O mercado de luxo passa por um momento de forte desaceleração impulsionado por uma economia mais fraca nos principais países que consomem esses artigos. Entre os gigantes do segmento, a Hermès foi a única que conseguiu entregar bons resultados no último trimestre, com crescimento de 9% nas vendas. Suas concorrentes, como Gucci e Prada, viram esse indicador recuar 25% e 3,6%, respectivamente.
Nesse cenário, há apenas um ganhador: os produtos usados. A principal bolsa da Hermès, a Birkin, registrou valorização de 14% ao ano nas últimas três décadas, se tornando um verdadeiro ativo de investimento. Nenhum item, porém, supera o aumento de valor dos relógios Rolex.
Em 15 anos, os modelos apresentaram valorização média de 550%, o que significa que, quem comprou um exemplar do modelo Submariner por US$ 2 mil em 2010, hoje tem em mãos (ou melhor, no pulso) um ativo de cerca de US$ 13 mil. Os dados constam do último levantamento da Bob’s Watches, plataforma de compra, venda e troca especializada no segmento.
“É praticamente uma validação de tudo o que tem sido comentado no setor nos últimos dois a cinco anos”, disse Paul Altieri, fundador e CEO da Bob’s Watches, ao portal Robb Report. “A Rolex superou o mercado imobiliário de longe".
A valorização só fica atrás do Índice Nasdaq que avançou quase 753% entre 2010 e 2025. Mas está à frente do S&P 500, que subiu 423,75%; do Dow Jones Index, 307,38%, e do Ibovespa, 77,81%, conforme cálculos de Einar Rivero, CEO da Elos Ayta consultoria.
Segundo o estudo recém-divulgado, o Datejust foi o mais negociado entre os modelos da Rolex, mostrando crescimento constante na procura e menor volatilidade em seu valor. No total, seu preço avançou 693% no período avaliado.
O GMT-Master II, lançado em 1955, também ficou entre as maiores valorizações com alta de 506% desde 2010, o que mostra que a demanda por artigos vintage continua se destacando em um mercado tão concorrido.
Ao mesmo tempo, o Daytona, ícone da marca, registrou os maiores valores de venda na plataforma, atingindo o preço de US$ 53,9 mil. Sua valorização atingiu 358% nos últimos 15 anos.
Bernardo Britto, dono do perfil Bernardo Entusiasta, especializado em alta relojoaria, explica que a própria empresa incentivou esse movimento. “A política de controle de oferta da marca, aliada à alta demanda global, criou um cenário de escassez que tornou diversos modelos extremamente desejados”, afirma, em entrevista ao NeoFeed.
“Com isso, relógios como o Daytona, o Submariner e o GMT-Master II se tornaram quase impossíveis de encontrar nas boutiques autorizadas, gerando listas de espera de anos e favorecendo o mercado secundário”, explica Britto.
Alta na pandemia
É possível ver como essa valorização evoluiu no decorrer dos anos. De acordo com a pesquisa, entre 2010 e 2015, os valores subiram cerca de 250%. Porém, nos cinco anos seguintes, houve um movimento de estabilização do mercado, definido pela que a Bob’s Watches como um período de amadurecimento, com um avanço em torno dos 25%.
A pandemia, porém, deu início à retomada do mercado. Entre 2020 e 2022, os preços subiram 93% e, de lá para cá, o mercado recuou cerca de 30%, correção esperada pelos especialistas e pelo mercado.
Nesse vaivém, o modelo Submariner se revelou o mais resiliente da marca. Seus preços recuaram apenas 8% em relação ao pico de 2022, de US$ 18.889.
“Antes, um usado custava cerca de 30% a menos do que um novo”, diz Altieri. “Se um Rolex novo custava US$ 3,5 mil, o nosso era US$ 2,5 mil. Hoje, os valores de revenda da Rolex são maiores do que seriam se você conseguisse encontrar os relógios novos. Mas isso não aconteceu da noite para o dia.”
Para Britto, é pouco provável que haja outra valorização tão forte nos próximos anos, pelo menos no curto prazo: “O ritmo deve ser mais moderado e gradual, com a valorização de peças específicas (especialmente as mais raras ou descontinuadas) continuando a acontecer, mas em patamares mais sustentáveis. Ainda assim, Rolex deve permanecer como uma das marcas mais resilientes e valorizadas do setor, assim como Audemars Piguet e Patek Philippe”.
Radical, sem perder a elegância
Em 1905, em Londres, o jovem Hans Wilsdorf, de 24 anos, decidiu transformar sua paixão por relógios em negócio. Ele escolheu focar nos modelos de pulso, ainda pouco explorados pelo mercado na época — tidos como menos precisos, em comparação aos de bolso.
Wilsdorf se impôs a missão de criar um relógio de pulso eficiente, confortável e elegante. Ele encontrou um relojoaria suíça que produzia mecanismos pequenos e confiáveis. Assim nascia a Rolex, que, alguns anos mais tarde, seria eleita a marca mais precisa do mundo.
Em 1926, a empresa inovou mais uma vez ao criar o primeiro relógio de pulso à prova d'água. No ano seguinte, a nadadora britânica Mercedes Gleitze cruzou o Canal da Mancha usando um Oyster. A travessia durou 15 horas e 15 minutos. Quando a atleta chegou na Inglaterra, o relógio estava em perfeito estado de funcionamento.
A história da Rolex é marcada por pioneirismos. Em 1931, patenteou o primeiro mecanismo de corda automático do mundo, equipado com o rotor Perpetual, que continua a ser utilizado em diversos modelos até hoje.
Em pouco tempo, a marca se tornou a queridinha dos atletas e estampou a capa dos principais jornais, atestando sua solidez nas condições mais adversas: os mergulhos mais profundos em águas abertas, as escaladas das montanhas mais altas e os maiores voos já alçados.
De 1953 a 1960, a marca desenvolveu seis modelos novos, cada um com uma novidade — da marcação das horas em todos os países até detalhes em ouro, algo pouco utilizado na época.
Apesar da proximidade com os esportes mais radicais, a Rolex nunca perdeu sua elegância. E talvez seja exatamente isso que a faça tão especial.
“A Rolex soube criar uma imagem de desejo universal, associada a sucesso, prestígio e tradição. É uma marca que vai muito além do universo dos colecionadores e alcança desde o entusiasta iniciante até grandes investidores”, afirma Britto. “Além disso, o valor simbólico de ter um Rolex também pesa. Ele não é apenas um relógio: para muitos, representa uma conquista de vida.”