No início de julho, a empresa de geotecnologia Neogeo, especializada em fazer análises de solo para mineradoras, mantinha ao menos 30 funcionários espalhados por diversas cidades do país.
O trabalho de campo é essencial em uma companhia desse tipo. Mesmo com os avanços tecnológicos, não é possível avaliar as características dos terrenos remotamente – o profissional, afinal de contas, precisa estar presente no local a ser estudado.
Por essa razão, as viagens corporativas são uma parte importante do negócio da Neogeo. Para se ter ideia, os 30 viajantes de julho equivalem a praticamente metade do pessoal da empresa.
“Sempre perdemos muito tempo com as questões de reembolso das viagens e até tivemos problemas de fraudes”, diz Fabrício Romeiro de Jesus, sócio da Neogeo. “Mas agora finalmente encontramos um modelo que ajuda a eliminar muita dor de cabeça.”
Em junho, a Neogeo passou a usar o cartão de crédito lançado pela Onfly, plataforma de gestão online de viagens corporativas. Com ele, foi possível aposentar o velho e surrado modelo de reembolso que tanto incômodo traz para empresas de diversos segmentos.
Em linhas gerais, o cartão de crédito corporativo tem o objetivo de auxiliar as empresas na gestão de gastos e reembolsos de colaboradores. Trata-se, portanto, de uma inovação com potencial para revolucionar a administração de viagens corporativas.
“É um produto pré-pago que permite à empresa e ao colaborador gerir os gastos de forma inteligente e automática com o apoio de um software”, resume Marcelo Linhares, CEO e fundador da Onfly.
É fácil entender como o produto funciona. Ao viajar, o colaborador recebe um cartão de crédito carregado com um determinado saldo. Todas as transações – alimentação, hospedagem e transporte, entre outras – podem ser pagas com o cartão, e o funcionário e a empresa gerenciam a viagem, em tempo real, através de um aplicativo.
“Toda transação feita com o cartão gera um SMS, onde o colaborador sobe o recibo e oficializa aquela operação”, diz Linhares. “Assim, o colaborador não precisa mais ficar juntando recibos, notas e outros comprovantes e nem misturar sua conta pessoal com os negócios da empresa.”
Os benefícios chegam aos dois lados da história. Para o colaborador, representa uma facilidade que os velhos reembolsos não ofereciam, simplificando um processo que muitas vezes bagunçava a sua vida financeira.
“O antigo modelo de reembolso é equivocado”, diz Linhares. “Nele, o funcionário funcionava até como banco, financiando a empresa e às vezes sofrendo para receber os valores de volta. Cheguei a ver um amigo pegando dinheiro emprestado com o banco, para gastar na viagem a trabalho. Vamos acabar com isso.”
Para a empresa, além da redução significativa dos níveis de burocracia, o cartão de crédito traz mais segurança. “Em nossa companhia, já houve caso de um funcionário que precisou ser demitido porque não devolvia o dinheiro da viagem”, diz Fabrício Romeiro, da Neogeo.
A empresa também pode estabelecer limites de crédito e de despesas, de acordo com as atividades ou projetos que serão executados. O sistema é ágil. Digamos que o colaborador precise de recursos que excedam o valor que havia originalmente no cartão pré-pago. Nesse caso, basta solicitar o adiantamento pela plataforma e, após aprovação do gestor, o montante adicional é depositado automaticamente no cartão.
Trata-se do primeiro produto financeiro da Onfly. Sua bandeira é Visa, enquanto o banco custodiante é o Votorantim. Mesmo tendo sido lançado há apenas dois meses, o cartão de crédito já chegou a mais de 80 empresas. A expectativa é de ter 250 empresas usando o cartão em 2022.
Criada em 2018 como uma plataforma especializada em viagens corporativas, a Onfly teve uma trajetória meteórica. A expectativa é encerrar o ano com R$ 190 milhões em volume transacionado (GMV). Em 2021, o valor foi de R$ 45 milhões. Ou seja, a ideia é multiplicar os negócios por quatro.
Atualmente, a empresa conta com 600 clientes recorrentes – aqueles que pagam mensalidades para usar seus serviços –, mas a meta é encerrar o ano com 1.000. No final de 2021, eram 280. Segundo Marcelo Linhares, o cartão de crédito certamente será responsável por impulsionar esses números, na medida em que tende a atrair mais empresas para a plataforma.
A história da Onfly, contudo, foi marcada por um tremendo desafio. Com pouco mais de um ano de operação, a empresa se deparou com um obstáculo aparentemente intransponível: a pandemia de Covid-19.
Com as restrições sanitárias e a proibição de circulação, as viagens corporativas sumiram do mapa. Em fevereiro de 2020, mês da divulgação do primeiro caso de Covid-19 no Brasil, a Onfly fez R$ 1,7 milhão em GVM. Em abril, no primeiro mês pós-pandemia, foram R$ 14 mil.
“Desligamos todo mundo do comercial, da área de vendas e de operações e ficamos só com o time de tecnologia”, diz Linhares. “O meu primeiro salário seria pago em abril de 2020, mas eu fiquei sem nada. Foi um sufoco.”
Nesse período, não foram poucas as vezes que duvidaram que seu negócio seria capaz de renascer. Até Bill Gates, o lendário criador da Microsoft, fez uma previsão catastrófica. “Minha previsão é que mais de 50% das viagens a trabalho vão acabar”, disse ele. Agora Linhares diverte-se com a história. “Gates estava redondamente enganado”, diz Linhares.
De fato, o bilionário errou feio. Diversos estudos revelaram que, com a trégua na pandemia e os avanços das campanhas de vacinação, as viagens corporativas voltaram com tudo.
No Brasil, o setor faturou em maio R$ 1,093 bilhão, apenas 2,4% abaixo do mesmo mês de 2019, antes da pandemia. Em relação a abril de 2022, houve um crescimento expressivo de 25%, conforme dados da Associação Brasileira de Agências de Viagens Corporativas (Abracorp).
“Em certas situações, nada substitui o olho no olho”, diz Linhares. “É por isso que a Onfly tem crescido tanto.” Agora, com o cartão de crédito, visa alcançar voos mais altos.