Já se passaram quase cinco anos desde que Carlos Ghosn deixou o comando da aliança entre Renault e Nissan, em uma trama intrincada que envolveu troca de acusações, uma prisão e uma fuga ousada, entre outros episódios. E, a julgar pelos novos desdobramentos, está longe de um desfecho.
No capítulo mais recente dessa saga, o executivo franco-brasileiro de 69 anos entrou com um processo de mais de US$ 1 bilhão contra a Nissan, além de duas empresas e doze pessoas não identificadas. O montante equivale a uma frota de 40,6 mil Kicks no Brasil ou 75% do total de emplacamentos de todos os modelos da montadora japonesa no Brasil no ano passado.
Segundo a agência Associated Press, o caso foi registrado na justiça libanesa em maio e tem uma primeira audiência prevista para setembro.
A ação cita uma campanha orquestrada contra Ghosn, a partir de calúnias, difamação, desinformação e fabricação de provas. Isso teria levado à sua prisão no Japão, em novembro de 2018, sob acusações como uso indevido de recursos da montadora para fins pessoais e sonegação, entre outras supostas condutas.
O Líbano foi justamente o destino escolhido por Ghosn em dezembro de 2019, quando o executivo escapou do Japão em um jato particular. Detalhe: o executivo fugiu do país escondido em uma caixa na aeronave.
Desde então, as autoridades libanesas já receberam três notificações da Interpol a partir de mandados de prisão emitidos contra ele pela França e o Japão. No país, onde passou parte da sua infância, ele aguarda um julgamento da justiça japonesa.
Ghosn já negou em outras oportunidades todas as acusações e ressaltou que tinha sido vítima de uma conspiração arquitetada por executivos da Nissan que, por sua vez, não estariam dispostos a aceitar a concretização da combinação das operações da montadora com a Renault.
Antes desse roteiro enveredar por esses termos, Ghosn figurava como um dos todo-poderosos da indústria automobilística. Parte desse status veio justamente pelo fato dele ter conduzido a união entre Renault e Nissan e, com essa estratégia, ter evitado a falência das duas companhias.
A trajetória de Ghosn
Nascido em Porto Velho (RO), educado no Líbano e tendo vivido parte da sua vida na França, o executivo iniciou sua carreira na fabricante de pneus Michelin e, anos depois, chegou ao posto de presidente da subsidiária sul-americana da companhia.
Foi justamente nessa época, quando liderou uma reviravolta na operação, que o executivo começou a ganhar fama no setor, o que fez com que ele fosse nomeado para comandar a unidade da empresa nos Estados Unidos, em 1990.
Seis anos depois, ele desembarcou na Renault, onde atuou nas áreas de pesquisa, engenharia e desenvolvimento de produtos. Quando a montadora comprou uma fatia da Nissan, Ghosn passou a acumular funções na operação até assumir como presidente, no ano 2000.
Na época, a Nissan tinha um grande rombo operacional e caminhava para a bancarrota. No novo posto, entre outras ações, Ghosn demitiu 21 mil funcionários, fechou cinco fábricas e vendeu unidades que não davam resultado. Em um ano, a montadora voltou a ser lucrativa.
Anos mais tarde, essa relação teria ganho contornos críticos e menos positivos a partir das discordâncias da montadora japonesa quanto às estratégias implantadas por Ghosn. E, em especial, pelo entendimento de que o executivo, até por sua origem, privilegiar o sócio francês nessa equação.
Curiosamente, a Nissan está protagonizando outra trama mais recente envolvendo o seu alto escalão. Nos últimos dias, rumores crescentes no mercado apontam para a demissão de Ashwani Gupta, diretor de operações da montadora.
A provável saída do executivo, que já foi apontado como futuro CEO da companhia japonesa, teria como justificativa uma investigação secreta, conduzida internamente, que teria encontrado uma série de indícios de má gestão.