Poucas famílias têm o sobrenome tão ligado ao varejo como os Trajano, que fundaram o Magazine Luiza, em 1957, em Franca, no interior de São Paulo. Primeiro, com a Luiza Trajano Donato. Depois com Luiza Helena Trajano, hoje à frente do conselho de administração.
E agora com Frederico Trajano, que comanda a rede que vale R$ 61,6 bilhões, e que está liderando uma expansão da companhia através de diversas aquisições. Desde 2020, foram 22 negócios, como a Hub Fintech e o e-commerce de games e tecnologia KaBum!, a maior transação da história do Magazine Luiza.
Mas existe um lugar onde o assunto varejo não tem vez para os Trajano. É na Unbox Capital, gestora fundada em 2018 pela família dona do Magazine Luiza e que tem como sócia Patricia Moraes, uma das principais banqueiras de investimentos de Brasil, tendo atuado por 22 anos no JP Morgan.
“A Unbox Capital nasceu como uma tese de diversificação dos investimentos da família Trajano. E eu disse: por que vou investir em uma coisa em que vou competir com o Magalu diretamente”, afirma Patricia ao NeoFeed.
Tanto que não há nenhuma empresa da área de varejo no portfólio da Unbox Capital. A lista conta com a Alloha Fibra (ex-EB Fibra), que está consolidando o setor de fibra óptica no Brasil; a Incognia, dona de uma solução antifraude para smartphones; e a Rock Content, de marketing de conteúdo.
Além delas, a Unbox Capital investiu também na Solinftec, uma agtech que desenvolveu uma plataforma capaz de monitorar todas as etapas da produção agrícola, e a FlorMel, de alimentos saudáveis.
A tese é simples: investir em empresas com empreendedores nas quais Patricia e a família Trajano acreditam e que tenham ambições de ir além do Brasil.
Um exemplo é a Incognia, do recifense André Ferraz, que recebeu o aporte da Unbox Capital para ir para os Estados Unidos. Outro é a Rock Content, cujo primeiro investimento financiou uma aquisição nos Estados Unidos. Em outubro deste ano, a gestora liderou a rodada série B de US$ 30 milhões na companhia de marketing de conteúdo cujo dinheiro será usado para reforçar sua presença internacional.
“Apoiamos os bons empreendedores que vencem no Brasil e tem ambição de ir aos Estados Unidos”, afirma Patricia. “Os EUA são um mercado gigante. Claro, é mais competitivo, mas se o empreendedor acredita no produto, investimos.”
Outro exemplo do jeito de investir da Unbox Capital é o que foi feito na hoje Alloha Fibra. Nesse caso, a ambição era consolidar um setor. A gestora investiu na empresa quando a tese estava sendo montada pela EB Capital, no fim de 2018.
Na época, a empresa começou com a compra da Sumicity, um provedor local que tinha 70 mil assinantes de internet de banda larga fixa. Neste ano, a operadora de fibra óptica deve atingir 1 milhão de clientes, depois de diversas aquisições. E, diante do cenário, tem a perspectiva de abrir o capital na bolsa.
Para fazer esses investimentos, a Unbox Capital não conta com um fundo tradicional. Os investidores assumem um comprometimento de capital e fazem o desembolso a cada aporte. Além dos Trajano, outros investidores são chamados a participar.
Patricia não revela o total investido até agora nas cinco empresas do portfólio. Mas diz que a gestora conta com R$ 550 milhões de ativos sob gestão. O número de empresas é baixo, porque a Unbox Capital gosta de colocar a mão na massa e ajudar as companhias em que investe, participando de comitês ou conselhos.
“Com a nossa tese, que é investir em empresas de growth, não dá para ter 20 investimentos, porque o acompanhamento é muito próximo”, diz Patricia. “Dá para ter oito, talvez dez.”
As companhias-alvos são startups maduras e a Unbox participa em rodadas séries B e C, com cheques que podem variar de US$ 5 milhões a US$ 40 milhões (neste caso, atraindo coinvestidores para a rodada).
Nesta entrevista, Patricia, que é filha de Marcus Vinicius Pratini de Moraes (ex-ministro da Agricultura de FHC), conta como foi convidada por Luiza Helena Trajano para criar a Unbox Capital, explica a origem do nome da gestora e comenta também sobre o racional dos investimentos que fez até agora.
Ela também fala do tempo que esteve à frente do JP Morgan e discute como foi atuar, durante mais de duas décadas, em um ambiente masculinizado. E chega a uma triste conclusão, ao migrar para o mercado de venture capital.
“O mercado de venture capital, na minha visão, é mais difícil de encontrar mulheres do que o mercado de investment banking. Por incrível que pareça, eu consegui piorar”, afirma.
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