O crescimento menor do Produto Interno Bruto (PIB) do País no terceiro trimestre de 2022, de 0,4% em relação ao trimestre anterior, divulgado hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), reforçou a desconfiança de analistas e do mercado sobre as perspectivas da economia brasileira para o próximo ano.
O PIB vinha registrando três trimestres de alta consecutivas até apresentar índice de crescimento abaixo do previsto pelo mercado – acima de 0,6%. Dois setores se destacaram entre julho e setembro, com crescimento maior que a média geral: o de serviços (1,1%) e o da indústria (0,8%).
O setor de serviços, porém, é o que tem apresentado evolução mais robusta, registrando alta de 4,4% no acumulado dos últimos quatro trimestres – bem acima do avanço do PIB do País nesse período, que foi de 3%.
A previsão do mercado é que o PIB deverá fechar 2022 com um crescimento anual entre 2,7% e 3%. Para 2023, porém, a expectativa é que a economia brasileira avance apenas 1%.
Diante de um cenário de incerteza sobre a política fiscal do próximo governo, a grande questão é se os fatores que pressionam a economia brasileira vão impactar no setor de serviços, que movimentou R$ 1,5 trilhão no terceiro trimestre.
A economista Juliana Trece, que coordena o Monitor do PIB do FGV Ibre, lembra que parte do crescimento consistente do setor ainda se deve à recuperação da atividade econômica pós-pandemia. Ela acredita que dois fatores devem contribuir para diminuir a participação dos serviços no PIB de 2023.
“Um deles é a redução dos estímulos fiscais, que diminuíram o ICMS de produtos, tiveram grande peso no índice do setor de serviços no PIB deste ano e não deverão prosseguir", diz. "Outro fator é a evolução da taxa de juros, cujos efeitos demoram para serem sentidos na atividade econômica.”
Com as famílias mais endividadas a partir da manutenção da taxa de juros elevadas, o consumo deverá cair e, por tabela, impactar na parcela do setor de serviços no PIB de 2023. A tendência não é, no entanto, de uma queda brusca, mas de um crescimento mais suave do segmento, responsável por 70% do PIB brasileiro.
O setor de serviços registrou alta de 4,4% no acumulado dos últimos quatro trimestres
Rodolfo Margato, economista da XP, cita outros fatores que compensam a eventual queda de consumo, como a recuperação do mercado de trabalho.
“Apesar do grau elevado de informalidade da economia brasileira, de 40%, o índice de desemprego, que era de 11% antes da pandemia, já está em 8,3%", afirma. "E deve fechar o ano com 8%, isso impacta no aumento de renda das famílias.”
Morgato prevê que o crescimento do PIB de serviços em 2023 deverá ficar em 0,8%. O da indústria também deve recuar, de 0,8%, nesse trimestre, para uma média geral de 0,5% no ano que vem. A diferença, segundo ele, deverá ser feita pelo setor agropecuário, menos sensível às crises fiscais, com estimativa de crescimento de 7,5% em 2023.
Fartura
Nesse cenário, o agronegócio espera apenas que eventuais percalços da economia brasileira não atrapalhem seu crescimento. O setor foi responsável por 27,4% do PIB de 2021 – a maior participação desde 2004, de acordo com Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq USP.
É importante destacar que o termo agronegócio envolve um conceito mais amplo e abrangente que o de agropecuária, englobando atividades econômicas da porteira da fazenda para fora, como indústria e serviços.
Nos cálculos do IBGE, que contabilizam dados apenas da agropecuária, o setor registrou redução de 0,9% de crescimento entre julho e setembro, na comparação com o segundo trimestre. Em contrapartida, houve um avanço de 3,2% sobre igual período, há um ano.
O fato é que o agronegócio é responsável pelo Brasil ser o maior exportador global de soja, café, açúcar, suco de laranja e carne bovina. O segmento alimenta cerca de 1 bilhão de pessoas no mundo e movimenta RS 2,5 trilhões por ano.
O bom desempenho, com recordes sucessivos de produção em 2020 e 2021, tem impactado na criação de empregos em áreas como tecnologia, estratégia, marketing, cultivo e manejo dos alimentos.
Essa expansão é confirmada pelas 1,7 mil agtechs, nome dado às startups focadas no agronegócio, em atividade no País. Essa capilaridade explica a participação crescente do setor no mercado de trabalho brasileiro, estimado em 20,33%, empregando cerca de 20 milhões de pessoas.
O cenário para 2023 é animador. O setor caminha para colher uma safra recorde de grãos (cana, soja, milho e trigo). Apesar do aumento de custo de produção a partir de 2021, puxado pela alta dos preços de petróleo e fertilizantes, os custos começaram a ceder.
O agronegócio caminha para colher uma safra recorde de grãos em 2023
Para Leonardo Alencar, head de Agro, Alimentos e Bebidas da XP, as preocupações do setor não devem impactar na previsão de resultados positivos para o ano que vem, mesmo com margens menores.
“A discussão de taxação do agro em Minas Gerais e Goiás, por exemplo, causa mais desconforto do que se, de fato, vier a ocorrer", observa. "O que mais trava é a incerteza fiscal, mesmo assim, existe a perspectiva de grande demanda externa por grãos, principalmente da China."
O estudo Projeções do Agronegócio, Brasil 2021/22 a 2031/32 – preparado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), com Embrapa e UnB – reforça que essa bonança deve continuar no médio prazo.
A previsão é de que a produção de grãos no Brasil aumente 36,8% nos próximos dez anos, o equivalente a uma taxa de crescimento médio anual de 2,7%. Algodão, milho de segunda safra e soja devem continuar puxando o crescimento da produção de grãos. Assim, com o eventual recuo do setor de serviços, o agro deverá ser o grande indutor do PIB para 2023.