A decisão do final de semana da Opep+, de cortar a produção de 1 milhão de barris de petróleo por dia a partir de julho, foi vista como mais uma tentativa desesperada cartel de elevar o preço do petróleo, estacionado na faixa de US$ 70 o barril desde março.

Mas nada indica que o grupo - que reúne a Organização dos Países Exportes de Petróleo (Opep) e aliados - vai conseguir recuperar as cotações elevadas após o início da guerra na Ucrânia, há 15 meses, quando atingiu US$ 130 o barril. O corte foi uma decisão unilateral da Arábia Saudita em nome do cartel, anunciada durante a reunião da Opep+ em Viena, na Áustria.

O índice europeu do setor de petróleo e gás subiu 0,7% na segunda-feira, 5 de junho. O Brent, referência internacional em cotação, negociou o barril a US$ 77,45, aumento de 1,7% em relação a sexta-feira. O West Texas Intermediate, o marcador dos EUA, até subiu um pouco mais, 1,9%, mas o preço do barril ainda é inferior ao do Brent, US$ 73,08.

O anúncio da redução de oferta de petróleo pela Opep+ foi a terceira desde outubro, quando o cartel – criado em 2016 e composto pelos 13 países fundadores da Opep e outros 10 aliados - cortou a produção em 2 milhões de barris por dia. Em abril, nova redução, de 1,1 milhão de barris por dia, sem maiores efeitos.

A montanha-russa do preço do petróleo acompanhou a queda da economia global com a pandemia. Em 2020, o preço do petróleo bruto caiu devido à falta de compradores, quando os países entraram em confinamento. A Opep+ conseguiu aumentar os preços cortando drasticamente a produção, em mais de 9 milhões de barris por dia.

Após uma forte recuperação, com a crise de energia gerada com a invasão russa da Ucrânia, no ano passado, o preço do barril começou a cair novamente por causa da redução de demanda do Primeiro Mundo – com os EUA e países da zona do euro, às voltas com inflação elevada e juros altos – e da China, com economia em baixo crescimento.

A terceira tentativa em oito meses de alavancar o preço do barril abriu uma crise no final de semana dentro da Opep+, responsável por quase metade do petróleo produzido no mundo. Muitos países do bloco, em especial as nações africanas, resistiram em reduzir sua produção, essencial para cobrir seu orçamento. A decisão saudita de cortar voluntariamente a produção ajudou a fechar o acordo.

Liderança saudita

A reunião em Viena da Opep+ consolidou a liderança no cartel do príncipe saudita Abdulaziz bin Salman, o primeiro membro da realeza a servir como ministro do petróleo do país, cargo que ocupa desde 2019. Abdulaziz ganhou fama de negociador difícil por barganhar duramente na mesa da Opep, impondo a maioria das decisões.

Durante as reuniões em Viena, o príncipe saudita vetou a cobertura da imprensa no evento, pressionou os países africanos e voltou a ameaçar os traders de petróleo do mercado financeiro, que vinham apostando na queda do preço do barril. “Quero que os caras nos pregões fiquem o mais nervosos possível”, costuma repetir Abdulaziz.

O príncipe saudita conseguiu a proeza de comprar briga com a Rússia e os Estados Unidos. Desde as sanções impostas pelo Ocidente após a invasão da Ucrânia, que a impediu de manter suas exportações regulares de petróleo, a Rússia vem inundando o mercado aumentando suas vendas para China e Índia, o que ajuda a manter os preços baixos, para irritação saudita.

Abdulaziz também se desentendeu com Amos Hochstein, o enviado de energia da Casa Branca, depois que o reino recusou o pedido de Washington para aumentar a produção após a invasão da Ucrânia.

A obsessão saudita de manter o preço elevado do barril virou obrigação desde que o meio-irmão de Abdulaziz, o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, começou a lançar projetos gigantescos de infraestrutura visando o futuro do país sem a renda do petróleo.

Isso inclui um resort no Mar Vermelho do tamanho da Bélgica com hotéis no estilo das Maldivas pairando sobre a água e uma cidade futurística de US$ 500 bilhões no deserto. O país (maior produtor do planeta, com 10 milhões de barris/dia) depende de uma cotação mínima de US$ 80 o barril para conseguir bancar os investimentos em infraestrutura.

Apesar da pressão de Abdulaziz, o mercado de petróleo segue com previsões sombrias. Em maio, os analistas do Morgan Stanley reduziram sua previsão do Brent para o final do ano, de US$ 87,50 para US$ 75 o barril. Com o corte de produção anunciado no final de semana, o mercado estima que o preço do barril não deve ultrapassar a faixa de US$ 80.

Ou seja, a ameaça saudita de reviver o pesadelo de 1973 – elevação do preço do petróleo seguido de inflação no Primeiro Mundo, agora com ordem invertida – tem tudo para ser um furo n’água.