O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, participou nesta terça-feira, 25 de abril, de uma audiência de mais de 4h30 de duração na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Mesmo pressionado, saiu sem responder de forma clara à pergunta mais repetida por senadoras e senadores - quando, afinal, a taxa de juros vai começar a cair? Por outro lado, foi enfático e didático ao explicar por que os juros continuam altos.

Embora tenha adotado uma postura mais defensiva, o presidente do BC conseguiu se desviar de questões polêmicas em alguns momentos, deixar claro suas posições em outros e ainda rebateu de forma indireta as críticas à taxa Selic feitas nos últimos dias pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na última delas, Lula disse que “ninguém toma dinheiro emprestado a 13,75%”.

“Escuto que, se reduzir a Selic, melhoram as condições de crédito”, disse Campos Neto. “Só vai melhorar se eu tiver credibilidade com o que faço na Selic – pois controlo os juros de um dia, e todo o resto da curva de juros é determinado pelo preço que as pessoas querem emprestar ao governo”, acrescentou, dando a entender que, se o BC não tiver credibilidade, pode até baixar os juros curtos, mas os longos tendem a subir.

Campos Neto também defendeu a independência do Banco Central com uma estocada no presidente Lula. “Nunca na história desse país o BC aumentou tanto os juros num ano eleitoral como no ano passado”, disse. “Se o BC não tivesse feito esse movimento, estaríamos com uma inflação de 10% e a taxa de juros, a 18%”, acrescentou.

Vários senadores da oposição pressionaram o presidente do BC. Cid Gomes (PDT-CE), o mais incisivo, utilizou giz e uma lousa para criticar os efeitos da taxa Selic na dívida pública. Teatral, encerrou sua fala de quase vinte minutos entregando um boné do Banco Santander – onde Campos Neto trabalhou por 18 anos –, pedindo para o presidente do BC "deixar o cargo".

Por isso, como era esperado, o presidente do BC ficou na defensiva boa parte do tempo. Entre as diversas respostas sobre uma previsão para a queda de juros, apelou para o peso institucional do BC como responsável pela política monetária.

“Tomaremos uma decisão técnica, olhando todos os fatores, e as coisas estão caminhando no sentido certo", limitou-se a dizer.  Ele fez menção até ao lado político, quando foi questionado se o anúncio do arcabouço fiscal seria suficiente para a queda da Selic.

"Vamos lembrar que não tem relação mecânica (com o processo de redução de juros), o que a gente precisa é que o canal de expectativas ou o canal de projeções, junto com esse canal de credibilidade, atuem de forma a propiciar a possibilidade de o Banco Central eventualmente cair os juros", disse.

O formato da audiência ajudou a evitar uma pressão maior sobre Campos Neto. Ele começou com uma exposição de 30 minutos, no qual trouxe inúmeras tabelas exibidas num telão. Problemas técnicos atrapalharam a apresentação e o presidente do BC, nitidamente ansioso, procurou acelerar sua fala.

Depois, na sabatina em si, ficou definido que, a cada vez, três senadores fariam perguntas e, na sequência, Campos Neto responderia em bloco. Dessa forma, o presidente do BC conseguiu falar de forma mais elaborada.

Explicações

Seu melhor momento se deu ao explicar por que os juros seguem altos, apesar de a inflação estar em queda há nove meses - hoje em 4,65% no acumulado de 12 meses até março, o menor índice em dois anos. Campos Neto atribuiu os juros à fraca recuperação de crédito e à dívida bruta brasileira que, segundo ele, reflete nos prêmios futuros de juros.

“O Brasil tem uma das menores recuperações de crédito do mundo. Isso significa que, quando alguém tem uma inadimplência, o agente que cedeu não consegue recuperar o crédito”, disse.

Sobre a dívida bruta, ponderou: “É uma dívida explosiva? Não é, mas é muito maior que a média dos outros países e isso reflete nas taxas de juros”. Segundo dados do BC, a dívida bruta em relação ao PIB fechou fevereiro em 73%, atingindo R$ 7,3 trilhões.

Campos Neto citou ainda o que chamou de “excessivo crédito direcionado” no Brasil como fator que obriga o BC a aumentar mais os juros do que outros países com inflação semelhante. Segundo ele, o País tem um volume de crédito direcionado de 40,3%, enquanto em países emergentes a média é de 3% ou 4%. “Quando tenho muita meia-entrada, o preço da entrada inteira aumenta”, comparou.

O economista Mauro Rochlin, professor da FGV, elogiou a atitude do BC em aumentar a taxa de juros em ano eleitoral. “Lula deveria agradecer ao BC pela autonomia”, disse ele ao Neofeed, antes da audiência de Campos Neto, sobre o efeito da Selic na queda da inflação atual.

Ele afirma, no entanto, que o BC exagerou na dose dos juros, lembrando que a inflação caiu de 12,3% em abril do ano passado para 10,07% em julho. Em agosto, o BC aumentou os juros para 13,75%. No segundo semestre, o governo reduziu o ICMS de combustíveis e zerou PIS e Confins, e a inflação fechou o ano em 5,79%. “O BC manteve a Selic ajustada para cenário de inflação de dois dígitos, faltou flexibilidade quando o cenário mudou.”