Há sete anos, a OEC se viu num beco sem saída. Acuada depois de acusações de ser um dos pivôs do maior escândalo de corrupção do País, a companhia, braço de engenharia e construção da Novonor, novo nome da Odebrecht desde novembro de 2020, se viu obrigada a se transformar. 

Com a reputação maculada, e sentindo os efeitos da crise que tomou conta do setor de construção pesada nos últimos anos, a empresa colocou em marcha um plano de retomada. A primeira parte envolveu reestruturar sua governança, além de sua saúde financeira.

Agora, após receber o selo Infra + Integridade, do Ministério da Infraestrutura, a OEC parte para a segunda parte de seu plano de retomada: a conquista de novos contratos e clientes.

“A empresa diminuiu muito de tamanho durante esse período em que teve totalmente focada em se reestruturar no que se refere a integridade e governança”, diz Maurício Cruz Lopes, CEO da OEC, ao NeoFeed “Agora, precisamos voltar a crescer.”

O tombo sofrido pela companhia é significativo. A receita da maior empreiteira do País caiu da casa dos R$ 30 bilhões em 2014 para R$ 2,9 bilhões no ano passado. Antes, a empresa empregava 130 mil funcionários. Agora, são 10 mil. 

Já a holding controladora da OEC entrou com um pedido de recuperação judicial em junho de 2019, com dívidas quase alcançando R$ 100 bilhões. A OEC não foi incluída no processo.

A retomada da parte operacional é a principal missão de Lopes após o fim dos monitoramentos ordenados pelo Ministério Público Federal e as autoridades dos Estados Unidos e com os sistemas de controle e conformidade de pé.

Ele assumiu o comando da OEC em março deste ano. Com 25 anos de casa, ele passou os últimos quatro anos no Peru, onde foi enviado para substituir o diretor local em função dos acordos de leniência que foram assinados com as autoridades. Antes disso, teve passagem pela OR, braço imobiliário do grupo que não foi envolvido nas delações e acusações. 

Além dos efeitos da Lava Jato, a OEC sofreu com a crise financeira que se instaurou no setor de construção pesada, que sofreu com a redução de investimentos e os efeitos da pandemia de Covid-19, que paralisou obras e elevou os custos de produção. 

Segundo dados da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), o volume de investimento em obras no país caiu 31%, desde 2014. Considerado apenas o gasto público, a queda é de 52%

“O que aconteceu é que nos últimos anos o investimento sobre PIB indicou um percentual insuficiente inclusive para manter a infraestrutura existente no País”, diz Cruz. “O País viu uma deterioração da infraestrutura.”

Enquanto passava pelo processo de reestruturação e sentia os efeitos da crise que se abatia no setor, a OEC se concentrou em entregar obras contratadas entre 2014 e 2015. 

Mas agora, Lopes vê um ponto de inflexão para a companhia, com a retomada dos investimentos sendo puxada principalmente pelo setor privado, com muitas companhias investindo na expansão de atividades e outras tendo que começar as obras de concessões de infraestrutura nos últimos anos ou com perspectivas de competir em novos certames. 

“Já temos memorando de entendimentos assinados para participar em licitação conjuntamente, porque algumas empresas de investimento em infraestrutura precisam muitas vezes ir com um parceiro (para executar obras) para uma licitação”, afirma, sem dar detalhes sobre os acordos. 

Até o momento, a OEC incorporou R$ 5,2 bilhões em novos contratos à carteira de projetos, que somam R$ 15,1 bilhões, dividido entre Brasil e exterior. 

A empresa prevê a entrega de 15 obras até o final de 2023. Entre elas, uma nova fábrica da Eurofarma, em Minas Gerais, e o Terminal Gás Sul, para a americana New Fortress Energy, em Santa Catarina.

No exterior, a OEC conquistou dois novos contratos no aeroporto internacional de Miami, além de trechos de construção e manutenção de estradas concessionadas no Peru.

A expectativa é de que a OEC feche 2022 com um faturamento de R$ 4,2 bilhões, um aumento de cerca de 45% em relação ao resultado de 2021. 

