No segundo trimestre de 2020, poucas semanas depois do início da pandemia, o Centro de Tecnologia da Indústria Química e Têxtil, do Instituto Senai de Inovação em Biossintéticos e Fibras, no Rio de Janeiro, associou-se à BioManguinhos, braço de desenvolvimento tecnológico e de vacinas da Fiocruz, e à empresa catarinense Diklatex para viabilizar um projeto ousado: a criação de um tecido capaz de neutralizar o Covid-19.
Em junho, os primeiros testes demonstraram que um dos tecidos avaliados foi capaz de inativar 99,9% das partículas virais do SARS-CoV-2, além de 99% de todos os vírus em circulação.
“Imagine o impacto que o tecido antiviral provocará para a redução de infecções hospitalares, na medida em que for usado em aventais de médicos e enfermeiros e nas roupas dos pacientes”, diz Rafael Lucchesi, diretor-geral do Senai e diretor-superintendente do Sesi.
O tecido imune ao novo coronavírus não foi a única contribuição da divisão de inovação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, conhecido no Brasil pela clássica sigla Senai, para combater os males da pandemia.
O Instituto Senai de Inovação em Biomassa, em Mato Grosso do Sul, foi um dos responsáveis pela produção de 16 formulações diferentes de álcool gel, algumas delas associadas a propriedades hidratantes – o que é incomum nesse tipo de produto.
O papel do Senai revelou-se, de fato, vital durante a crise do novo coronavírus. O Instituto Senai de Inovação em Química Verde, no Rio de Janeiro, ajudou a conceber, em parceria com as universidades UFRJ, UFRRJ e Udesc, além da empresa de biotecnologia Scienco, um teste molecular para o diagnóstico rápido de Covid. Na área de saúde, ressalte-se, velocidade pode significar a diferença entre a vida e a morte.
Tais exemplos são o retrato perfeito de como o chamado Sistema Indústria – integrado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), pelo Serviço Social da Indústria (Sesi), pelo próprio Senai e pelo Instituto Euvaldo Lodi (IEL) – impulsiona iniciativas transformadoras no País.
Criados em 2013, os 26 Institutos Senai de Inovação presentes em 12 estados brasileiros desembolsaram desde então R$ 1,2 bilhão para fomentar 1.332 projetos de pesquisa e desenvolvimento
Criados em 2013, os 26 Institutos Senai de Inovação presentes em 12 estados brasileiros desembolsaram desde então R$ 1,2 bilhão para fomentar 1.332 projetos de pesquisa e desenvolvimento. Trata-se de um universo gigantesco. São 930 pesquisadores ligados ao instituto, mais do que o corpo científico da maioria das universidades brasileiras.
Isso explica por que o Senai é um celeiro de projetos revolucionários. Foi lá que surgiu o flatfish, robô completamente autônomo que faz inspeções em dutos profundos de petróleo.
Dotado de visão 3D de alta resolução, sistema de inteligência artificial e sensores de precisão, o robô é um dos primeiros do mundo capazes de desviar, por sua conta e risco, de obstáculos encontrados nas profundezas oceânicas, como cardumes de peixes, redes ou até mesmo manchas de petróleo.
O notável equipamento consumiu R$ 40 milhões em investimentos e foi desenvolvido pelo Senai-Cimatec de Salvador (chamado no mercado de MIT baiano), em parceria com a Shell e o Instituto Alemão de Pesquisa em Inteligência Artificial DFKI.
O projeto é tão bem-sucedido que foi levado pela Shell para outras empresas em diversas partes do mundo, processo conhecido no mundo corporativo como transbordamento tecnológico.
“O flatfish posiciona o Senai-Cimatec com um dos principais centros de pesquisa na área de robótica do País”, afirma Leone Andrade, diretor de Tecnologia e Inovação do Cimatec.
O Senai também está por trás do primeiro nanossatélite brasileiro, fruto de parceria com a Visiona Tecnologia Espacial, joint-venture entre a Embraer e a Telebras, e o Instituto de Inovação em Sistemas Embarcados, de Florianópolis.
Orçado em R$ 12 milhões, o nanossatélite tem formato diminuto (daí o nome) e será utilizado para coletar, do espaço, imagens em alta resolução, principalmente aquelas relativas ao meio ambiente. Por isso, deverá ser muito usado no agronegócio.
