Com raras exceções, entre elas a chinesa Huawei, a disputa pelo topo no mercado global de smartphones sempre esteve centrada em batalhas travadas por duas protagonistas, a sul-coreana Samsung e a americana Apple.

Líder do segmento, a Samsung vem tentando reduzir a enorme distância para a conhecida rival em outra categoria, que começa a ganhar escala entre os consumidores: os wearables ou dispositivos vestíveis. E, nesse novo cenário de competição, o mercado brasileiro pode ganhar destaque.

Conforme apurou o NeoFeed, a companhia sul-coreana obteve no início desta semana a aprovação para um projeto de fabricação local de seus relógios inteligentes. Pelos termos descritos no documento, os smartwatches da marca serão produzidos em Manaus (AM), com um aporte total previsto de R$ 653 milhões, sendo R$ 455 milhões de investimento fixo e R$ 198 milhões em capital de giro.

Segundo o projeto, a Samsung planeja produzir 800 mil unidades no primeiro ano de operação. Nos doze meses seguintes, o volume previsto é de 1,1 milhão de relógios. E no terceiro ano, 1,4 milhão de dispositivos. Atualmente, a empresa já fabrica no País produtos como smartphones, tevês e notebooks. Procurada, a companhia não fez comentários para está reportagem.

No caminho para replicar sua fortaleza dos smartphones na nova categoria, a Samsung tem encontrado outros competidores, além da velha conhecida Apple. E o Brasil é um bom exemplo desse cenário.

“A grande justificativa do projeto de produção local é fazer frente a outros fabricantes que estão ganhando espaço no varejo informal, em especial, os chineses”, diz uma fonte do setor. “A estratégia da Samsung é trazer tecnologias mais robustas e, ao mesmo tempo, ser competitiva no preço”, afirmou o executivo, que forneceu ao NeoFeed alguns dados do mercado local para explicar esse contexto.

No segmento de relógios inteligentes mais avançados, que permitem, por exemplo, fazer e receber chamadas, a Samsung lidera com uma participação de 56%. A Apple é a segunda colocada, com uma fatia de 17%.

Já entre os dispositivos mais básicos, que incluem também pulseiras inteligentes, a Samsung chegou à liderança no segundo trimestre, com o lançamento da pulseira Fit E e uma fatia de 47%. No terceiro trimestre, no entanto, a chinesa Xiaomi retomou o topo, ao alcançar uma participação de 48%, contra 26% da sul-coreana.

Tempo de maturação

Apesar de ainda não movimentar o mesmo volume de outros mercados, no Brasil, a categoria de smartwatches já registra indicadores que sinalizam boas perspectivas. O segmento deve fechar o ano com um crescimento de 500%, para R$ 300 milhões, segundo a consultoria IT Data.

“É um mercado ainda bem recente”, afirma Ivair Rodrigues, sócio da IT Data. “As pessoas estão experimentando o produto. Novas tecnologias virão e o interesse crescerá ainda mais.”

Analista de mercado de celulares e dispositivos da consultoria IDC, Renato Meireles também destaca o estágio de maturação do segmento. “Os fabricantes ainda estão entendendo se o consumidor prefere dispositivos com tecnologias mais básicas ou avançadas”, afirma. “O próprio consumidor ainda está descobrindo a real necessidade dos vestíveis.”

Em uma pesquisa realizada no Brasil pela IDC, 55% dos consumidores afirmaram que usam smartwatches para monitorar atividades física

Em uma pesquisa recente realizada no Brasil pela IDC, 55% dos consumidores afirmaram que usam esses dispositivos para monitorar atividades física e para fins de saúde. Já entre os que planejam comprar um produto da categoria, esse índice foi de 62%, com o acréscimo da função de ouvir música.

Esse estágio de desenvolvimento do mercado é também expresso na divisão entre os diferentes dispositivos que integram o segmento de wearables. No terceiro trimestre, foram vendidos 84,5 milhões de vestíveis em todo o mundo, um crescimento de 94,6% sobre igual período, em 2018, segundo a IDC.

Dentro desse universo, os relógios tiveram uma participação de 20,9% e as pulseiras, de 22,7%. O destaque ficou com os fones de ouvido, com 48,1%. Levando-se em conta todos esses aparelhos, a Apple se manteve no topo, com 35% do mercado. Xiaomi e Samsung vieram na sequência, com 14,6% e 9,8%, respectivamente.

Mercado aberto

Enquanto afinam o entendimento sobre as preferências do consumidor, as fabricantes buscam se posicionar antes da estabilização do mercado. Globalmente, a Apple está bem à frente também nos relógios inteligentes.

No terceiro trimestre, a companhia do CEO Tim Cook vendeu 6,8 milhões de unidades, o equivalente a 47,9% do segmento, segundo a consultoria americana Strategy Analytics. Com 1,9 milhão de relógios vendidos no período e uma participação de 13,4%, a Samsung ficou com a segunda posição.

“O Apple Watch está impulsionando o crescimento da categoria no high-end”, afirma Neil Mawston, analista da Strategy Analytics, que prevê um crescimento de 35% da categoria em 2020. “Enquanto a Samsung está alimentando o mercado intermediário e competindo com Garmin, Huawei, Xiaomi, Fitbit e outros players.”

Lançado em 2015, o Apple Watch integra os esforços da Apple para diversificar suas receitas e reduzir a dependência do iPhone, seu carro-chefe. No ano fiscal encerrado em 28 de setembro, as vendas do smartphone totalizaram US$ 142,3 bilhões, contra US$ 164,8 bilhões, um ano antes.

No mesmo período, a receita da divisão Wearables, Home and Acessories, da qual o Apple Watch faz parte, foi de US$ 24,4 bilhões. Um ano antes, a área faturou US$ 17,4 bilhões. Em setembro, a empresa comandada por Tim Cook anunciou uma nova versão do relógio que, entre outros recursos, permite fazer e receber chamadas.

Essas e outras funções similares também integram o Galaxy Watch Active 2. Uma das novas apostas da Samsung na categoria, o relógio foi anunciado em agosto.

À parte dos recursos ofertados, a empresa tem outras cartas na manga para acirrar essa disputa. Ou melhor, outros dispositivos. Para analistas, a forte presença da companhia em segmentos como smartphones e tevês é um diferencial. Bem como a relação com operadoras de telefonia e varejistas que essa escala proporciona.

“A Samsung pode agrupar seus relógios com os smartphones no varejo e fazer vendas cruzadas para sua enorme base de clientes em todo o mundo”, diz Mawston. “Eles têm uma base de ‘fãs’ maior que a Xiaomi e quase tão grande quanto a Apple.”

No meio dessas duas disputas, a Samsung deve ter, em breve, outro concorrente de peso. Em novembro, o Google pagou US$ 2,1 bilhões pela americana Fitbit. No início do ano, a gigante de buscas já havia desembolsado US$ 40 milhões para comprar tecnologias e patentes de smartwatches da Fossil.

Uma das pioneiras desse mercado, a Fitbit vem perdendo fôlego a partir da ascensão de outras empresas, em especial, a Apple. Mas pode ser a porta de entrada para que o Google endureça ainda mais esse novo campo de batalha. “Em 2020, muitas outras empresas vão entrar nesse mercado. Esse cenário ainda vai mudar bastante”, afirma Meireles, da IDC.

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