Até pouco tempo, o mercado de cannabis medicinal no País estava restrito às importações e, consequentemente, a preços elevados e volumes incipientes. Entretanto, a aprovação da venda desses produtos nas farmácias, no fim de 2019, foi a deixa para que o setor começasse a atrair investimentos.

Desde então, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já deu o sinal verde para a venda, sob prescrição médica, de mais de 20 medicamentos. E o nome mais recente a reforçar as prateleiras com seu produto foi o laboratório paranaense Herbarium.

Especializada em fitoterápicos – os remédios obtidos a partir de plantas medicinais, a farmacêutica estreou nesse mercado em julho deste ano, com o óleo Full Spectrum. E, em sua visão, esse é apenas o primeiro passo dentro de uma categoria que ainda vai ocupar muito mais espaço nas gôndolas das drogarias.

“Estou há 37 anos na indústria farmacêutica e vivi para ver um fitoterápico ser o blockbuster global do setor”, diz Marcelo Geraldi, CEO da Herbarium, ao NeoFeed. “Hoje, a cannabis é o que há de mais relevante e revolucionário nesse mercado.”

Para reforçar que o movimento não se resume a uma mera aposta, o executivo recorre aos indicadores e projeções do laboratório para traduzir, em números, o potencial dos medicamentos à base de cannabis no horizonte da companhia.

“Nós prevemos fechar 2023 com um faturamento na ordem de R$ 350 milhões e, em cinco anos, dobrar de tamanho”, afirma. “Nesse intervalo, tenho a convicção de que a cannabis medicinal vai ser o nosso principal produto e vai responder por uma fatia de 15% a 20% do negócio.”

A jornada da Herbarium nessa esfera teve início em 2021, quando a empresa começou a desenvolver esse portfólio. Até aqui, o processo demandou um aporte de cerca de R$ 5 milhões, um volume de recursos que, segundo Geraldi, será mantido, em base anual, na expansão das ofertas na categoria.

Primeiro fruto desse trabalho, o Full Spectrum foi aprovado pela Anvisa no fim de 2022 e é indicado para dores, inflamações e quadros neurodegenerativos, como Parkinson. Disponível em todas as grandes redes de farmácias do País, o óleo tem um preço na faixa de R$ 500.

“Hoje, estamos principalmente nas lojas localizadas nas capitais, mas temos 160 representantes médicos em todo o País”, explica o executivo. “Com o giro aumentando e mais médicos aderindo, a tendência é que essa capilaridade vá aumentando. Esse crescimento será quase que orgânico.”

Os próximos lançamentos do portfólio da Herbarium serão produzidos na unidade da empresa, em Colombo (PR)

No que diz respeito à produção, nesse primeiro projeto, a Herbarium está importando o produto do Uruguai, por meio de uma parceria com a empresa local Aurora, que fica responsável pelo cultivo e a extração da planta. Todo o processo foi certificado pela equipe técnica do laboratório.

“Para as próximas apresentações de canabidiol, vamos trazer o extrato e fabricar na nossa unidade de Colombo, no Paraná”, diz Geraldi. “Já temos toda a estrutura preparada e certificada pela Anvisa, e estamos prontos para iniciar essa produção local em 2024.”

Sob a perspectiva de colocar essas linhas para operar, a Herbarium já tem outros três medicamentos em processo de aprovação na Anvisa. Entre eles, um produto indicado para tratamentos neuropsiquiátricos, como autismo, epilepsia, insônia e depressão.

O impulso das farmas

Com esses planos de expansão, a farmacêutica busca marcar posição em um mercado que ainda movimenta números tímidos, mas cujos indicadores começam a registrar um crescimento exponencial. É o que mostra um levantamento da Associação Brasileira da Indústria de Canabinoides (BRCann).

A partir de dados da IQVIA, consultoria especializada no varejo farmacêutico, o estudo reporta que as vendas de medicamentos à base de cannabis no País cresceram 164% em 2022, totalizando R$ 63,3 milhões. Foram comercializadas 155,8 mil unidades no período, um avanço de 304% sobre 2021.

Apesar dos indicadores ainda modestos, Geraldi ressalta que a categoria ainda é nascente e que a perspectiva é de que esse mercado ganhe muito mais corpo e velocidade com o avanço da regulação e, sobretudo, de uma questão diretamente ligada a esse cenário de maior segurança jurídica.

“A indústria tradicional, até por conservadorismo, não foi a protagonista em trazer essa opção. Isso veio dos produtores”, diz. “Agora, com o setor sendo regulamentado, o maior desafio para as farmas é trazer a categoria para aquilo que é conhecido, ou seja, a prescrição médica e a venda na farmácia.”

Ele destaca, porém, que é justamente essa corrida que vai dar o fôlego necessário para impulsionar de vez a categoria. “Com a entrada das farmas, que é com quem os médicos estão acostumados a falar e confiar, a tendência é que esse mercado avance muito rápido”, observa.

Geraldi acrescenta que, à medida que os estudos sobre a eficácia de cada medicamento evoluem, em linha com as aprovaçãos da Anvisa, um outro cenário será consolidado. “O mercado vai ser depurado e só as indústrias com a qualidade necessária vão conseguir se manter”, completa.

Além da Herbarium, a lista de empresas dispostas a ocupar esse espaço já inclui nomes como a também paranaense Prati-Donaduzzi, que inaugurou a presença da categoria no varejo farmacêutico, e players como GreenCare, Belcher, Ease Labs e Verdemed.

À parte dessa disputa no varejo, a Herbarium vai investir no mercado de licitações, até então, inédito para a empresa. O plano é aproveitar a tendência de um salto das compras públicas de medicamentos à base de cannabis, em busca de reduzir os custos públicos com a judicialização nessa esfera.