A sinalização dada pelo Comitê de Política Econômica (Copom) do Banco Central, na ata da reunião publicada em 23 de setembro, de que haverá um “período bastante prolongado” da taxa Selic a 15% ao ano, mostra que o governo federal está errando em sua política econômica.
A avaliação é do empresário Carlos Jereissati Filho, da família controladora da rede de shoppings Iguatemi. Para ele, que foi CEO da companhia entre 2005 e 2021 e hoje integra o conselho de administração, é necessário que o governo federal enfrente de vez o grave problema do desequilíbrio fiscal.
“O Brasil precisa desse equilíbrio fiscal para poder investir, crescer e entregar serviços de qualidade para o cidadão na ponta. Essa é a grande preocupação”, diz Jereissati Filho, em entrevista ao NeoFeed.
Segundo ele, o governo federal precisa avançar com a reforma administrativa, implementar um ajuste nas contas e demonstrar capacidade de pagar a dívida pública. “O que precisa é que o dinheiro fique cada vez mais na mão das pessoas e que elas possam decidir o que fazer com ele.”
Se o Iguatemi não pretende pisar diretamente no freio em razão dos juros altos, Jereissati Filho afirma que o caminho agora é alocação com mais disciplina de recursos em M&As.
Em julho de 2024, a companhia realizou a aquisição de 16,6% do Shopping Rio Sul, no Rio de Janeiro, por R$ 360 milhões. Em julho deste ano, o Grupo Iguatemi investiu R$ 2,6 bilhões na compra de uma fatia do Pátio Paulista e na ampliação da participação no Pátio Higienópolis, ambos em São Paulo.
Por outro lado, a empresa concluiu a venda de 49% de participação do Market Place (em São Paulo) e Galleria Shopping (em Campinas), por R$ 500 milhões.
Para o empresário, no entanto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem dado sinais de que está disposto a ouvir sugestões da iniciativa privada sobre a necessidade de mudanças nas políticas públicas. “As pessoas querem mais resposta e mais entrega. E mais responsabilidade.”
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista concedida por Jereissati Filho após o Encontro de Líderes 2025, organizado pela organização social Comunitas.
Havia expectativa do início de ciclo de queda da taxa de juros, mas o Copom, na última reunião, indicou um longo período de 15% ao ano. Na sua avaliação, o que isso significa?
Para a taxa de juros cair, é importante que o governo federal aponte uma solução para o equilíbrio fiscal. Enquanto isso não for claramente apontado, fica a dúvida se amanhã as pessoas vão conseguir pagar a conta que devem hoje. O Brasil precisa desse equilíbrio fiscal para poder investir, crescer e entregar serviços de qualidade para o cidadão na ponta. Essa é a grande preocupação.
O Brasil chegou ao platô dos juros?
Acho que sim. Acredito que a queda da inflação vai abrir espaço para a queda dos juros. Mas o Brasil precisa ousar, ir além. Não podemos aceitar só o que é possível. É preciso fazer o que é necessário. E o necessário é uma taxa de juros muito menor à que temos hoje, um crescimento muito maior, oportunidade de emprego e renda, e deixar que as pessoas cuidem de suas próprias vidas.
Mas como fazer o que é necessário?
O que sinto é que cada um de nós, na medida em que crescemos, deseja buscar alternativas, como o empreendedorismo. Isso em todas as classes. E, para que as pessoas possam empreender, é necessário que haja uma economia com dinamismo. E não há dinamismo com os juros tão altos.
O que falta para isso acontecer?
Falta reforma administrativa, equilíbrio nas contas e falta o governo demonstrar que vai ter capacidade de pagar a dívida pública. O que precisa é que o dinheiro fique cada vez mais na mão das pessoas e que elas possam decidir o que fazer com ele. Essa é a visão que cada vez mais o mundo inteiro tem sobre a gestão da economia.
"Falta reforma administrativa, equilíbrio nas contas e falta o governo demonstrar que vai ter capacidade de pagar a dívida pública"
Isso conflita, na sua avaliação, com a ideia de o governo, cada vez mais, aumentar o volume de recursos para os programas sociais?
Há uma preocupação enorme sobre as pessoas que precisam do Estado brasileiro. Ninguém está falando em tirar os benefícios sociais que fazem essa transição, mas olhar para a frente tem a ver com o dinamismo à economia brasileira. E não é isso que enxergamos agora.
Nesse sentido, o governo federal está falhando?
Eles estão tentando acertar, mas, na prática, o governo só vai acertar quando a taxa de juros cair. É importante que eles continuem buscando soluções para que os juros caiam.
Quanto isso afeta o varejo e o setor imobiliário, áreas da qual o Grupo Iguatemi atua?
Afeta muito. Prejudica o consumo, o varejo como um todo, o dinamismo da economia e afeta os investimentos. Isso impede uma decisão de investimentos e de crescimento futuro, justamente por causa de um juro muito alto. O varejo é muito sensível a isso.
Recentemente, o CEO da Multiplan, Eduardo Peres, disse ao NeoFeed que a companhia estaria pisando no freio em investimentos por causa dos juros altos. No caso do Iguatemi, isso também deve acontecer?
O Iguatemi fez movimentos importantes nos últimos meses, com a aquisição de parte do Shopping Rio Sul, do Pátio Paulista, participação maior no Pátio Higienópolis, mas fez de uma forma disciplinada, e com reciclagem de ativos. Estamos sempre de olho nas oportunidades. Os investimentos estão presentes. Sempre que houver uma oportunidade, vamos olhar com carinho.
Há novas aquisições em vista?
Por enquanto, não.
O setor privado pode contribuir para que o poder público enxergue a necessidade dessas mudanças nas políticas públicas?
Só vamos superar isso se poder público e setor privado trabalharem juntos. De médio e longo prazo, isso pode ter um impacto enorme na melhoria da qualidade de vida das pessoas. É por meio de parcerias que o Brasil acelera e consegue buscar soluções em conjunto. Os empresários querem colaborar e não competir. O Brasil só avança se todo mundo trabalhar na mesma direção. E a Comunitas tem dado essa contribuição.
Na sua avaliação, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, compreende isso?
Acredito que sim. Tivemos oportunidade de trabalhar com o ministro em outras ocasiões e ele tem se mostrado aberto a ouvir. As pessoas querem mais resposta e mais entrega. E mais responsabilidade.