Em um ano marcado pela reconfiguração do comércio internacional e da geopolítica, movimento liderado pelos Estados Unidos, o Brasil se beneficia da mudança de rota dos investimentos, registrando um aumento nas operações de M&A com capital asiático, especialmente da China.
A conclusão é de um estudo do UBS BB, obtido com exclusividade pelo NeoFeed. O relatório aponta que investidores da Ásia representaram cerca de 40% do volume de M&As cross border no Brasil até meados de setembro, que totalizou US$ 12,5 bilhões — bem acima dos 17% registrados em 2024.
Considerando todas as operações, os asiáticos responderam por 14,5% do volume transacionado do período, que somou US$ 35,2 bilhões.
Para Anderson Brito, chefe do banco de investimento do UBS BB, esses dados são o indício de que o Brasil está se beneficiando da nova configuração global. E a expectativa é de intensificação desse movimento, com o banco vendo um aumento da participação asiática nos mandatos de operações no País.
“Observamos um aumento de cerca de 50% nas transações mandatadas por asiáticos em relação ao ano passado”, afirma Brito. “Há um fluxo relevante de investidores asiáticos interessados no Brasil.”
O levantamento mostra que cinco das 16 maiores transações de M&A anunciadas em 2025 têm participação asiática. Um exemplo é o fechamento de capital da Serena Energia, com o fundo soberano de Singapura, GIC, anunciado em maio.
A operação, de US$ 2,8 bilhões, realizada em parceria com uma controlada da General Atlantic, ficou atrás apenas da aquisição da fatia que faltava à Prio no Campo de Peregrino, por até US$ 3,5 bilhões.
Das cinco transações com participação asiática, três envolvem empresas chinesas. A maior foi firmada em fevereiro, quando a China Merchants adquiriu 70% da Vast Infraestrutura, operadora de transbordo de petróleo no Porto do Açu, por cerca de US$ 1 bilhão.
No primeiro semestre, os investimentos diretos da China no Brasil somaram US$ 379 milhões, com expectativa de alcançar US$ 758 milhões até o fim do ano, quando os dados são anualizados — o maior nível desde 2014.
Esse interesse é impulsionado pelas restrições impostas pelos Estados Unidos à China, que limitam a aquisição de ativos e setores estratégicos, além da imprevisibilidade do presidente Donald Trump. O Brasil, por sua vez, mantém boas relações com a China e outras nações, ajudando a atrair recursos que antes iriam para o mercado americano.
“Clientes de diversos setores, incluindo chineses já alocados nos EUA, relatam que novos negócios não devem ocorrer lá, devido à incerteza nas relações bilaterais”, diz Brito. “Como o Brasil é o maior parceiro comercial da China e possui um mercado amplo, torna-se um alvo natural.”
Os ativos que mais atraem asiáticos são de infraestrutura, energia, mineração e óleo e gás — setores defensivos e com geração de caixa. Também há interesse em áreas cíclicas, como varejo e tecnologia, com foco em consolidação.
Potencial de alta
Enquanto asiáticos ampliam sua presença, os europeus mantêm sua tradicional posição de grandes compradores de ativos brasileiros, com as operações de companhias do Velho Continente representando 42% do volume total em 2025. Assim como os asiáticos, os europeus focam em infraestrutura e energia.
A participação dos Estados Unidos diminuiu, não por retração deliberada, mas pelo avanço asiático. Ainda assim, os americanos realizaram transações relevantes, como a compra da Suvinil pela Sherwin-Williams, por US$ 1,15 bilhão, e a participação no fechamento de capital da Serena.
O crescimento asiático e a consolidação europeia ocorrem num momento em que o volume de M&As no Brasil subiu 28% em relação ao ano anterior. As operações cross border representam 35% do total, acima dos 20% de 2024.
Apesar dos avanços, os números ainda estão abaixo da média dos últimos dez anos. O volume atual soma US$ 30 bilhões, podendo chegar a US$ 47 bilhões ao fim do ano — pouco abaixo da média histórica de US$ 50 bilhões. “O Brasil está crescendo, mas há espaço para mais”, diz Brito.
Um fator que pode impulsionar esse crescimento é a estabilidade cambial. Segundo Brito, após a volatilidade de 2024, a perspectiva de estabilidade traz segurança ao investidor de longo prazo, que não demonstra receio com as eleições nem com o câmbio.
“Um cenário mais estável e previsível, com menor volatilidade implícita, gera conforto para avançar nas transações de M&A”, afirma.