No começo de julho, a operadora de saúde Prevent Senior inaugura, no bairro do Morumbi, em São Paulo, o seu nono hospital próprio na capital paulista. Serão 179 leitos, oito salas cirúrgicas distribuídas por um prédio de 24 andares e 41,4 mil metros quadrados de área construída.
A hotelaria será de hospital classe A. E os apartamentos, com 45 metros quadrados cada, serão todos com acompanhantes. Haverá também um heliponto. No total, o quadro de funcionários da nova unidade contará com 869 profissionais, dos quais 282 de enfermagem (enfermeiros, auxiliares e técnicos).
Esse não é o único hospital a ser inaugurado pela Prevent Senior neste ano. Estão previstos mais três: uma na região da avenida 23 de maio, outro no bairro da Saúde e, por fim, um hospital no bairro do Butantã. Todos eles localizados em São Paulo.
No total, a operadora de saúde voltada ao público da terceira idade fundada por Fernando Parrillo e seu irmão Eduardo, há mais de 20 anos, no bairro da Mooca, acrescentará aproximadamente 500 novos leitos a sua rede própria.
Com os novos leitos, a rede chegará a 1,2 mil, um salto de 70% no meio da maior pandemia deste século. “O que aconteceu não parou nenhum investimento da empresa”, disse Fernando Parrillo, presidente da Prevent Senior, em entrevista ao NeoFeed.
O investimento previsto neste ano é de R$ 350 milhões. Ele inclui os novos hospitais, bem como 15 novas unidades de atendimento menores, que fazem exames, consultas e procedimentos mais simples.
A Prevent Senior pretende também abrir sua primeira unidade de atendimento no Rio de Janeiro, onde hoje opera por meio de parcerias. Além disso, planeja iniciar as operações em Porto Alegre, Curitiba e Brasília. “Com a pandemia ficou mais difícil, mas já está tudo organizado” diz Parrillo.
O número de vidas atendidas pela Prevent Senior também não para de crescer. Hoje, a companhia conta com 485 mil clientes, com uma carteira com idade média de 68 anos. Desde janeiro deste ano, ela vem adicionando, em média, 5 mil vidas por mês. “A pandemia não mudou em nada os nossos números. Continuamos crescendo. Vai ser um ano bom”, afirma Parrillo.
Dito assim, com tranquilidade, parece que a Prevent Senior está voando em céu de brigadeiro em 2020. Mas a operadora de saúde passou por um dos períodos mais turbulentos de sua história. Alguns até acharam que ela quebraria no meio da pandemia, por conta do crescimento de casos de Covid-19 dos clientes da sua carteira e das polêmicas nas quais se envolveu. E não foram poucas.
Quando as primeiras mortes por conta do novo coronavírus começaram a ocorrer no Brasil, os hospitais da companhia ganharam o noticiário por conta do número de mortes dentro de suas UTIs.
No fim de março, das 136 mortes do Estado de São Paulo, 79 haviam acontecido no Sancta Maggiore, da Prevent Senior. O então ministro da Saúde, Henrique Mandetta, chegou a falar em uma intervenção e criticou o fato de a companhia isolar os pacientes em um único hospital.
A prefeitura de São Paulo chegou a pedir interdição de duas unidades da Prevent Senior e o Ministério Público abriu duas investigações contra a operadora de saúde, para saber se a empresa tomou medidas para conter a propagação do coronavírus em suas unidades.
Mandetta criticou também o modelo de negócio da Prevent Senior, de criar uma carteira de clientes da terceira idade. “Ele é mais um político do que um analista financeiro. Não sei se sabe ler balanços”, diz Parrillo. “O nosso modelo para em pé há muito anos. E em relação a pandemia para mais em pé ainda porque nada aconteceu.”
Com base nos balanços publicados pela Prevent Senior, a empresa tem apresentado um crescimento acelerado desde 2014. Naquele ano, o faturamento foi de R$ 1 bilhão. Em 2019, atingiu R$ 3,5 bilhões. O lucro aumentou ainda mais. No mesmo período, passou de R$ 56 milhões para R$ 432,1 milhões.
A Prevent Senior também entrou no olho do furacão no debate da hidroxicloroquina, medicamento que foi considerado a primeira esperança de tratamento para os pacientes de Covid-19. Em abril, a empresa teve uma pesquisa suspensa pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) porque fez testes com humanos antes que recebesse o aval da comissão para realizar a pesquisa, o que é proibido no País.
O estudo da Prevent Senior mostrava que o uso da hidroxicloroquina em conjunto com azitromicina reduzia em até duas vezes o número de internações pela doença. A companhia alegou que os dados eram preliminares e se tratavam de evidências clínicas para o estudo que seria realizado. E que a pesquisa só não foi realizada porque foi proibida por conta dessa confusão.
O fato é que a Prevent Senior tem um protocolo, desde o início da pandemia, para usar a hidroxicloroquina associada a outros medicamentos a partir do terceiro dia dos sintomas.
