O mais recente capítulo da conturbada disputa entre os irmãos Alberto e David Safra perdeu o status de segredo de Justiça. Em menos de 24 horas, o juiz Luis Felipe Ferrari Bedendi da Vara Empresarial e de Conflitos Relacionados à Arbitragem do Foro Central Cível da Comarca de São Paulo deferiu o pedido feito por dois membros do Conselho de Administração do Banco Safra.
São eles André Franco de Moraes e Ricardo Cholbi Tepedino, que solicitam acesso às informações básicas sobre a instituição financeira que detém R$ 16,3 bilhões de patrimônio líquido. Franco e Tepedino ocupam as duas cadeiras de conselheiros independentes a que Alberto tem direito como acionista no Safra. As demais seis posições são indicações dos outros membros da família.
Essa divisão de cadeiras deveria servir para equilibrar os interesses dos acionistas, mas nos últimos tempos virou um problema: os indicados por Alberto ficaram isolados das decisões. Alberto passou a ser ignorado pela família a partir da briga com David - a ruptura se tornou pública quando ele deixou o comando do banco em outubro de 2019.
Desde então, os irmãos vêm medindo forças de poder. Alberto, por exemplo, ajuizou uma ação na Justiça de Nova York contra David e seu outro irmão, Jacob. Na petição, ele afirma que seus pais, Joseph (1938-2020) e Vichy, foram manipulados para diluir sua participação nos negócios da família.
O caso envolvendo a herança de Joseph Safra está longe do fim, mas o caso Americanas implodiu a crise no Conselho de Administração do banco.
Os conselheiros indicados por Alberto tomaram conhecimento pela imprensa da exposição do banco no caso Americanas - o Safra havia concedido créditos sem garantias à rede varejista no valor de R$ 2,4 bilhões, equivalente a 15% ou quase um sexto do seu patrimônio líquido.
Na petição a que o NeoFeed teve acesso, os autores afirmam que o “Conselho de Administração não tinha absolutamente nenhuma informação anterior a respeito das operações com a Americanas S.A. (nem com ninguém mais, não custa lembrar), apesar dos insistentes pedidos anteriores dos requerentes a respeito da matéria e de envolverem elevadíssimo risco, em virtude de seu valor desproporcionalmente alto em relação ao patrimônio líquido do Banco”.
Embora Franco e Tepedino participassem das convocações e dos encontros do Conselho onde também estavam presentes José Luiz Acar Pedro, Alberto Corsetti, Hiromiti Mizusaki, Leandro Micotti, Sergio Penchas e Silvio de Carvalho, conforme a última ata protocolada em 2 de fevereiro deste ano na Jucesp, as reuniões eram meramente decorativas.
Moraes e Tepedino trazem detalhes de como a falta de informação e dados do Safra era uma preocupação deles.
“Durante 14 meses, de forma individual ou conjunta, enviaram 15 cartas e manifestações ao Conselho de Administração e demais órgãos de administração do Banco, requerendo documentos, informações e providências . Em algumas dessas cartas, exerceram a prerrogativa de convocar reuniões do Conselho de Administração. Essas cartas seguiram-se às sucessivas manifestações dos conselheiros de administração em reuniões realizadas pelo órgão, sempre, porém, com resultados infrutíferos”.
A reclamação é que nenhuma das solicitações foi atendida pelo banco, que argumentava que os pedidos não eram aprovados pelos outros membros do Conselho. O caso da rede varejista foi o estopim para indicações que vinham preocupando os conselheiros indicados por Alberto Safra.
No documento, André Franco, que foi diretor do Bank Boston e do Citibank, havia manifestado em 17 de agosto de 2022 seu temor em relação à implementação de “uma política de forte expansão da carteira de crédito pela diretoria, que não foi aprovada pelo Conselho de Administração. O Safra aumentou sua carteira de crédito em cerca de 55%, passando de R$ 107 bilhões para R$ 166 bilhões, de 2019 a 2022”.
Em 10 de novembro, houve uma insistência para que a carteira de crédito se adequasse a uma expansão de 9,6% em 2022, ou o equivalente a um incremento de R$ 14,8 bilhões no curso de 12 meses. “Contudo, somente nos segundo e terceiro trimestres de 2022, houve um crescimento da carteira de crédito da ordem de R$ 22 bilhões, o que equivale a uma expansão de 14%”.
Em 3 de fevereiro, Franco e Tepedino demonstram preocupação com os riscos de crédito do Safra. Dizem eles “a partir das limitadas informações públicas disponíveis, que, diante do movimento de concentração da carteira promovido pela Diretoria, pode haver, ao menos, outros 9 devedores perante os quais o Banco tem exposição tão elevada quanto à verificada em relação à Americanas.”
Em 12 meses, os dez maiores credores do Safra passaram de R$ 16,9 bilhões para R$ 28,8 bilhões. A decisão liminar pede que todas as informações pedidas por Franco e Tepedino sejam entregues pelo banco em até cinco dias. O Safra pode recorrer.
Em nota, o Banco Safra afirma que “é uma instituição absolutamente ética, que adota as melhores práticas de governança do mercado. Essa ação é movida por dois conselheiros indicados por um acionista dissidente. O Banco Safra refuta todas as alegações e apresentará manifestação em juízo”.
A família Safra emitiu a seguinte nota: "Alberto Safra, que não se contentou em atentar contra o Banco Safra contratando o presidente e executivos do banco do próprio pai, agora processa a própria mãe e os irmãos, e alega que são os membros da família que agem contra os interesses do banco. Se trata de um ação de um membro isolado contra toda sua família".
Procurados, os advogados de Franco e Tepedino mandaram a seguinte nota: “Diante da reiterada recusa por parte da direção do Banco Safra em fornecer mínimas informações para que os conselheiros de administração Ricardo Tepedino e André Franco pudessem cumprir seus deveres fiduciários perante este último, ingressaram com ação judicial para assegurar este acesso. Seguirão com firmeza na defesa dos interesses da instituição”.
Alberto Safra não comentou.