O Sistema Indústria é uma máquina de inovação. O Senai conta também com 62 Institutos Senai de Tecnologia distribuídos em 17 estados e no Distrito Federal, e seu foco é fazer desabrochar iniciativas na área tecnológica. Ao todo, cerca de 10 mil empresas já foram atendidas pelos institutos e seus 1,3 mil especialistas e consultores.
O Sesi não fica atrás. Além de oferecer educação básica a mais de 900 mil jovens, possui atualmente nove centros de Inovação especializados em áreas como gestão de segurança, longevidade e produtividade, estilo de vida e saúde, além de muitas outras.
Um de seus programas mais bem-sucedidos é o Sesi Viva+, plataforma digital que reúne informações sobre Segurança e Saúde no Trabalho.
Rafael Lucchesi lembra que, além de armazenar dados, a plataforma oferece cursos e faz atendimentos de telessaúde, promovendo o bem-estar do trabalhador ao mesmo tempo em que assegura melhores resultados para as empresas.
Os Institutos Senai de Inovação e os Centros de Inovação do Sesi também atuam em conjunto. Ao lado da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), criaram o Edital de Inovação.
Entre outros atributos, o Edital financia o desenvolvimento de produtos, processos e serviços inovadores na área de saúde e segurança do trabalho.
Embora inovar seja um objetivo buscado pela maioria das empresas, muitas delas não sabem como transformar ideias em ações concretas – ou seja, que cheguem ao mercado e sejam efetivas do ponto de vista comercial.
Atenta a essa realidade, a CNI criou, em 2008, o movimento Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), que busca integrar empresas, universidades e o setor público para fomentar políticas de apoio à inovação. Atualmente, integram a MEI cerca de 400 das principais lideranças empresariais do País
Entre as iniciativas do MEI está o MEI Tools, publicação que compila dados sobre os diversos instrumentos capazes de fortalecer a capacidade inovadora das empresas.
O MEI Tools traz, a cada três meses, informações sobre como captar recursos, apresenta as linhas de crédito disponíveis para a área científica e traz cases empresariais de sucesso.
A CNI marca presença em todas as frentes possíveis para estimular a inovação do Brasil. Um de seus vínculos mais produtivos se dá com o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI).
A parceria resultou no programa Rede Nagi Digital, que conta com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).
Um dos principais objetivos do programa é destinar recursos para projetos-piloto em empresas e ajudá-las a incorporar novas tecnologias em suas operações.
É impossível inovar sem um elemento essencial: o humano. Em sintonia com essa premissa, o Instituto Euvaldo Lodi (IEL), outro ator importante do Sistema Indústria, idealizou o programa Inova Talentos.
A ideia é capacitar jovens talentos por meio da concessão de bolsas de estudos. Primeiro, o programa identifica projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) das empresas interessadas em receber profissionais.
Depois, são selecionados os bolsistas que participarão do programa aprovado pelo Inova Talentos. “Levamos os jovens para atuar diretamente na ponta de inovação das empresas”, diz Eduardo Vaz, superintendente nacional do IEL. “Com isso, certamente estamos ajudando a construir um País melhor no futuro.”
Desde 2014, quando foi criado, o Inova Talentos atendeu 320 empresas, promoveu 1.132 projetos e concedeu 2.239 bolsas.
Vários compromissos destacados nesta reportagem serão reforçados no dia 20 de outubro, durante o lançamento do 9º Congresso Brasileiro de Inovação da Indústria.
Promovido pela CNI e pelo Sebrae, o evento terá como maior atração Steve Wozniak, fundador da Apple ao lado de Steve Jobs e lenda do universo tecnológico.
Em sua palestra virtual, que deverá ser acompanhada por 10 mil participantes, Wozniak desbravará os caminhos da inovação e apontará tendências para o futuro.
Uma de suas frases mais conhecidas expressa com maestria o valor da inovação “Tente pensar em novas maneiras de resolver os problemas antigos. Muitas vezes olhamos para algo e dizemos: ‘Eu poderia fazer melhor’. Isso é inovação”, disse o gênio.