no app, no site e nas lojas físicas os clientes poderão encomendar com a ajuda dos atendentes.”
Esse é mais um passo da companhia para alcançar a sua meta de atingir um faturamento de R$ 6 bilhões até 2025. O CEO da empresa não revela o número de sellers que o grupo pretende ter, diz apenas que o foco é atender o consumidor e o marketplace será acoplado na Panvel. “Tudo aqui nasce integrado e a nossa estratégia digital é prova disso.”
O e-commerce foi implementando na Panvel em 1998. E, desde então, ele passou a representar 15,5% das vendas. “Antes da pandemia, era 10%, durante a pandemia chegou em 25%”, diz Mottin Neto. Das 527 lojas da rede, 150 fazem a entregas em até duas horas do pedido feito e todas as unidades têm a área de clique e retire.
O grupo hoje conta com dois Centros de Distribuição. Além do que está na grande Porto Alegre, que vai passar de 16 mil metros quadrados para 30 mil metros quadrados, num investimento de R$ 25 milhões; tem outro em São José dos Pinhais (PR), com 20 mil metros quadrados, para atender Paraná, Santa Catarina e São Paulo.
“São investimentos pesados que vão nos trazer frutos até 2025”, diz Antônio Napp, CFO do Grupo Panvel. “A maior parte dos players passou a se preocupar com o digital depois da pandemia.” A Panvel, diz o executivo, tem equilibrado as duas pontas para manter o ritmo de crescimento e se consolidar na liderança da região Sul chegando a 800 lojas.
Hoje, a empresa conta com uma participação de 12% na região Sul. No Rio Grande do Sul, o share é de 22% e em Santa Catarina e no Paraná as participações chegam a 6% em cada estado. Até 2025, a companhia pretende alcançar uma fatia de 20% do mercado.
Para isso, a empresa acelerou a sua expansão. Se antes vinha em um ritmo de 40 inaugurações por ano, o grupo passou a inaugurar 60 unidades anualmente. “Mais do que abrir novas unidades, queremos abrir lojas boas”, diz Mottin Neto. Por lojas boas, entende-se unidades que entreguem um payback em quatro anos.
A expansão continua focada no Rio Grande do Sul, com 50% das inaugurações. A partir do próximo ano, baixará para 30% do total e os outros 70% serão concentrados em Santa Catarina e Paraná. Na cidade de São Paulo, onde o Panvel tem seis lojas e uma dark store de 3 mil metros quadrados, mais uma unidade será inaugurada.
“Nossa operação em São Paulo está indo muito bem, entregamos em até duas horas em qualquer bairro”, diz Mottin Neto. “Estamos nos coçando para não abrir mais.” Mas, afinal, se a operação está crescendo, por que não abrir outras lojas?
“É uma questão de disciplina estratégica. Se você pegar os exemplos malsucedidos do varejo farma, de uma ou outra forma, não construíram uma base sólida na região de origem deles e deixaram o terreno aberto para a concorrência”, diz Mottin Neto. Trata-se, portanto, de uma ação defensiva do grupo. Não deixar nenhum flanco aberto.
Ainda mais quando concorrentes do porte de uma RD, dona das redes Raia e Drogasil, avaliada em R$ 32,5 bilhões, se movimentam para ganhar território na região. O maior grupo farmacêutico do País, com 2.530 unidades, faturamento de R$ 25,6 bilhões em 2021 e R$ 7 bilhões no primeiro trimestre de 2022, hoje conta com 298 lojas no Sul e o Grupo Panvel sabe que não pode baixar a guarda.
A região Centro-Oeste na mira
Uma incursão mais incisiva em São Paulo só acontecerá a partir de 2025. O mesmo pode ser dito de estados da região Centro-Oeste, onde a companhia ainda não tem presença, mas já vislumbra sua entrada – o que vai demandar um alto investimento do grupo.
Atualmente, a abertura de uma nova loja consome um investimento médio de R$ 1,5 milhão. “Farmácia é um negócio de conveniência, mudou muito”, diz Mottin Neto. “Brinco que hoje procuramos um estacionamento em que caiba uma farmácia”, diz Mottin Neto. “Por isso, é muito mais barato fazer uma expansão orgânica.”
A rede conta com uma base de 11 milhões de CPFs, quase um terço da população da região Sul, e usa os dados para saber os melhores lugares para montar suas unidades e não canibalizar as lojas. “Trabalhamos com um mínimo de 500 metros de distância. Mas aqui no centro de Porto Alegre temos mais de 20 unidades”, afirma Mottin Neto.
São lojas que variam entre 250 metros quadrados e 300 metros quadrados divididas entre popular, padrão e premium. A diferença entre elas está mais no mix dos produtos, de acordo com o público onde estão inseridas. De todas, 70% são padrão, 20% popular e 10% premium.
