O ecossistema de inovação agrifoodtech acaba de fazer mais um unicórnio. Ou, melhor seu primeiro narval, a baleia conhecida como o unicórnio-do-mar. A empresa aquícola indonésia eFishery recebeu recentemente US$ 108 milhões, em uma rodada de investimento de série D. Com isso, seu valuation chega a US$ 1,3 bilhão.
O financiamento foi liderado pelo 42xfund, dos Emirados Árabes Unidos, com participação do Northstar Group, de Cingapura, e do Softbank Vision Fund 2, o braço de investimentos do grupo japonês.
Fundada em 2013 por Gibran Huzaifah Amsi El Farizy, em Bandung, na ilha de Java, a eFishery iniciou suas operações com uma tecnologia para a alimentação de peixes e camarões de cativeiro. Um dosador digital libera a ração nos momentos e nas quantidades programadas.
Na última década, a empresa expandiu e passou a oferecer serviços de ponta a ponta da cadeia de produção. Além do alimentador inteligente, a eFishery lançou uma fintech, para facilitar o acesso dos produtores ao crédito.
A empresa desenvolveu ainda uma plataforma de comércio eletrônico, por meio da qual os criadores podem comprar equipamentos e insumos, e outra que os conecta diretamente aos distribuidores, o que lhes garante preços mais vantajosos do que os mercados tradicionais. A empresa criou ainda um sistema de prevenção de doenças para as criações, operado remotamente.
As inovações reduzem o tempo médio de colheita de cinco a seis meses para 74 dias, lê-se em relatórios da startup. O aumento de produtividade acontece por meio de práticas ambiental e socialmente responsáveis. A tecnologia da eFishery é usada hoje por cerca de 70 mil aquicultores, de 280 cidades da Indonésia.
A esperança nas fazendas de peixes e frutos do mar
Frente à escassez de terra agrícola, insegurança alimentar e emergência climática, a aquicultura tem sido apontada como uma das estratégias mais importantes na busca por sistemas alimentares mais sustentáveis, inclusivos e resilientes.
Para tanto, a produção global de peixes, frutos do mar e algas deve aumentar entre 35% e 40% até 2030, sugerem os analistas da FAO, a agência da ONU para agricultura e alimentação.
O entusiasmo global em torno da aquicultura é compreensível. Além de aliviar a tensão sobre o campo, oceanos, mares e rios, a produção de proteínas aquáticas tende a ser mais “ecofriendly” do que as terrestres.
Por características que vão desde o tipo e quantidade de ração às necessidades fisiológicas dos animais, a pagada ecológica das fazendas de peixes e frutos do mar equivale a um sétimo da suínos, bovinos e aves.
Não à toa, a aquicultura vem atraindo a atenção dos capitalistas de risco. Desde meados da década de 2010, os investimentos vêm se tornando mais consistentes, conforme análise da plataforma Crunchbase. Em 2022, 43 empresas levantaram US$ 292 milhões. Desse total, US$ 90 milhões couberam à eFishery.
Nas aulas da faculdade de biologia
Recém-chegada ao clube, a empresa de Bandung reina absoluta como a única da aquicultura no mapa global dos unicórnios do ecossistema agrifoodtech. Elaborado há quatro anos pela consultoria francesa Digital Food Lab, em 2022, as startups bilionárias somavam 55. Delas, 58% são de delivery de comida.
A ideia da eFishery surgiu quando Gibran Huzaifah Amsi El Farizy, hoje com 33 anos, cursava biologia no Instituto de Tecnologia de Bandung, durante o curso de aquicultura. O então estudante havia se matriculara nas aulas porque era garantido que ele tiraria boas notas se apenas marcasse presença na classe. E Farizy precisava melhorar suas médias.
Quando o professor mencionou que, em um futuro próximo, os hotéis cinco estrelas só serviriam peixes a seus hospedes endinheirados, o rapaz decidiu alugar uma fazenda de bagres, para complementar a renda, como conta ao site da CNBC.
Redução dos gastos com ração
Ao perceber que teria de gastar entre 70% e 90% dos custos totais com ração, ele decidiu criar seu próprio sistema de alimentação dos peixes. Em 2012, um ano antes de lançar a eFishery, o protótipo do alimentador automático ficou pronto.
A alimentação manual pode resultar na superalimentação ou subalimentação das criações. Ao detectar os níveis de fome de peixes e camarões por meio do movimentos dos animais, a engenhoca inventada por Farizy libera a quantidade ideal de comida.
Mais precisa, a nova tecnologia reduz os gastos em cerca de 30%. “Muitos erram porque não se concentram na economia da unidade desde o primeiro dia”, diz. Fica a dica do jovem que fez de uma máquina para alimentar peixes uma empresa de US$ 1,3 bilhão.