O tarifaço de 50% imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, às exportações brasileiras é uma oportunidade para o setor produtivo nacional avançar em outros mercados internacionais.

O principal exemplo é o avanço nas negociações para a assinatura do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia. Para Silvio Cascione, diretor de pesquisa e chefe da Eurasia Group no Brasil, há caminhos para avançar e que envolvem alianças tanto via poder público como pelo engajamento da iniciativa privada.

“Esse episódio virou um convite ao setor privado para buscar mais oportunidades no exterior. Há multinacionais brasileiras que avançaram em muitos mercados, mas ainda há muito o que fazer”, afirmou ele no painel "O Brasil no Comércio Mundial", no NeoConference 2025.

"Vimos que o tarifaço de Trump não pegou apenas o governo brasileiro de surpresa. Pegou o setor privado brasileiro desmobilizado. Foi necessário um tempo para esse engajamento e o início das conversas em Washington”, complementou.

Para o cientista político Rafael Cortez, sócio da Tendências Consultoria, há um certo privilégio do Brasil pelo fato de a economia não ser muito aberta e, por isso, menos dependente do fluxo comercial, como acontece com o México, por exemplo.

O especialista entende que o País, de certa forma, se beneficia do fato de a economia não ser tão dependente do comércio exterior. “Olhando pelo cenário político, o País apostou no multilateralismo, sem vinculação a polos de direita ou esquerda. Esse pouco comércio que a gente faz é muito bem distribuído. Por isso, não podemos estar tão alinhados a A ou B”, afirmou Cortez.

Na visão de Cascione, será difícil que a Casa Branca elimine de vez as tarifas implementadas, principalmente pelo que os recursos irão impactar na receita americana. De qualquer forma, haverá espaço para negociações.

“Os Estados Unidos estão elevando tarifas a patamares que não se via há 100 anos. Isso está gerando uma receita para o país que será difícil para qualquer governo nos Estados Unidos abrir mão no cenário pós-Trump. Isso é para valer”, disse ele.

O sócio da Tendências enxerga que o momento da guerra comercial com os Estados Unidos mostra que há um ‘ciclo político não virtuoso’, em termos de integração econômica global. Dessa forma, a vitória de forças políticas no mundo, como Trump, aceleram esse processo.

“Todo país hoje tem divisões importantes dentro da própria sociedade. A questão agora é se teremos uma corrida pelo protecionismo ou um rearranjo menos ambicioso na ordem mundial, com negociações e integração entre blocos”, disse ele.

Com isso, a tendência é que, na visão dos dois especialistas, o tema política internacional tenha uma presença muito relevante na eleição presidencial de 2026, bem acima do que já teve em outros pleitos para o comando do Palácio do Planalto na história.

“Não é isso que vai definir o resultado da eleição no Brasil, mas já há sintomas de como a política, na era digital, afeta os temas que estão sendo discutidos. E, com esta questão de fácil acesso ao eleitorado, a tendência é que isso esteja presente na disputa”, analisou Cortez.

Na visão do chefe da Eurasia Group no Brasil, o maior efeito deste tema na eleição presidencial estará presente em grupos da sociedade com visão política mais definida, ainda que não seja o item mais importante na discussão.

“Isso vai ajudar a montar propostas, definir temas para debates, agendas e, se tiver uma ação dos Estados Unidos mais perto da eleição, aí sim pode ter um impacto maior. Não chegar a ser algo que decide a eleição”, disse Cascione.