Em 2015, Joice Toyota e José Frederico Lyra Netto decidiram criar a Vetor Brasil para atrair, selecionar e formar profissionais para o setor público. Além de governos estaduais, essa proposta chamou a atenção de instituições e filantropos dispostos a financiar a ONG.
Ex-mulher de Jeff Bezos, com quem fundou a Amazon, Mackenzie Scott foi um dos nomes que embarcaram nessa ideia. Dona de uma fortuna de US$ 24,6 bilhões, a bilionária americana doou R$ 4,2 milhões ao projeto em janeiro deste ano, como parte de uma leva que contemplou outras 14 iniciativas no País.
Agora, a Vetor Brasil está reforçando sua lista de apoiadores com um cheque assinado por outras figuras de peso. A ONG recebeu uma doação da VelezReyes+, plataforma de filantropia criada por David Vélez, cofundador, CEO do Nubank e dono de um patrimônio de US$ 4,6 bilhões, e sua esposa, Mariel Reyes.
Na doação, de valor não revelado, a Vetor também passou pelo crivo de outro bilionário. O aporte conta com a participação da Fundação Lemann, de Jorge Paulo Lemann, com quem a VelezReyes+ fechou uma parceria para investir em projetos de educação e desenvolvimento de lideranças.
“O nosso projeto é um pouco mais difícil de ser comunicado a um público mais amplo”, diz Joice Toyota, cofundadora e diretora-executiva da Vetor Brasil, ao NeoFeed. “Esses doadores mais estruturados conseguem enxergar o que estamos propondo, que são mudanças de longo prazo e mais duráveis.”
No caso específico da VelezReyes+, Toyota observa que, entre todos os apoiadores financeiros da Vetor, a dupla foi a que teve mais “match” com o projeto. E ressalta que os benefícios dessa associação não se esgotam na chancela do casal e nos recursos destinados à organização.
“Estamos investindo na nossa área de tecnologia, que é algo ainda muito incipiente no terceiro setor no Brasil”, afirma. “Eles são jovens, desse mundo e vêm nos ajudando muito. Nenhum outro apoiador nosso tem o conhecimento de tecnologia e produto para dar feedbacks com a profundidade que eles nos dão.”
Em carta na qual justificou o apoio à ONG, a VelezReyes+ destacou que apoiar e desenvolver pessoas para serem líderes públicos de alto impacto é um ponto prioritário para a sua ambição de reduzir as desigualdades na América Latina.
“Governos são feitos de pessoas, servidoras e servidores públicos tomando decisões todos os dias. Imagine o impacto que uma geração inspirada, preparada e devidamente equipada para assumir cargos no setor público pode ter. O Vetor Brasil transforma esse potencial em realidade”, afirma o casal, no documento.
A VelezReyes+ foi lançada no início deste mês de outubro. Além da Vetor, a lista de organizações e projetos que já receberam o apoio da plataforma inclui nomes como Teach for All, Enseña por Colombia, Ensina Brasil, Enseña Peru e Associação Nova Escola e MegaEdu.
A plataforma é fruto da adesão do casal ao The Giving Pledge, iniciativa criada por Bill Gates, Melinda Gates e Warren Buffet, na qual bilionários de todo o mundo se comprometem a doar a maior parte de suas riquezas, em vida, para a filantropia. Mackenzie Scott também é uma das signatárias. No Brasil, o outro integrante dessa lista é Elie Horn, da Cyrela.
Tão sexy como uma consultoria
Parte do universo no radar dessas doações, a Vetor já arrecadou cerca de R$ 58 milhões desde a sua fundação. A relação por trás desse montante passa ainda por nomes como Arminio Fraga, Carlos Alberto Sicupira, Itaú Social e Instituto Sonho Grande.
A Vetor começou a ser gestada em 2013, quando Toyota, engenheira formada na Poli-USP e que trazia no currículo passagens por consultorias como a Bain & Company, trabalhava na Secretaria Estadual de Educação de Goiás, ao lado de Netto.
Na época, a dupla desenvolvia consultorias gratuitas para prefeituras no interior de Goiás. “Era frustrante, pois nós desenvolvíamos bons projetos, mas as coisas não saíam do papel, pois não havia pessoal capacitado para tocar”, conta.
Os protestos de 2013 e a onda de manifestações pedindo mudanças na esfera pública deram fôlego para que a dupla começasse a estruturar o projeto da Vetor.
“Existe muita burocracia desnecessária, mas o setor público é onde você trabalha com impacto social em escala”, diz Toyota. Ela aponta um dos principais desafios para a ONG. “A missão que escrevemos no PowerPoint era fazer com que trabalhar no setor público fosse tão sexy quanto trabalhar em uma consultoria.”
A primeira iniciativa foi um programa de trainee de gestão pública. Hoje, a ONG desenvolve programas para média gerência, líderes de gestão pública, lideranças negras e processos de seleção customizados para governos estaduais.
Com parcerias com governos de estados como Goiás, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul, a Vetor acumula mais de mil profissionais alocados em mais de 220 órgãos públicos. São mais de 40 governos atendidos, sob a liderança de 19 partidos políticos diferentes.
“Nós atuamos de forma suprapartidária com governos do PSL ao PC do B”, diz Toyota. Atualmente, a ONG conta com 70 profissionais. Essa estrutura é financiada, basicamente, a partir das doações, já que os recursos envolvidos em cada projeto cobrem, quando muito, os custos diretos daquela iniciativa.
“Tivemos uma fase bem difícil na pandemia, quando toda a filantropia brasileira foi, com razão, para o assistencialismo”, explica Toyota. “Mas esse cenário represou muitos projetos, que começaram a acontecer a partir de 2021. Então, estamos em um momento em que estamos crescendo bastante.”
O principal destino das doações desse ano será o desenvolvimento de produtos digitais. Entre os projetos já em gestação está uma plataforma para mapear as competências dos gestores da rede de escolas públicas do País.
Com a plataforma, que já está sendo testada em locais como o Rio Grande do Sul, a ideia é oferecer às indicações políticas que dominam o segmento, além de uma ferramenta para apoiar a formação desses profissionais, ao identificar as lacunas que precisam ser preenchidas por eles.