Em meados de abril, Ryan Schuermann foi procurado por Mike Adams, da casa de leilões Julien Auction House, em Berverly Hills, na Califórnia. Ele deveria restaurar um violão Framus Hootenanny, de 12 cordas. Quis saber de quem era, mas Adams não poderia dizer.
O trabalho só seria seu se Schuermann assinasse as quatro páginas de um contrato de confidencialidade. “Eu assino”, disse ele, como conta ao jornal Los Angeles Times.
Na quarta-feira, 29 de maio, no leilão Music Icons, da Julien, no Hard Rock Cafe da Times Square, em Nova York, a identidade do dono do violão finalmente veio a público. Aquele Framus Hootenanny pertencia a John Lennon.
Arrematado por quase US$ 3 milhões (exatos US$ 2.857.500), é o instrumento dos Beatles mais caro já vendido em um leilão – o recorde anterior era um J-160E Gibson, também de Lennon, comprado por US$ 2,41 milhões, em 2015.
Dado como desaparecido desde o início da década de 1970, o Framus Hootenanny foi usado nos álbuns Help! e Rubber Soul, gravados em 1965.
Em notas manuscritas, o produtor George Martin, considerado o “quinto Beatle” registra que aquele violão é o violão das músicas You’ve Got to Hide Your Love Away, It’s Only Love, I’ve Just Seen a Face e Help!.
E também de Norwegian Wood, mas dedilhado por George Harrison.
“Esse violão não é apenas uma peça da história da música, mas um símbolo do legado duradouro de John Lennon”, diz David Goodman, CEO da Julien, em comunicado.
Com tampo em abeto, fundo, laterais e braço em mogno, ponte e escala em jacarandá, o instrumento foi fabricado em 1964 pela alemã Framus, na cidade de Bubenruth, na Baviera. Lennon comprou o violão no mesmo ano. E, no final de 1965, o deu de presente para o músico Gordon Waller, da dupla Peter & Gordon, para quem ele e Paul McCartney escreviam canções.
Mais adiante, Waller passou o Framus Hootenanny para um de seus empresários, que o guardou no sótão de sua casa, no interior da Inglaterra.
"É do John"
O instrumento ficou lá por décadas; esquecido. Até que, no processo de desocupação do imóvel, o filho do dono da residência encontrou um estojo de violão, desgastado e empoeirado.
Perguntou ao pai o que era aquilo e, segundo o jornal de Los Angeles, ouviu: “Ah, isso é do John”. Imediatamente, o jovem ligou para a Julien.
Assim começa a história da recuperação do Framus Hootenanny Para a autenticação da peça, a casa de leilão trabalhou com o escritor Andy Babiuk, autor de Beatles Gear: All the Fab Four’s Instrumente from Stage to Studio.
Lançado em 2015, o livro detalha quais violões, guitarras, baterias, amplificadores e teclados a banda usou ao longo de toda a sua história, entre 1957 e 1970.
Babiuk reconheceu o instrumento imediatamente, como conta ao Los Angeles Times. Os instrumentos perdidos dos Beatles podem ser contados “nos dedos de uma mão”. Permanecem desaparecidas a guitarra Fender Stratocaster azul, usada por Lennon em Ticket to Ride, e a Gretsch Country Gentleman, tocada por Harrison em Ed Sullivan.
O Framus Hootenanny, número de série 51083, possui algumas marcas que o tornam “facilmente identificável quando comparado com as imagens do filme Help!”, lê-se em relatório da casa de leilão. “Essas marcações incluem as manchas mais escuras no padrão da roseta, veios de madeira reveladores na parte superior e o redemoinho do material do escudo de tartaruga.”
O violão foi resgatado do esquecimento em sua caixa original, da marca Maton, vista nas fotografias da época.
De couro marrom, o exterior está desgastado, mas, por dentro, o veludo amarelo foi preservado praticamente intacto – como mostram as fotografias coloridas das sessões da gravação de Rubber Soul.
Agora, o Framus Hootenanny de Lennon entra para a lista dos cinco violões e guitarras mais caras da história, vendidas em leilão, conforme a plataforma Guitar.com.
No topo do ranking está a Martin D-18E, de Kurt Cobain. Comprado em 1992, o instrumento foi deixado para Francis Bean, filha do líder do Nirvana, quando ele morreu em 1994.
No acordo de divórcio, no entanto, a guitarra ficou com o ex-marido dela, Isaiah Silva. Em 2020, Peter Freedman, fundador da RØDE Microphones, comprou a Martin D-18E por US$ 6 milhões.