O CEO de uma empresa de tecnologia não escondia a sua frustração. Tinha contratado muita gente de curriculum estelar, superbem preparados e com track record de resultados em empresas famosas. Mas boa boa parte deles já tinha saído e alguns dos que ficaram não apresentavam os resultados esperados. “Não entendem a nossa cultura”, reclamava ele.
“O que você está fazendo verdadeiramente para atacar esse problema?”, questionei-o para deslocá-lo desse papel de vítima. A entrada e saída de grandes executivos de scale-ups a unicórnios é bem maior do que se imagina. E isso afeta o desempenho das empresas bem mais do que os CEOs e empreendedores mensuram.
Aprendi isso em uma aula de Christiane Porrat em um curso que fiz na Georgetown University. Ao contrário de 95% dos livros sobre gestão que procuram dissecar receitas de sucesso, ela, em seu livro The Cost of Bad Behaviour, tenta mensurar o quanto decisões, processos e pessoas erradas custam caro.
Quanto custa uma reunião ineficiente onde se gasta horas e não se decide nada? Já pensou em quantificar isso? Usando esse mesmo racional em uma contratação de um executivo sênior errada, custa muito.
Estimando que levamos seis meses para treinar, seis para decidir que não deu certo, três meses para demitir e mais três meses para achar o substituto e começar tudo de novo, o valor, no mínimo, passa de um ano de salário, além dos resultados ruins pela ineficiência. Se acrescentarmos o custo de não liderar bem o time e a redução do e -NPS da equipe e suas consequências, a depreciação é bem maior.
Melhorar a aderência no processo de contratação é fundamental para menos custos e mais resultados. Uma empresa que conheço decidiu implantar um comitê cultural formado por colaboradores de diversos níveis que entendem o jeitão dela. O objetivo é validar um candidato sênior antes de enviar uma proposta de contratação. Essa foi uma ideia que reduziu bastante o turnover no alto escalão.
Implantar o comitê cultural é, de fato, uma boa ideia. Mas devemos pensar também se os funcionários que estão na empresa entendem o modus vivendi dela e como ajudá-los a performar melhor nesse ambiente.
Trabalho e interajo com empresas de todos os tamanhos. Percebi que várias companhias de tecnologia lideradas por empreendedores têm um traço cultural em comum. Acabei chamando-as de empresa fliperama, tipo aqueles pinballs que existem em bares e shoppings e que atraem mais adultos que crianças.
Imagine aquela máquina cheia de luzes, sons, armadilhas e surpresas te chamando para jogar? Quanto você bate nos flips com as bolinhas, mais pontos vai ganhando e se divertindo. No jogo, as bolinhas vão ricocheteando em vários obstáculos, às vezes entram em buracos negros, caem direto e se perdem.
Do nada, voltam sem sabermos ou aparecem cinco bolinhas de uma vez só. É um mix de ilusão, adrenalina, decepção e prazer. Tudo junto e misturado. Para completar, tem o tilt e bônus depois do game over.
Eu mesmo colocava uma grana em um cartão e passava horas nos fins de semana tentando fazer o maior número de pontos possíveis e bater recordes.
A lógica para se dar bem no fliperama é navegar no imprevisto. Essas empresas, neste perfil, têm muito dessa montanha-russa de emoções. Uma hora dobra de tamanho. Depois tem de se reorganizar. Na sequência, faz um round que catapulta o valuation. Aí, o mercado seca e o caixa passa a ser gerenciado com uma lupa.
Se você é CEO, founder ou funcionário de uma empresa fliperama sabe bem o que estou dizendo e deve ter muitos exemplos e histórias para comprovar. Para navegar melhor e se dar bem nessa máquina de emoções tenho duas sugestões:
1) Não se iluda quando estiver no sol e nem se desespere quando cai na geladeira do buraco negro
Como no fliperama, tudo muda muito rápido. Se achar o máximo quando esta na onda boa, aumenta muito sua decepção quando o vento muda. Se desesperar quando está na Sibéria tambem não ajuda em nada. O que ajuda é entender o que fazer para maximizar o seu grau de contribuição e utilidade nos momentos atuais ou ficar de olho na próxima onda e se preparar antecipadamente para navegar e aproveitar o hype dela.
2) Tenha uma postura mais de sócio e menos de executivo, independentemente da sua posição na empresa
Essa é uma das maiores preocupações dos empreendedores com quem me relaciono. Segundo eles, tem muito executivo que é louco por mais stock options, mas quer plano de carreira, planejamento estratégico imutável e bônus garantido. E que só se preocupa com o cargo, com os eventos ou se promover no LinkedIn. Pode ser o começo do fim. Se você se percebeu nessa armadilha, mude rapidamente.
Abrace a mudança aumentando sua colaboração e entrega no que está pegando agora. Não se preocupe se hoje você lidera uma equipe gigante e amanhã vira um IC (individual contributor) para um projeto importante. Se autoavalie sobre o quanto sua entrega impacta o momento e o futuro de empresa. Se não sentir bom impacto, se mexa em achar um lugar.
Refletir e praticar esses comportamentos aumenta muito seu impacto na empresa fliperama. Nesse jogo, ganha você, a empresa e seu time. Todo mundo sai mais animado e aposta mais fichas nas próximas partidas.
* Sergio Chaia atua como coach de CEOs, empreendedores e atletas de alto rendimento. Foi chairman da Óticas Carol e CEO da Nextel. Atua como conselheiro da Daus e da Ri Happy. É também conselheiro e educador do Instituto Ser + , uma ONG voltada à recuperação de jovens em situação social de risco preparando sua inserção no mercado de trabalho. Autor do livro “Será que é possível?”