O presidente da Argentina, Javier Milei, deixou claro que não precisa do Congresso para salvar a economia do país, mergulhada na pior crise em 30 anos, com inflação anual de 250,5% registrada em janeiro e 57% da população na pobreza.

Em entrevista ao jornal britânico Financial Times, publicada na quinta-feira, 29 de fevereiro, Milei avisou que pretende implementar o seu plano de austeridade por meio de decretos até 11 de dezembro 2025, quando serão realizadas eleições parlamentares, alterando parte da atual composição do Congresso.

“Não precisamos do Congresso para recuperar a economia, os que votam contra são inimigos das mudanças”, disse Milei na entrevista, concedida estrategicamente na véspera da abertura do ano parlamentar.

Suas declarações foram vistas como forma de pressionar a “casta”, como o presidente argentino se refere aos políticos em geral e à oposição peronista, em particular.

No poder há menos de três meses, Milei conta com menos de 10% de apoio tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado. No começo de fevereiro, o presidente argentino viu a oposição destroçar seu pacotaço de medidas, conhecido como Lei Ônibus, que havia enviado à Câmara.

Para aprová-lo, seria necessário cortar mais de 300 dos 664 artigos originais, com propostas de mudanças em praticamente todos os setores socioeconômicos da Argentina.

Milei preferiu retirar o projeto de lei, oficialmente denominado Lei de Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos, a submetê-lo à votação, pois percebeu que, mesmo que fosse aprovado, teria de fazer mais concessões na votação do Senado.

“Existem outras reformas que podemos fazer por decreto, mudando a aplicação das leis”, afirmou. Sua estratégia, considerada arriscada por vários analistas, prevê reeditar as medidas barradas que sejam compatíveis ao formato de decreto – logo após a posse, Milei já havia baixado o Decreto de Necessidade e Urgência (DNU), com 336 leis.

Ele também espera melhorar a sua bancada no Congresso nas eleições do ano que vem. “Estamos prontos para devolver todas as reformas após 11 de dezembro de 2025”, disse. “Enviamos 1.000, mas ainda temos mais 3.000 para apresentar.”

Entre as medidas que pretende baixar por decreto, o presidente argentino citou o fim dos controles cambiais, o que segundo ele poderia abrir um círculo virtuoso de recuperação econômica.

“Poderíamos ter muito investimento, mesmo sem mudanças constitucionais”, afirmou, insistindo que os níveis historicamente baixos de investimento da Argentina significam que as empresas podem obter grandes retornos no curto prazo com apenas pequenos gastos de capital.

Superávit fiscal

O governo Milei surpreendeu ao obter, em janeiro, o primeiro superavit fiscal do país em 12 anos. Isso foi conseguido por meio da redução dos pagamentos às províncias, do congelamento de vários itens do Orçamento e do não aumento total das pensões e benefícios tendo em conta a inflação.

Na entrevista, Milei assegurou estar fazendo progressos mais rápidos do que o esperado com um ajuste fiscal tão drástico que não tinha paralelo “não apenas na Argentina, mas no mundo”, citando a redução da inflação de um pico de 25,5% ao mês em dezembro para 20,6% em janeiro, além de esperados 15% em fevereiro.

“Já evitamos a hiperinflação, nosso objetivo agora é continuar reduzindo a inflação, terminar de limpar o balanço do banco central e, na sequência, suspender os controles cambiais, o que o FMI estima ser possível até meados do ano”, disse, confiante.

Embora já tenha enfrentado uma greve geral, Milei acredita ter apoio dos argentinos. “A palavra que melhor representa este governo é esperança”, disse. “Não se sai da pobreza por magia. Você sai da pobreza com capitalismo, poupança e trabalho duro.”