Se durante as últimas décadas as principais varejistas do mundo precisaram realizar um movimento intenso para levar suas vendas para a internet, a Amazon tomou o caminho contrário. Depois de surgir como um titã online, a companhia fundada por Jeff Bezos passou a investir num plano de expansão das suas operações para o mundo físico.
Essa estratégia envolveria desde a abertura de livrarias em shoppings até supermercados totalmente digitalizados. Para se ter ideia do tamanho da ambição da varejista nesse sentido, a empresa desembolsou US$ 13,7 bilhões na compra da rede de supermercados Whole Foods, em 2017. A aquisição serviria para pavimentar o caminho da Amazon nesse segmento.
O plano da Amazon fazia sentido. Apenas 15% da receita do varejo total nos Estados Unidos vêm do comércio eletrônico. Nos supermercados, esse percentual é ainda menor, conforme aponta um estudo da consultoria Insider Intelligence. De acordo com o levantamento, as vendas de supermercados pela internet representaram apenas 11,2% do faturamento total do segmento no país. Na prática, talvez nem tanto.
Quase cinco anos se passaram e a Amazon parece mais distante do que nunca desse objetivo. Meses atrás, a companhia fechou 68 livrarias e diversas unidades de suas lojas físicas. Mais recentemente, encerrou também a operação de um dos dois supermercados autônomos que operava em Seattle e indicou que há um replanejamento em curso.
Em teleconferência de resultados do quarto trimestre realizada na quinta-feira, 2 de fevereiro, Andy Jassy, o CEO da companhia, confirmou que a Amazon estava reavaliando sua estratégia para lojas físicas. O executivo também afirmou que houve a interrupção no lançamento de novas lojas do supermercado Amazon Fresh até que a companhia encontre um formato adequado para operar nessa frente.
“Decidimos no ano passado que não vamos expandir as lojas físicas de Fresh até termos aquela equação com diferenciação e valor econômico que gostamos. Mas estamos otimistas de que vamos encontrar isso em 2023”, disse Jassy. Já Brian Olsavsky, diretor financeiro da Amazon, afirmou durante o mesmo evento que a companhia também estuda fechar algumas das lojas Fresh.
Para entender melhor os motivos pelos quais a Amazon está mudando sua estratégia é preciso analisar os números. Nos resultados do quarto trimestre do ano passado, a receita obtida pela companhia com suas lojas físicas foi apenas 10% maior do que a registrada no mesmo período de 2017. Os resultados ficaram estagnados mesmo após a companhia inaugurar dezenas de lojas nos últimos anos.
Em números: as vendas em lojas físicas da Amazon somaram US$ 4,9 bilhões no último trimestre, contra US$ 64,5 bilhões das vendas online. A receita com serviços de assinatura somou US$ 9,1 bilhões, enquanto a frente de publicidade da companhia foi responsável por trazer US$ 11,5 bilhões ao negócio. Já a Amazon Web Services (AWS), seu braço de computação em nuvem, respondeu por US$ 21,3 bilhões do faturamento.
“Suas lojas têm sido uma parte decepcionante de sua estratégia de varejo, com certeza”, disse a analista de varejo da Forrester, Sucharita Kodali, sobre a Amazon, em entrevista ao The Information. “Se eles querem permanecer neste espaço, precisam fazer uma grande reforma em suas lojas.”
O fechamento de lojas físicas faz parte de um esforço da Amazon também para reduzir os custos de sua operação. Em outra direção, a companhia já iniciou uma onda de demissão em massa que vai resultar no desligamento de 18 mil funcionários da companhia de diferentes áreas, inclusive de equipes que trabalham em projetos para a expansão da marca no varejo físico.
Expectativa e realidade
Quando abriu sua primeira loja física, ainda em 2015, com a inauguração de uma livraria de shopping em Seattle, o plano da Amazon era oferecer no mundo físico uma experiência tão diferenciada como a ofertada digitalmente. Isso até chegou a ser feito nos anos seguintes, com a adoção de tecnologias, mas não foi o suficiente para que a companhia conquistasse um espaço relevante no offline.
Na Amazon Go, sua loja com checkout automatizado e que teve sua primeira unidade inaugurada ainda em 2016, a varejista planejava abrir até 3 mil lojas em 2021. Isso ficou longe de ser concretizado. Atualmente, a Amazon conta com apenas 28 unidades dessas lojas, todas nos Estados Unidos.
A tecnologia Just Walk Out, que permite fazer compras sem enfrentar filas de caixas, também foi adicionada aos supermercados Amazon Fresh. Nessa frente, a Amazon conta com 44 unidades nos Estados Unidos e outras 20 no Reino Unido. A ideia era abrir mais 41 estabelecimentos em solo americano, mas as inaugurações estão suspensas desde setembro e não há planos concretos para retomada.
Diversos fatores atrapalham a expansão da Amazon no mundo físico. A pandemia, por exemplo, se tornou um grande obstáculo para a companhia. Se por um lado o e-commerce cresceu abruptamente nos últimos anos, os efeitos do pós-pandemia trouxeram uma mudança no comportamento dos consumidores, agora mais aptos a fazerem compras pela internet.
Os custos para implementar tecnologias nas lojas e assim oferecer uma experiência diferenciada para os consumidores também atrapalham. Por isso, apenas cinco das mais de 500 lojas Whole Foods nos Estados Unidos contam com o monitoramento de compras feito pelas câmeras ou scanners que permitem o pagamento das compras diretamente pela conta da Amazon.
Ainda é cedo para fazer uma previsão sobre qual será o futuro da Amazon no varejo físico, mas as perspectivas e os movimentos mais recentes da companhia já não são tão otimistas. Isso não quer dizer, porém, que a companhia abandonou por completo essa ambição.
Uma aposta foi no setor de moda. No ano passado, a varejista inaugurou duas lojas Amazon Style. A primeira unidade foi aberta em Los Angeles e ocupava um espaço de 2,8 mil metros quadrados – metragem semelhante a de uma loja de departamento convencional. A ideia era oferecer peças com preços que poderiam custar de US$ 10 para marcas simples ou US$ 400 para grifes conceituadas.
Posteriormente, a Amazon ainda abriu mais uma loja de itens de vestuário em Ohio e conta com uma versão experimental e com vendas permitidas apenas para funcionários de uma terceira unidade em Seattle. Os planos para que isso evolua, no entanto, ainda não são claros.