De acordo com a empresa, 12 mil pacientes, de um total de 210 mil, foram tratados com esse protocolo desde março e o resultado foi eficiente em 100% dos casos. “Esse protocolo salvou os pacientes e salvou a empresa”, diz Pedro Benedito Batista Jr., médico e diretor-executivo da Prevent Senior.
Questionado por que salvou a empresa, ele alega que se todos os pacientes fossem internados e precisassem de ventiladores mecânicos, não haveria condições de atendimento. “Em março, tínhamos 80% dos ventiladores mecânicos ocupados”, afirma Batista Jr. “Hoje, está em 50%. É a prova de que o protocolo funciona.”
A Prevent Senior mantém ainda três hospitais dedicados ao atendimento de pacientes de Covid-19. Mas não informa mais o número de mortos ou a taxa de ocupação. Diz apenas que a ocupação tem se mantido estável nos últimos 40 dias.
Até hoje, nenhuma pesquisa científica mostrou o benefício da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19. Batista Jr. diz que concorda com todos os estudos, mas alega que nenhum deles foi feito com base na administração do medicamento a partir do terceiro dia de sintomas.
Mas não foi apenas a aposta na hidroxicloroquina que ajudou a Prevent Senior a enfrentar a pandemia e não quebrar. A operadora, assim como outas empresas do setor, adotou a telemedicina para evitar aglomerações nos hospitais e dar um atendimento rápido aos seus clientes.
“Eles retiraram 97% dos pacientes do pronto-atendimento com a tecnologia”, diz Jeff Plentz, sócio da Techtools Ventures, um fundo de venture capital que investe em healthtechs, que conhece o caso.
Uma ideia maluca
Quando surgiu, em 1997, muitos consideraram a ideia dos irmãos Parrillo maluca. Fernando era formado em administração de empresas e Eduardo, em medicina. Um plano para a terceira idade fugia à lógica do mercado. Tanto que os clientes dessa faixa de idade eram esnobados pela concorrência.
Mas, desde então, a Prevent Senior optou por um modelo que muitas operadoras de saúde tentam chegar até hoje. É a chamada verticalização. “Desde o dia zero, eles funcionam desse jeito”, diz Plentz, a Techtools Ventures.
Há diversas formas de entender a verticalização do setor de saúde. A interpretação mais comum diz que o importante é manter toda a rede, dos hospitais aos postos de atendimentos, debaixo do mesmo dono. Assim, os custos ficam também sob controle.
A Prevent Senior tem 485 mil vidas e a idade média da carteira é de 68 anos
Mas a verticalização da Prevent Sênior vai além. “Temos uma verticalização de processos”, diz Parrillo. “Na pandemia, conhecíamos todos os pacientes.”
Os parceiros de fora da rede própria da Prevent Senior precisam também seguir seus protocolos, bem como usar seu prontuário eletrônico. Dessa forma, um médico, quando atende um cliente, tem acesso a ficha dele, com todo o histórico de saúde e exames.
“Diferentemente de boa parte das operadoras de saúde, eles têm uma relação quase pessoal com seu beneficiário”, afirma Ana Maria Malik, coordenadora do FGV Saúde, centro de estudos que lida com gestão e planejamento em saúde.
Esse modelo explica em parte o avanço da Prevent Senior. Como consegue manter os custos em dia, a operadora de saúde pode cobrar menos pelos seus planos, que custam, em média, R$ 800 – lembre-se que a empresa atende pessoas com idade avançada.
Mas esse oceano azul tende a acabar. E a culpa disso é da própria Prevent Senior. “Agora, está todo mundo percebendo que atender a terceira idade não é uma catástrofe”, afirma Malik, do FGV Saúde.
As principais empresas de setor de saúde estão também começando a verticalizar suas operações e, ao mesmo tempo, passaram a olhar para clientes da terceira idade.
A Amil, controlada pela americana United Health, já é dona de hospitais há tempos. A SulAmérica lançou, no ano passado, um plano mais barato, cujo objetivo é competir com as empresas verticalizadas. A Hapvida comprou o grupo São Francisco por R$ 5 bilhões, em 2019, marcando sua entrada no interior de São Paulo, também fortalecendo sua verticalização.
Esse é um movimento que acompanha o envelhecimento da população brasileira. Para se ter uma ideia, o Brasil tinha 13,8 milhões de pessoas com mais de 60 anos nos anos 2000. Agora, esse número saltou para 29,8 milhões. Em 2050, a previsão é de 67,3 milhões, quase 30% da população, mais do que o dobro de hoje, segundo o estudo World Population Prospects, das Organizações das Nações Unidas.
Mas se vai enfrentar a concorrência em seu nicho, a Prevent Senior está também avançando sobre seus rivais. Seus planos atendem desde recém-nascidos a até mais de 59 anos. E há apenas duas modalidades: enfermaria e apartamento.
Os planos são também voltados para as pessoas físicas, outro contrassenso no setor, que prefere planos corporativos ou coletivos por adesão, em que não há restrições de aumentos de preços pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Como nenhuma outra operadora de saúde, a Prevent Senior provou que sabe lucrar com a terceira idade. E nem as polêmicas, até agora, parecem atrapalhar isso. Será que os concorrentes conseguirão?