O empresário Janguiê Diniz já foi engraxate, criou o grupo Ser Educacional (que vale R$ 803 milhões na B3), é autor de dezenas de livros, está à frente do Instituto Êxito (que apoia o empreendedorismo), e é um dos sócios da Bossanova Investimentos. Além disso, investe sozinho em startups – o aporte mais recente foi na Transceptar, empresa israelense de inteligência artificial em mapeamento genético

Agora, Diniz está acrescentando uma nova função a sua extensa ficha de atividades. Ele está se tornando “banqueiro” com a b.Uni, uma fintech voltada ao universo educacional anunciada pela Ser Educacional, no ano passado, que está começando a dar os primeiros passos.

“Acabamos seguindo uma tendência de mercado, onde as grandes corporações buscam fidelizar seus clientes”, diz Janguiê Diniz, fundador e presidente do conselho de administração da Ser Educacional, ao NeoFeed. “Vamos atuar na bancarização dessa parcela da população, eventualmente não inserida no mercado financeiro.”

A intenção da b.Uni é operar, neste primeiro momento, exclusivamente no ambiente da Ser Educacional, que é dona da faculdade Uninassau e é o maior grupo de educação superior do Nordeste. São mais de 12 mil funcionários e 325 mil alunos nas modalidades presenciais e online.

Os primeiros passos dessa estratégica começaram a ser dados em junho deste ano. A fintech, que opera com parceiros como Matera e Biz, pagou todos os salários dos funcionários do grupo Ser pela conta digital da b.Uni. Dois meses depois, os primeiros alunos, ainda em fase de teste, começaram a ser “embarcados” no aplicativo do banco digital.

Mas o passo mais relevante aconteceu em meados de agosto, quando a b.Uni recebeu autorização do Banco Central para criar uma Sociedade de Crédito Direto. Com isso, a fintech vai começar a oferecer mais serviços financeiros, além de uma conta digital tradicional com PIX e pagamentos de boletos, para os alunos e funcionários do grupo Ser Educacional.

João Albérico Aguiar, CEO da b.Uni

“Vamos deixar de ser um banking as a service e começar a oferecer mais produtos e serviços”, confirma João Albérico Aguiar, CEO da b.Uni e CFO do grupo Ser Educacional.

Entre os serviços que vão começar a ser oferecidos até o fim deste ano estão o crédito consignado para os funcionários, crédito pessoal, crédito estudantil e seguros (desde para o PIX até celulares e mochilas). A fintech já opera com um cartão múltiplo (débito e crédito) da Visa, através da parceria com Biz.

A oferta de crédito será feita através da estruturação de FIDCs (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios), que a Ser Educacional pretende captar no mercado. Aguiar diz que o volume, neste começo, deve ser pequeno, na casa dos R$ 30 milhões para testar a aceitação do produto em sua base de alunos e funcionários.

A meta é usar esses recursos em momentos-chaves, que são os períodos de matrículas e rematrículas, quando os alunos precisam de crédito para ingressar na universidade. “Nossa meta é conquistar 10% da base a cada semestre”, diz Aguiar.

Para atrair os correntistas para o banco digital da Ser Educacional, a b.Uni vai oferecer cashback para os alunos que pagarem as mensalidades em dia. O valor que retorna aos estudantes equivale a 2% do pagamento, limitado a R$ 10 por mês – o valor médio das mensalidades é de R$ 500.

O grupo educacional vai também criar um programa de fidelidade que dará pontos para serem usados em diversos estabelecimentos, como restaurantes, varejistas e academias. “Queremos manter o aluno como correntista”, diz Marcos Paulo da Silva Teixeira, diretor de operações da b.Uni.

O plano, no entanto, não é se restringir ao ecossistema da Ser Educacional. “Vamos gerar sinergias e ganhos no backoffice”, afirma Janguiê Diniz. “E a experiência será replicada e oferecida para outras instituições de ensino fundamental e médio.”

No primeiro caso, a estimativa do grupo Ser é conseguir uma economia de R$ 2 milhões anuais com o não pagamento tarifas de emissão de boletos e de taxas bancárias. No segundo exemplo, a competição no mar aberto deverá começar timidamente em 2023.

Outro projeto é estender a oferta de serviços financeiros aos fornecedores do grupo educacional, oferecendo crédito para capital de giro e antecipação de recebíveis.

“Faz muito sentido, pois a Ser pode explorar o seu ecossistema de uma forma diferente”, diz Willian Klein, CEO da consultoria de educação Hoper. “Um dos maiores desafios na captação dos alunos é ser rápido no processo comercial, o que inclui o financiamento.”

O caminho que começa a ser trilhado pela Ser Educacional já foi seguido por diversas outras empresas. Em especial, as de varejo. O Magazine Luiza, por exemplo, comprou a Hub Fintech e criou a Fintech Magalu. A Americanas tem a Ame Digital. E a Via, dona da Casas Bahia e Ponto, conta com o banQi.

O setor educacional conta também com fintechs que atuam fornecendo crédito para estudantes. Uma delas é a PraValer, da qual o Itaú Unibanco é um dos acionistas. Outra é a Provi, que também atua nesta área, mas recentemente demitiu mais de 20% de seus funcionários.

Os grandes grupos educacionais cotados em bolsa, como Cogna, Ânima e Yduqs, atuam através de linhas de financiamentos próprias ou através de parcerias com instituições financeiras para fornecer crédito estudantil aos seus alunos após o fim do Fies, programa federal de financiamento estudantil.

A b.Uni é mais uma das estratégias da Ser Educacional para criar novas avenidas de crescimento para além do negócio tradicional, que atingiu R$ 464,2 milhões no segundo trimestre de 2022, uma alta de mais de 20%, mas viu uma queda no lucro ajustado de mais de 25%, para R$ 31 milhões.

O grupo é dono da GoKursos, uma plataforma com mais de 8 mil cursos livres, e da Delinea, que produz conteúdo digital. Recentemente, lançou o Peixe 30, uma rede social de empregos, e conta também com a Prova Fácil, que faz gestão de provas e certificados para concursos.

A fintech, de todas as avenidas de crescimento, é que mais retorno pode trazer ao grupo educacional em longo prazo. Mas é também a que mais embute riscos. A inadimplência no setor financeiro deve crescer em 2023. E as mais afetadas devem ser as fintechs.

Klein, da Hoper Educação, lembra ainda que se fintech fracassar, pode atingir o grupo educacional. “Como eles operam um negócio que não é o tradicional do grupo, pode criar um problema inverso: um aluno insatisfeito.” Será o primeiro teste do “banqueiro” Janguiê Diniz.