Ele não levou o Oscar de melhor ator por seu trabalho em "Diamante de Sangue", mas ganhou algo muito mais valioso que a estatueta: conhecimento. Ao ser escalado para protagonizar, em 2006, o filme dirigido por Edward Zwick, Leonardo DiCaprio estudou mais a fundo a indústria dos diamantes, avaliada em US$ 13 bilhões.
"Fiquei horrorizado com o que aconteceu em Serra Leoa no final da década de 1990 e de como os diamantes financiaram essa tragédia", declarou o astro à época, em entrevista à revista americana Time. O ator se referia à Guerra Civil que acabou em 2002 e que deixou 50 mil mortos.
Os abusos físicos, financeiros e sociais alimentados pelo mercado de pedras preciosas, contudo, não cessaram. Ainda hoje há relatos de trabalhadores sujeitos a condições análogas à escravidão em algumas regiões africanas de exploração desses minérios, inclusive Serra Leoa.
Por isso, o ator, conhecido por defender causas ambientais e humanas e acusado sem provas pelo presidente Jair Bolsonaro de financiar ONGs que teriam colaborado para os incêndios na Floresta Amazônica, não titubeou quando teve a oportunidade de reescrever a história real desse mercado.
DiCaprio foi um dos principais investidores da startup californiana Diamond Foundry, que produz diamantes em laboratório. "Orgulho de investir na Diamond Foundry, que reduz os custos humano e ambiental ao cultivar diamantes de maneira sustentável", tuitou ele, em 2015.
Fundada em 2012 pelo engenheiro Martin Roscheisen, a empresa tem sede em São Francisco e levantou, em três rodas, cerca de US$ 100 milhões. Além do premiado ator, outros grandes nomes do empreendedorismo mundial apoiaram a ideia: o co-criador do iPod, Tony Fadell; Jeff Skoll, presidente do eBay; Andrew McCollum, cofundador do Facebook; e o fundador do Twitter, Evan Williams, além de outros investidores.
Em entrevista ao NeoFeed, Roscheiassen, que é CEO da companhia, explica que um diamante é, basicamente, feito de um único componente – o carbono. O que transforma o elemento químico na pedra preciosa é uma combinação de alta temperatura e pressão.
Para recriar esse processo em laboratório, Roscheisen, que é PhD em ciência da computação pela Universidade de Stanford, criou, junto com sua equipe, um reator de plasma de alta potência, capaz de atingir uma temperatura tão quente quanto as camadas externas do sol.
Hoje, principal trunfo da empresa, esse reator já foi também o maior desafio. De acordo com Roscheisen foram quase três anos de testes e falhas. "Realizamos dezenas de milhares de simulações baseadas em física e construímos, do zero, três gerações dos nossos próprios reatores de plasma. Foram centenas de peças individuais, projetadas com precisão", afirma o empreendedor.
No fim de 2014, quando todas as reservas financeiras já haviam sido "queimadas" nos ensaios, chegou a hora da verdade. "Todo mundo respirou aliviado quando a máquina funcionou exatamente como o esperado. O negócio poderia continuar", diz Roscheisen.
Para fazer um diamante de laboratório, uma pequena lâmina de diamante natural é colocado no reator de plasma, com o intuito de ser o modelo atômico. Depois, carbono é adicionado à máquina, que esquenta até chegar a 10 mil graus Fahrenheits– mais de 5 mil graus Celsius. Explicando de forma grosseira, é como se o diamante natural fosse uma espécie de célula-tronco e "ditasse" o DNA da pedra que será formada.
Todos os diamantes feito em laboratório são também únicos e seu formato e tamanho não podem ser previamente definidos. Só depois de extrair a pedra do reator é que é escolhido o melhor corte para ela. A Diamond Foundry tem mais de 30 opções possíveis de corte, que vão desde o formato oval até o de pipa. O tempo total para a produção de uma pedra é de duas semanas.
Além da rapidez, o diamante feito em laboratório é ecologicamente correto. A Diamond Foundry é toda alimentada por energia solar e não tem nenhuma emissão de carbono – o que a diferencia dos demais players do mercado, como a Brilliant Earth, nascida em 2005. A concorrente, entretanto, diz que neutraliza todas as suas emissões financiando ações de proteção na floresta tropical brasileira.
Outro fator que torna a opção "in vitro" mais atraente é, claro, o preço. Uma pedra de diamante de 1,28 quilates com transparência grau VS1, a mais alta, era vendida, em janeiro de 2018, por US$ 21,7 mil na Tiffany&Co. O mesmo diamante, no mercado de "atacado", era comercializado por US$ 7,8 mil. Com essas mesmas características e condições, um diamante feito no laboratório da startup californiana é negociado por US$ 7,4 mil.
A cifra deixa de fora certos detalhes que não têm preço, como a ética ambiental, social e humana do processo de produção. "Quando um cliente opta por nossas pedras, ele sabe toda a cadeia de produção. Não há dúvida quanto a procedência da joia", afirma Roscheisen. "Já os diamantes naturais passam de mãos em mãos, tornando mais difícil rastrear a linha de produção para saber se houve, em alguma etapa, um abuso ou coisa parecida."
Por essas e outras a Diamond Foundry foi eleita, em 2015, uma das 25 melhores startups do mundo pelo site Business Insider. No ano seguinte, a mesma publicação listou a companhia entre as 21 companhias mais inovadoras do mundo. Ainda em 2016, foi escolhida como uma das 50 empresas mais disruptivas do canal de televisão CNBC. E, em 2017, uma das 25 mais disruptivas pela revista americana Inc.
Em 2018, quando conseguiu bater a produção anual de 100 mil quilates e a façanha de ser lucrativa, a Diamond Foundry foi também citada como uma das empresas mais inovadoras pela Fast Company.
As pedras fabricadas no laboratório financiado por DiCaprio são vendidas em algumas lojas parceiras, em diferentes países: EUA, Canadá, México, Suécia, Guatemala, França, Alemanha, Japão e Inglaterra.
Na China, a empresa têm um braço próprio de distribuição, além de alimentar duas marcas próprias de comércio eletrônico – a VRAI e o 3D Design Studio, que permitem que os clientes customizem anéis.
Outra forma que a Diamond Foundry encontrou para rentabilizar e popularizar seu produto foi através de parcerias estratégias. A empresa lançou coleções especiais com algumas marcas de joias e moda, como a Barneys New York, Alessa Design, Au Showroom, Grace Lee, Anabela Chan, Shahla Karimi, Dover Street Market e, mais recentemente, com a Balmain.
Planos específicos para o mercado brasileiro e sul-americano não foram comentados pela empresa.
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