Não é novidade no mercado de educação que o grupo americano Laureate, um dos maiores do mundo, com 865 mil alunos matriculados, está passando por uma profunda mudança de portfólio para estancar um endividamento de US$ 2,2 bilhões em sua operação global. Eles sempre trabalharam alavancados, é verdade, e isso acabou criando uma operação grande e complexa de ser administrada.
Nos últimos tempos, se desfez de unidades na Ásia e na Europa. Tanto que a companhia reduziu em US$ 453,9 milhões seu endividamento quando comparados o último trimestre de 2018 com o primeiro de 2019. Em abril deste ano, o grupo vendeu a UniNorte ao Ser Educacional, do empresário Janguiê Diniz, por R$ 194,8 milhões.
O discurso oficial é o de que a UniNorte, adquirida em 2008 – mais de dez anos atrás – ficava distante geograficamente das outras unidades do grupo, dono de marcas como Anhembi Morumbi, Business School São Paulo (BSP), e outras grifes reconhecidas nas regiões Sul e Nordeste. O fato, entretanto, é que o sinal de alerta soou na operação brasileira. E basta dar uma espiada no balanço financeiro da companhia para entender o que se passa.
A receita no Brasil caiu 10%, saindo de US$ 122,8 milhões, no primeiro trimestre de 2018, para US$ 110 milhões no primeiro trimestre de 2019. No mesmo período, a operação nacional anotou um Ebitda ajustado negativo de US$ 30 milhões. "Eles são menos eficientes do que poderiam ser", diz um executivo do setor.
Para reduzir as perdas e mudar a rota da companhia, o grupo acaba de anunciar um novo CEO no Brasil. Trata-se do executivo Marcelo Cardoso, que está no Laureate desde 2011 e vinha atuando como Chief Transformation Officer (CTO) nos últimos tempos. Ele vai substituir José Loureiro, atual presidente da Laureate Brasil, que ocupava o cargo desde 2012.
Nada mais sugestivo para uma companhia que precisa se transformar do que chamar o CTO para comandar essa mudança. “Acontecerão outras vendas, eles estão se desfazendo de ativos e vão continuar”, diz um grande empresário do setor de educação.
O Laureate tem sofrido no Brasil principalmente por dois motivos. Um deles é o mesmo que fez todos os grandes grupos educacionais perderem dinheiro: a redução drástica do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).
Em 2014, 21,3% de todos os calouros que entravam na graduação recorriam a esse financiamento. Em 2017, o percentual chegou a 5,7%. Os dados são do "Mapa do Ensino Superior no Brasil 2019", divulgado pelo Semesp, um dos sindicatos nacionais de mantenedoras de universidades e faculdades particulares no Brasil.
O outro fator que tem feito o grupo sofrer é a sua mudança de perfil. Segundo o consultor Carlos Monteiro, da CM Consultoria, a Laureate chegou ao Brasil apostando em instituições de ensino posicionadas em um segmento mais premium, como a Anhembi Morumbi e a Business School São Paulo (BSP). Depois, fez investimentos em universidades que estavam mais voltadas à classe C. É o caso da FMU, comprada em 2013 por R$ 1 bilhão.
“Do ponto de vista da estratégia, o grupo não consegue trabalhar em dois mercados sem que pague o preço pela falta de convicção”, diz Monteiro. E continua. “É como uma joalheria que vende joia e bijuteria. Ela fica marcada por vender bijuteria.” Um executivo que conhece bem o mercado não enxerga esse fator como um problema. "São marcas diferentes, o que deve ser feito é uma boa comunicação para diferenciá-las", diz ele. Ou seja, vai precisar polir bem as suas operações para voltar a brilhar.