Ainda que o setor privado tenha ganhado espaço, existe uma expectativa de ampliação dos investimentos públicos em infraestrutura, mesmo com as restrições fiscais, por conta de projetos que não atraem concessionárias e pelo fato de o País necessitar melhorar a logística. 

“Não tem como um país se desenvolver somente com empresas privadas construindo galpões e tirando dinheiro do bolso para modernizar a logística”, afirma Cruz. “Toda a infraestrutura de logística da porteira para fora não deveria ser responsabilidade dos empresários.”

Reestruturação

Além de acreditar que a expertise da OEC em engenharia é um diferencial no ganho de contratos, Lopes afirma que os mecanismos de compliance e conformidade devem ajudar a companhia em sua retomada. 

Desde que a Lava Jato apurou a existência de um cartel entre empreiteiras para fraudar licitações na Petrobras, e que também resultou na revelação de que a então Odebrecht tinha um departamento encarregado desde 2006 de pagamento de propinas e caixa 2, as empresas do grupo embarcaram num processo de reformulação. 

Em dezembro de 2016, a Odebrecht assinou um acordo de leniência com o Ministério Público Federal e acordos com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos e com a Procuradoria-Geral da Suíça para resolução da investigação sobre atos ilícitos. 

Nos termos dos acordos com o MPF e as autoridades americanas, a Odebrecht contratou, em 2017, monitores de conformidade independentes por um período de até três anos. Em novembro de 2020, o monitoramento foi encerrado. 

Ao mesmo tempo, a companhia foi tomando medidas para melhorar sua governança e de suas controladas. Uma das iniciativas definiu que pelo menos 20% dos membros dos conselhos de administração de suas controladas deverão ser independentes. 

Foi estabelecido também um conselho global para apoiar a governança das empresas e um comitê de conformidade e houve ainda a decisão de que o cargo de diretor presidente da Odebrecht não seria mais exercido por membro da família Odebrecht. No final de dezembro de 2017, Emílio Odebrecht deixa a presidência do conselho de administração. 

Além de ter conseguido encerrar o monitoramento por parte das autoridades, a OEC obteve certificações nesta frente. Uma delas foi o ISO 37001, norma internacional desenvolvida para ajudar organizações a implementar um Sistema de Gestão Antissuborno (SGAS).

Nesta terça-feira, dia 13 de dezembro, a companhia recebeu do Ministério da Infraestrutura por este trabalho o selo Infra + Integridade, iniciativa que faz parte do programa Radar Anticorrupção que visa a reconhecer empresas de infraestrutura que desenvolvam boas práticas de governança.

“É muito importante contar com esse selo do Ministério da Infraestrutura dentro do conjunto de certificados porque é a comprovação de todo o trabalho feito na empresa nos últimos anos”, diz Lopes.

Sua obtenção não representa um pré-requisito para licitações promovidas pelo Ministério de Infraestrutura, sendo que a OEC nunca esteve impedida de participar de editais e obras do governo federal, tendo conquistado seu primeiro contrato após o início da Lava Jato em 2018.

“Certamente que o que passou entre os anos de 2014 e 2016 deixou muitas dúvidas sobre a forma da empresa atuar”, afirma. “Precisávamos demonstrar tudo que aconteceu, mostrar o que foi feito, e os resultados de monitoramento que nós passamos, os selos que temos recebido são várias etapas de comprovação do que foi feito e da evolução que tivemos.” 

A grande questão, porém, é se a cultura do compliance foi de fato internalizada. Para Luiz Marcatti, sócio e CEO da Mesa Corporate, consultoria especializada em governança corporativa, essas mudanças nasceram por pressão externa e que a companhia, antes da Lava Jato, tinha uma estrutura de controle. 

“A companhia tinha profissionais de qualidade, mas as práticas não eram coerentes e em linha com o que ela professava”, diz Marcatti. “A grande questão agora é o que os controladores querem de fato e se isso será representado na prática de gestão e governança”