O vinho Don Melchor está deixando de ser o tinto ícone da Concha y Toro (CYT), o maior grupo vitivinícola do Chile, para se tornar uma vinícola independente. A decisão de separar o Don Melchor do negócio CYT é a principal novidade das comemorações do lançamento da 30ª safra deste vinho, rótulo pioneiro em mostrar o potencial dos tintos do país.
Com primeira edição em 1987, o Don Melchor 2017 chega agora ao mercado com preço de R$ 704 a garrafa, importado pela VCT. Com a mudança, o Don Melchor se torna o único rótulo da Viña Don Melchor, uma unidade de negócios autônoma. E a vinícola Concha Y Toro deixa de ter um vinho ícone no portfólio – agora, os seus tintos mais badalados são o Carmín de Peumo e a linha Gravas.
A família Guilisasti, principal acionista da CYT e agora da Viña Don Melchor, segue o modelo da Viña Almaviva, projeto que nasceu em 1997 com a joint venture entre a francesa Baron Philippe de Rothschild, dona do château Mouton Rothschild, em Bordeaux.
Com capital franco-chileno, ela é uma empresa também focada em um só vinho, o Almaviva (há um segundo rótulo, o Epu, vendido preferencialmente na vinícola e em alguns poucos mercados).
Enrique Tirado, que desde 1997 é o enólogo principal do Don Melchor, torna-se o gerente-geral da Viña Don Melchor. “Agora somos uma vinícola e não um vinho ícone dentro de uma empresa. Vamos seguir o modelo de um château francês e a nova empresa tem todo o foco no Don Melchor”, afirma Tirado.
O agora enólogo-executivo não descarta seguir o modelo dos châteaux franceses e lançar, no futuro, um segundo vinho ao portfólio. “Mas o foco é o Don Melchor”, faz questão de frisar.
A cada safra, Tirado e sua equipe utilizam apenas entre 60% e 65% dos vinhos elaborados para compor o blend do Don Melchor. Os demais vinhos são encaminhados para as linhas Marques de Casa Concha e Gravas. Com a nova vinícola, eles podem ter um destino diferente e ajudar a construir uma imagem de maior exclusividade da Viña Don Melchor.
Nos châteaux franceses e também no vizinho Almaviva (as duas marcas ícones chilenas estão em vinhedos lado a lado, na região de Puente Alto), essas uvas podem seguir para o segundo vinho, como acontece com aquelas de vinhedos mais jovens, que dão origem a uvas com menos complexidade, ou aqueles vinhos que, mesmo de qualidade, não se enquadraram no estilo do vinho principal.
A promoção de Tirado a principal executivo da nova viña mostra a aposta da CYT no enólogo que trouxe inovação ao grupo. No início dos anos 2000, ele foi um dos primeiros a investir no conhecimento de seu terroir, quando este era um tema desconhecido do universo do vinho chileno.
O Don Melchor é formado por 127 hectares de vinhedos em Puente Alto, aos pés da Cordilheira dos Andes, no vale de Maipo. Nele, são cultivadas a cabernet sauvignon (em 90% do vinhedo), a cabernet franc (7,1%), a merlot (1,9%) e a petit verdot (1%).
Tirado fez parcerias com universidades chilenas, foi estudar em Bordeaux, fez muita análise de solo até chegar a dividir o vinhedo em 151 parcelas diferentes, a partir das características do microsolo e do microclima.
Atualmente, cada parcela é cuidada de forma específica e detalhada, de maneira a destacar as principais características da uva que nasce em cada vinha. Assim, em cada safra são elaborados 151 vinhos diferentes, que depois são mesclados para dar origem ao Don Melchor.
“O Don Melchor é um blend de cabernet sauvignon”, define Tirado. O tinto foi elaborado apenas com a cabernet sauvignon de 1987 até 1995, quando ganhou uma pequena porcentagem de merlot, para tornar mais redondo o cabernet sauvignon daquele ano.
Até hoje, a cabernet sauvignon é sua uva principal, com pequenas porcentagens das outras variedades, que são acrescentadas conforme as características das safras, para lhe dar complexidade. A safra de 2017, por exemplo, tem 98% de cabernet sauvignon e 2% de cabernet franc.
Atualmente, Tirado atua nos detalhes para aumentar a qualidade do seu vinho. Diz que o desafio é praticar uma agricultura saudável, mesclando conceitos da agricultura tradicional, da orgânica e da biodinâmica. Um exemplo são os corredores ecológicos, que são cultivados entre as vinhas para trazer diversidade de fauna e flora.
“Também só tratamos os vinhedos, quando necessário, com produtos que deixam zero resíduos e que são aceitos pelas normas da Comunidade Europeia”, diz Tirado. É uma legislação mais rígida do que as praticadas na América do Sul.
A viña já conta com toda a tecnologia possível, das mais modernas irrigações e esteiras com seletor óptico para selecionar as uvas, aos modernos tanques de inox. Agora, é acompanhar o Don Melchor em seu voo solo.