Mais de nove milhões de beneficiários da Previdência foram lesados por descontos mensais não autorizados. Entre 2019 e 2024, o prejuízo ultrapassa R$ 6,3 bilhões. Um desfalque em escala industrial, sustentado por associações fantasmas, sindicatos de fachada e servidores públicos que se aliaram ao crime para depredar quem mais deveria ser protegido.

Pequenos valores, quase sempre abaixo de R$ 30, eram subtraídos mensalmente sem ciência dos aposentados. O mecanismo se repetia de forma sistemática, criando uma engenharia de fraude que prosperou por anos. Um golpe silencioso, mas perverso, praticado por uma estrutura paralela infiltrada no Estado.

A conivência de agentes públicos precisa ser tratada com a seriedade que o caso exige. A apuração deve ser técnica, mas também exemplar. Servidores que corromperam o sistema para beneficiar organizações criminosas devem ser responsabilizados de forma plena — administrativa, civil e criminalmente. É imprescindível também punir os dirigentes das entidades fraudulentas e cassar, com efeito imediato, seus registros e convênios.

Relatórios do Tribunal de Contas da União já haviam alertado para os riscos. A digitalização da folha de pagamento não foi acompanhada de autenticação biométrica, nem de controle independente das autorizações. A fragilidade sistêmica permitiu que essas entidades atuassem com liberdade e acesso direto à renda dos aposentados.

Esse modelo precisa ser desmantelado. É urgente implementar um sistema único e rastreável de gestão das consignações, com validação segura, auditoria permanente e reembolso automático de valores indevidos. A proteção dos mais vulneráveis não pode ser uma promessa abstrata. Deve ser um compromisso mensurável — e verificável.

A aposentadoria é mais do que um benefício. É um pacto intergeracional que depende da integridade institucional. Onde há omissão diante do crime, há ruptura de confiança.

A resposta à crise não será medida apenas em cifras recuperadas, mas na coragem de reconstruir os controles, punir os corruptos e reafirmar a função ética do Estado.

* Camila Funaro Camargo Dantas é CEO da Esfera