“Temos acertado bastante e devemos passar os R$ 4 bilhões de faturamento pela primeira vez na nossa história”, diz Mottin Neto. No ano passado, a rede faturou R$ 3,46 bilhões. No primeiro trimestre, o grupo anotou uma receita de R$ 969 milhões, num crescimento de 19,4%.
Na visão do mercado, um dos maiores problemas do Grupo Panvel, avaliado em R$ 1,49 bilhão, é baixa liquidez de seus papéis. Enquanto a RD movimenta R$ 112 milhões por dia, o Panvel gira R$ 6 milhões na B3. “É um player bem-posicionado e estruturado no setor, com vantagens competitivas interessantes, mas, no curto prazo, a liquidez baixa é um desafio para o papel”, diz Danniela Eiger, analista de varejo da XP.
Mesmo assim, a XP enxerga um upside de 59% na ação, hoje cotada em R$ 10,06. Os analistas recomendam compra e estipulam um preço-alvo de R$ 16,00. De acordo com Eiger, a companhia deve extrair mais valor e aumentar a margem com maior produtividade de loja, alavancagem de venda, via iniciativas de marca própria e Panvel Clinic.
“Esperamos que ela alcance uma margem de 7% em 2025”, diz Eiger, da XP. A margem ebitda ajustada do grupo Panvel, que inclui a distribuidora Dimed e o laboratório Lifar, foi de 4,7% em 2021. Já sua concorrente RD atingiu uma margem de 7,1%. Isso ajuda também a explicar as diferenças nos múltiplos dos papéis.
Enquanto a RD negocia a 45,8 vezes o seu lucro, a Panvel negocia a 18,6 vezes. Para mudar esse jogo, a Panvel aposta em algumas frentes. Uma delas é a Panvel Clinic. “Esse segmento já existia na pré-pandemia. Já fazíamos vacinação antes da Covid-19”, diz Mottin Neto.
Ele explica que 85 lojas da Panvel fazem aplicação e o grupo tem cerca de 50% do mercado de vacinação em farmácias da região Sul. Outra linha de crescimento vem dos testes laboratoriais rápidos como PSA, glicose, HIV, gravidez entre outros 30.
“Hoje, os serviços representam 4% do faturamento. Até 2025, a meta é alcançar 8% do faturamento”, diz Mottin Neto. “Existem questões de legislação que devem mudar ao longo do tempo, como uma telemedicina feita na farmácia com o apoio do farmacêutico.”
A marca própria é outro trunfo visto como um diferencial competitivo. “Nossa marca é muito forte, tem muita sonoridade, e tem uma linha de produtos que é um benchmark no Brasil”, diz Mottin Neto. São mais de 1 mil SKUs e a linha representa 20% do faturamento de higiene e beleza.
Do total das receitas do grupo, a marca própria significa quase 10%. São produtos que vão de barra de cereal a água mineral passando por produtos de beleza produzidos pelo laboratório próprio Lifar.
“O Lifar nos traz agilidade na implementação de tendências e na questão da qualidade”, diz Mottin Neto. Alberto Serrentino, sócio-fundador da consultoria Varese Retail, diz que os produtos próprios da Panvel acabaram se tornando um case no setor.
“A Panvel foi pioneira em posicionar a loja voltada para bem-estar e beleza, não apenas em medicamentos, quando isso não era tão óbvio assim”, diz Serrentino. E prossegue. “A companhia conseguiu posicionar a marca própria com produtos para casa e beleza e fez suas lojas se tornarem destino para presentes, a exemplo de Boticário e Cacau Show.”
O foco em 2025
Mottin Neto e Napp miram suas metas para 2025 porque é a data que a Panvel tem para “entregar” os resultados prometidos ao mercado quando fez um road show antes do follow on, em julho de 2020, considerado uma espécie de re-IPO. Na época, movimentou R$ 1 bilhão colocando R$ 400 milhões no caixa da companhia. A empresa migrou para o Novo Mercado da B3 e o bloco de controle ficou nas mãos das famílias Mottin, Weber, Pizatto e o fundo Kinea.
Antes do re-IPO, existia um movimento interno de rearranjo societário, que era a saída do fundo de private equity Investidor Profissional, que fazia parte do cap table da empresa há mais de 20 anos. O fundo tinha uma participação de cerca de 10% do Grupo Panvel e a ação tinha pouca liquidez. Sua saída não era não trivial.
A empresa, então, decidiu buscar um outro fundo de private equity para comprar a participação do IP. Em 2018, o Kinea entrou e a Panvel se comprometeu a gerar um evento de liquidez em um período entre 5 anos e 10 anos.
Com a chegada da pandemia e a alta liquidez no mercado, o plano foi antecipado. “Tivemos um grande sucesso e a nossa história é de uma solidez muito grande. Temos 50 anos e nunca tivemos um prejuízo ou queda de venda na vida”, diz Mottin Neto.