Mesmo morando próximo da região da avenida Paulista, o investidor Diego Leoni Sandim da Silva, de 39 anos, visitou uma única vez o Museu de Arte de São Paulo, um dos principais pontos turísticos da cidade. Ele nunca teve muito interesse em apreciar os trabalhos expostas.
As artes visuais não estavam em seu radar até conhecer um programa focado em obras de arte lançado em 2021 pela Hurst Capital, fintech especializada em ativos de investimentos alternativos, por meio do qual você compra apenas um pedaço de um trabalho. Isso é possível graças às NFTs (sigla em inglês para "non fungible token" ou “token não fungível”), que estão movimentando o mercado de arte desde 2020.
A Hurst Capital "tokenizou", ou seja, criou tokens (ou moedas) digitais das obras Sem Título, mas nomeadas como "Cena de um Carnaval" (déc. 1950) e "Paisagem Marinha" (1964), de Di Cavalcanti, e três trabalhos da série W, de Abraham Palatnik avaliadas em R$645 mil. As "moedas" referentes às pinturas foram colocadas à venda por R$ 10 mil, sobre os quais se estima um rendimento de 16,06% ao ano em um prazo de até 18 meses.
Ao comprar alguns desses tokens, Sandim se tornou sócio de um conjunto de cinco trabalhos que valem centenas de milhares de reais. As telas de Di Cavalcanti, por exemplo, foram avaliadas em R$ 770 mil e R$ 670 mil. "Estamos dando acesso ao investimento em obras de arte, que sempre esteve restrito às grandes fortunas, a mais pessoas", afirma Augusto Salgado, diretor de obras de arte da Hurst.
O lado triste é que Sandim não poderá pendurar as obras na parede ou ficar com elas para sempre. Mas, quando quiser vê-las, basta ir ao acervo da galeria em que estão guardadas até serem vendidas – o que fez certo dia. "Senti uma tristeza de não poder levar as obras para casa. Você deixa de ser um pouco racional para ser emocional", conta.
Saber da existência física dos trabalhos foi o que deu segurança para Sandim investir no ativo, cujas transações aconteceram via blockchain. Para conhecer melhor em qual setor estava aplicando o seu dinheiro, o investidor fez cursos on-line de história da arte e curadoria e voltou ao Masp outras vezes para apreciar as obras do acervo, desta vez com mais atenção e interesse.
Para quem é novato no mercado de arte, este modelo de investimento pode ter suas vantagens. A primeira é estar assegurado por um time de profissionais que garante a autenticidade da obra e avalia por você o que pode ser um real bom negócio e a outra, o retorno relativamente rápido.
O contrato prevê a devolução do valor do investimento corrigido em até um ano e meio, mas os investidores podem vender suas cotas por um preço corrigido para algum interessado que não comprou seu pedacinho de tela enquanto as negociações estavam abertas.
Outra possibilidade é serem surpreendidos por uma boa notícia do mercado de arte. Depois de seis meses do fechamento da capitalização, caso as obras recebam uma oferta que supere a expectativa de venda da Hurst, elas poderão ser vendidas. É o que deve acontecer com os trabalhos de série W, de Abraham Palatnik, nos próximos meses.
Em dezembro de 2021, mais um conjunto de pinturas para investimento foi lançado. A aposta desta vez foi em trabalhos da série Concreção, “C 8199”, “C 8720” e “C 9764”, do concretista brasileiro Luiz Sacilotto (1924-2003), cujas obras, em 209 transações feitas entre 2007 e 2021, apresentaram uma valorização 20,12% ao ano.
Em um cenário menos otimista, no entanto, a Hurst prevê que o conjunto de telas se valorizem pelo menos 11,94%. Até o momento, a fintech só abriu investimentos em artistas consagrados que já morreram e, devido à oferta limitada, mostram valorização constante no mercado há anos. Este ano, a empresa planeja abrir a carteira de investimento em artistas vivos, relativamente jovens, mas com trajetórias consolidadas.