Califórnia - Em 2016, a Slack era uma startup que contava com uma solução de colaboração para empresas sem ser incomodada pelos gigantes de tecnologia. Naquele ano, a Microsoft resolveu encarar a companhia fundada pelo empreendedor canadense Stewart Butterfield, o mesmo que criou o site de fotos Flickr, vendido para o Yahoo por US$ 35 milhões, em 2005.
Em vez de ficar amedrontada, a Slack usou a irreverência ao publicar um anúncio de página inteira no jornal americano The New York Times, saudando a chegada da companhia de Bill Gates. “Querida Microsoft”, começava o texto. “Estamos realmente animados por ter alguma competição.”
A estratégia de Butterfield foi a mesma da Apple, na década de 1980, que também pagou por um anúncio para celebrar ironicamente a chegada da IBM no mercado de computação pessoal. A Apple, mais de trinta anos depois, tornou-se a empresa mais valiosa do mundo. Aonde será que a Slack vai chegar?
Nesta quinta-feira 20, a Slack toca o sino da Bolsa de Nova York (Nyse) avaliada em US$ 15,7 bilhões. Não se trata de um IPO convencional, pois a startup optou pela listagem direta. É a mesma estratégia adotada do serviço de streaming sueco Spotify, há cerca de um ano.
Na listagem direta, os bancos de investimentos ficam de fora. A oferta das ações é feita diretamente para o público. A vantagem é que os custos para entrar na bolsa são menores. Os riscos, no entanto, são maiores, pois não há roadshows, nem investidores institucionais para ancorarem a oferta.
O preço inicial de US$ 26, no qual os papéis da Slack começam a ser vendidos na Nyse, é apenas uma referência. Tanto que, assim que começaram a ser negociadas, elas subiram para US$ 38,50, uma alta de 48%.
“Os principais pontos positivos da empresa têm a ver com a sólida proposição de valor, a integração nativa com outros softwares, como Zoom, Dropbox, Atlassian, e, talvez o mais importante, a fidelidade dos usuários”, escreveu o analista Rishi Jaluria, da consultoria D.A. Davidson. “Os negativos são a baixa penetração em mercados que não sejam relacionados com a tecnologia. Mas a oportunidade está justamente aí”.
Fundada em 2013 em São Francisco, a Slack desenvolveu uma solução de colaboração e de mensagens usada por grandes empresas. Toda baseada na internet, a plataforma permite que companhias compartilhem informações de forma mais eficiente que o tradicional e-mail. Desde sua origem, a Slack recebeu US$ 1,4 bilhão dos principais fundos de venture capital do Vale do Silício, como Accel Partners, Founders Club, Andreessen Horowitz e General Atlantic.
No vermelho
Mas assim como boa parte das empresas de tecnologia que estão indo para a bolsa neste ano, como Uber, Lyft e Pinterest, a Slack não é lucrativa. No ano passado, o prejuízo foi de US$ 139,8 milhões. No primeiro trimestre deste ano, as perdas somaram US$ 31,9 milhões.
Os investidores que apostam em empresas de tecnologia são acostumados com o balanço no vermelho. Mas o que os preocupou foi que o crescimento desacelerou. No ano passado, a receita cresceu 82%, para US$ 400 milhões. No primeiro trimestre deste ano, aumentou 67%.
É ainda um avanço impressionante. Mas para Wall Street pode ser pouco. “Sabemos que a Slack não é lucrativa e não encontramos nenhum indício que mostre mudança neste cenário em curto ou em médio prazo”, escreveu Jaluria, em um relatório sobre a companhia.
A startup conta com 600 mil empresas usando seu serviço. Mas apenas 88 mil delas pagam uma das modalidades de assinatura, uma taxa de penetração de apenas 15%.
Na versão Standard, é preciso desembolsar US$ 6,67 por usuário ativo/mês, que inclui ferramentas como vídeo conferências em grupo, compartilhamento de tela e a possibilidade de adicionar convidados.
Na Plus, vendida a US$ 12,50 por usuário ativo/mês, soma-se as demais ferramentas o suporte técnico de 24 horas, com resposta obrigatória em até 4 horas.
Por fim, a modalidade Enterprise Grid, customizada para cada negócio, tem valor divulgado sob consulta, uma vez que uma equipe da Slack passa a ser designada apenas para a conta.
Ao contrario de 2016, quando reinava praticamente sozinha, o grande desafio da Slack agora é competir contra gigantes do setor de tecnologia, que desenvolveram soluções semelhantes.
A Microsoft, que tentou comprar a startup no passado, conta com o Teams. O Google, a Cisco e o Facebook também desenvolveram soluções semelhantes. “O aumento da competição pode fragmentar o mercado e limitar o valor da Slack”, escreveu Jaluria, da D.A. Davidson
Grandes empresas
Dentre os cases que sobressaltam o portfólio da Slack estão o da inglesa BBC, que planejou o streaming inédito, em alta definição, da transmissão da Copa do Mundo de 2018 em suas plataformas digitais. Todo o planejamento para essa ação pioneira foi coordenado pelo Slack, com canais designados e um fluxo de trabalho previamente alinhado.
Já o aplicativo de transporte Lyft faz uso da plataforma para integrar seus três times regionais, localizados em Denver, Nova York e São Francisco. Foi a maneira que a empresa de tecnologia atuante no mercado de mobilidade urbana encontrou para aumentar a produtividade de suas equipes no que diz respeito à agilidade de resposta a clientes e consumidores.
Os diretores da empresa avaliam que o Slack é mais conciso e concentrado que e-mails, além de facilitar o acesso da gerência ao andamento das macro e micro-tarefas repassadas a cada membro da companhia. Além do aumento da produtividade, a Lyft ainda bate na tecla da transparência: com o uso da plataforma, todo mundo passou a acompanhar melhor o que acontece dentro da organização.
(Atualizada às 14h00)