Depois de o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmar que a questão dos juros altos do rotativo do cartão de crédito precisa ser resolvida "por fases", os CEOs de quatro dos principais bancos do País defenderam que o tema não pode ser visto de forma isolada.

Assim como o presidente da autoridade monetária, Mario Leão, do Santander; Milton Maluhy Filho, do Itaú Unibanco; Roberto Sallouti, do BTG Pactual; e Tarciana Medeiros, do Banco do Brasil, defenderam que é preciso levar em conta todo o mercado do cartão de crédito.

O CEO do Santander Brasil destacou que 40% do consumo no País é feito por meio do cartão de crédito, uma fatia “desproporcional”. E uma boa parte das aquisições são realizadas em operações com parcelamento sem juros, uma modalidade que é financiada e carregada na carteira dos bancos.

Leão disse que uma solução depende de um amplo debate entre as diversas partes da cadeia e também com o governo, considerando as consequências que medidas pontuais para tentar solucionar os altos níveis de juros do rotativo podem ter na concessão de crédito e, por consequência, na economia.

“O tema do rotativo e do cartão não podem ser olhados de forma isolada”, disse ele em painel na 24ª Conferência Anual Santander, em São Paulo, na terça-feira, 22 de agosto. “Temos de enfrentar isso e acreditamos que existe a necessidade de transformar hoje um equilíbrio instável no financiamento do cartão, com os riscos associados via financiamento por cartão de crédito melhor construídos.”

Destacando que não existem planos dos bancos de acabar com o parcelamento sem juros, o CEO do Itaú Unibanco referendou Leão ao dizer que é necessário um amplo debate sobre o tema dos juros do rotativo e do parcelamento. “É preciso entender o papel de cada ator para entender por que os juros são tão altos”, disse Maluhy Filho.

Ele também defendeu que o tema ter de ser analisado com profundidade e que qualquer mudança do modelo atual precisa passar por um período de transição. A decisão final ficaria a cargo do Conselho Monetário Nacional (CMN).

Mais cedo, o presidente do BC disse que é preciso encontrar uma solução para o tema, levando em conta que o parcelado sem juros é importante para a economia e não pode sofrer ruptura. “Não fazer nada pode ser pior do que achar uma solução organizada”, afirmou.

Inadimplência em queda

No mesmo painel, os presidentes dos bancos também discutiram o índice de inadimplência no sistema. Depois de ficar controlada entre 2020 e 2021, ela acabou avançando durante a reabertura da economia e a necessidade de o BC começar a elevar os juros diante da inflação vista no pós-pandemia.

Maluhy vê a situação se normalizando de maneira geral, ainda que algumas instituições ainda tenham que lidar com os resquícios do passado. “Os balanços dos bancos em geral, em maior ou menor, grau estão bem defendidos”, disse.

A presidente do Banco do Brasil, Tarciana Medeiros, concordou com Maluhy, afirmando que a inadimplência passa por uma normalização no País, avaliando que não prevê “sobressaltos” nos índices da instituição, sobretudo nas linhas de crédito para pessoas física, uma das mais impactadas pela alta dos juros.

Ela destacou que o início do ciclo de queda da Selic deve ajudar nesta frente. “Com o controle da inflação e o corte dos juros, temos uma noção de que a normalização dará mais força à queda da inadimplência”, afirmou.

O ponto da queda dos juros foi comemorado pelos executivos dos maiores bancos. Segundo Leão, o movimento de corte de 0,50 ponto percentual em agosto foi acertado e vai ajudar a reduzir os custos de financiamento, ainda que não altere a postura do Santander em relação à concessão de crédito. Ele voltou a repetir que a instituição deve continuar focando em sua base de clientes, sem interesse em ir a “mar aberto”.

Para Roberto Sallouti, CEO do BTG Pactual, é uma sinalização de que os riscos internos para a economia reduziram, em especial, o rumo da política fiscal. “Chegamos ao final do primeiro trimestre e o governo conseguiu afastar os riscos de cauda, de virarmos a Argentina”, afirmou.

Ainda que tenha se mostrado reticente com os planos fiscais do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmando que ela depende de um incremento substancial da arrecadação e não coloca a dívida em trajetória de queda, Sallouti diz que o principal foco está no exterior.

“A grande ameaça para retomada do mercado de capitais é a externa, vindo do descontrole fiscal dos Estados Unidos e da desaceleração da China, que podem ter impacto relevante no Brasil e no mundo”, afirmou.