Brasília - O Senado quer impor a disciplina fiscal no Brasil por meio de um projeto que fixa um teto para a dívida bruta da União de 80% do Produto Interno Bruto (PIB) ou 6,5 vezes a receita corrente líquida do governo federal. O que à primeira vista parece ser um estímulo ao ajuste fiscal pode se transformar em um tiro no pé das políticas monetária e fiscal do País.
Após críticas de integrantes da equipe econômica, incluindo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o relator da proposta, o senador Oriovisto Guimarães (PSDB-PR) passou as últimas horas avaliando as sugestões do governo federal.
O NeoFeed apurou que um "pedido de vista providencial" deve atrasar a tramitação do projeto. A tendência é que esse pedido seja feito na sessão de terça-feira, 23 de setembro, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Assim, com mais tempo, será possível realinhar o texto, que, segundo o Banco Central, pode levar o País à moratória.
O argumento da equipe econômica é que, caso o texto seja aprovado, o Banco Central pode ficar engessado e passar a estar limitado à venda de títulos para administrar a liquidez bancária, comprometendo o próprio controle da Selic.
Isso significa a proibição de emissão e rolagem da dívida, assim como o não pagamento dos juros dos papéis já emitidos - só o Tesouro Direto somava mais de R$ 180 bilhões em estoque de títulos no fim do primeiro semestre deste ano. E o risco do calote aos investidores fica mais próximo.
Na quarta-feira da semana passada, Haddad disse que a proposta, de autoria do senador Renan Calheiros (MDB-AL), não “trará os melhores resultados”. Para o ministro, a Fazenda já tem regras adequadas para assegurar a estabilidade das contas públicas.
“Já conversei de maneira muito respeitosa com o senador Renan”, disse Haddad, que sugeriu a realização de um seminário com ministros de várias escolas e tendências. “O senador (entretanto) tem mandato e toda a liberdade”, completou Haddad.
Não é a primeira vez que Calheiros tenta limitar a dívida pública. Em 2015, quando estava na presidência do Senado, ele buscou a aprovação de uma regra que estabelecia um teto, mas não conseguiu aprovação.
Calibragem
Agora, o problema para o governo é que o texto tem caráter terminativo no Senado e, caso seja aprovado, não precisa passar pela Câmara e também não depende do aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Por isso a mobilização da equipe econômica contra o projeto.
A proposta inicial de Oriovisto é até bem intencionada, pois tenta estabelecer regras fiscais mais rígidas, tentando estabelecer maior credibilidade ao País. Mas, com os alertas da equipe econômica, o senador deve calibrar os termos do relatório.
A parte mais delicada é justamente a proibição para o governo de estender a dívida e de não poder pagar juros de papéis já emitidos. O projeto prevê um corte mínimo de endividamento de 25% no primeiro quadrimestre depois da aprovação do texto.
O corte é visto como impossível de ser seguido por causa de despesas obrigatórias na educação, previdência e saúde - tudo previsto na Constituição, tendo que ser alterado com uma PEC, que seria anterior ao próprio projeto de resolução.