Não basta ter um cheiro bom e agradável. É preciso ser funcional. Essa onda, que já havia chegado aos alimentos, está movimentando a indústria de perfumes. No ao passado, esse mercado foi avaliado em US$ 9,5 bilhões, segundo a consultoria Market Watch. Em 2028, deve atingir US$ 14 bilhões.

Mas o que são perfumes funcionais? Os aromas de lavanda, camomila, gerânio, verbena e jasmim, por exemplo, relaxam. Limão, laranja, tangerina e bergamota revigoram. Hortelã, eucalipto, pinho, musgo e madeira melhoram a concentração e a produtividade. Há os que proporcionam felicidade. E os que facilitam as tomadas de decisão, reforçam a motivação e aumentam a autoconfiança.

Observe o exemplo de O Boticário, a colônia masculina Malbec X mistura fragrâncias da família dos amadeirados com o secreto “fator X”, um despertador do “desejo e do poder de atração”.

Lançado em 2018, pela inglesa The Nue Co, o primeiro funcional do mundo, o Functional Fragrance, combina notas amadeiradas picantes com cardamomo verde, palo santo, íris e coentro. A finalidade? Aliviar o estresse.

E todas essas benesses, garantem os fabricantes, estão comprovadas por eletrocardiogramas, encefalogramas, ressonâncias magnéticas e outros tantos exames.

A descoberta do poder dos aromas na modulação do humor, emoções e sentimentos levou a perfumaria para os laboratórios de estudos do cérebro e comportamento e obrigou a indústria a aumentar os aportes em pesquisas científicas e com os consumidores.

Em alguns estudos, O Boticário, por exemplo, chega a consultar 10 mil pessoas, diz Gustavo Dieamant, diretor de pesquisa e desenvolvimento da companhia. Elas guiam o núcleo de inteligência olfativa na criação de novas fragrâncias.

Sem a ajuda das tecnologias emergentes, em especial a inteligência artificial (IA), porém, interpretar as aspirações dos clientes e decodificá-las em cheiros seria bem complicado.

Recentemente, a suíça Givaudan, líder global na fabricação de fragrâncias, apresentou ao mercado a última versão do MoodScentz+, um trio de ferramentas ultra-hightechs capaz de captar, por intermédio de imagens, as respostas do cérebro aos aromas.

O sistema registra a atividade cerebral enquanto os voluntários experimentam determinadas fragrâncias - o que é uma mão na roda já que a maioria de nós tem muita dificuldade em descrever cheiros. Com a inovação, a Givaudan criou o “mapa de odores do de humor”. Os algoritmos então traduzem essas informações em combinações de ingredientes com benefícios emocionais específicos.

“O MoodScentz+ fornece insights mais profundos sobre as respostas emocionais e cognitivas às fragrâncias”, lê-se em comunicado da empresa. Da base de dados com cerca de 200 milhões de informações, a Givaudan chegou a três grandes grupos de “estados de estados de espírito positivos”: revigoramento, relaxamento e descontração e felicidade.

No O Boticário, à semelhança de um exame de sangue, o “nariz digital” captura todos os componentes químicos de um fragrância, o que ajuda a companhia a traduzir as preferências dos consumidores. A IA é de grande serventia também na sugestão de combinações dos cerca de 3 mil ingredientes, catalogados na biblioteca de aromas do grupo, no momento da criação de um perfume.

Phantom, da Paco Rabanne, usou inteligência artificial para aumentar concentração das moléculas associadas ao cheiro de gerânios
Phantom, da Paco Rabanne, usou inteligência artificial para aumentar concentração das moléculas associadas ao cheiro de gerânios

A tecnologia foi decisiva, por exemplo, para o desenvolvimento do masculino Phantom, da grife Paco Rabanne, lançado em 2021. Graças ao algoritmo desenvolvido pela casa de fragrâncias, os perfumistas aumentaram em dez vezes, a concentração das moléculas associadas ao cheiro de gerânios. Os homens que usaram Phantom garantem ter sido acometidos por uma sensação “vertiginosa” de que eram irresistíveis.

Os aromas funcionais parecem levar a perfumaria de volta às suas raízes. Se hoje os perfumes são a expressão de um estilo de vida, por volta do ano 3 mil antes de Cristo, os egípcios acreditavam que o cheiro produzido pela queima de madeiras, ervas e incensos os purificariam e protegeriam contra as doenças – e os maus espíritos. Do latim, “per fumum”, “através da fumaça”.

Milênios depois, agora com o aval da ciência, o mais poderoso gatilho da emoção e da memória, o perfume (funcional) acena com promessa de bem-estar – em gotas.