Uma superagenda de política monetária mobiliza os quatro cantos do mundo nesta quarta e quinta-feira, 21 e 22 de setembro. Em dois dias, quatro bancos centrais decidem suas taxas de juros: Banco Central do Brasil, Federal Reserve (Fed), Banco da Inglaterra e Banco do Japão.
Após doze ajustes consecutivos, o Brasil deve parar de aumentar sua taxa e se estabilizar no patamar de 13,75%, o que que mantém o País como o maior pagador de juro real entre 40 economias, informa o especialista Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset Management.
Com taxa próxima de zero desde o ano 2000, o Japão deve manter seu juro em -0,1%. O Fed deve elevar sua taxa em 0,75 ponto, para o intervalo de 3% a 3,25%, mas um aumento de 1 ponto não é descartado. Já o Banco da Inglaterra deve subir o juro em 0,5 ponto, para 2,25%.
Embora o aperto monetário ocorra em ritmo distinto, o discurso das autoridades monetárias é monocórdio: aponta para a necessidade de aumentar o juro a níveis restritivos para arrastar a inflação à meta que, formal ou informal, ronda 2% nas maiores economias, ante índices de preços ao consumidor que, nos EUA e Europa, estão próximos de 10%.
Programada para quarta-feira, a definição de juro mais aguardada é a do Fed, por suas implicações globais no câmbio e nos fluxos de capital. A perspectiva de aperto monetário contínuo na maior economia do mundo fortalece o dólar em detrimento das demais moedas e já provoca uma alta histórica nas taxas dos títulos do Tesouro americano.
Nesta terça-feira, 20 de setembro, o retorno desses papéis com prazo de dois anos atingiu 3,99% - maior nível desde 2007, às vésperas da crise financeira global gerada no mercado hipotecário norte-americano.
“Ao contrário do que se viu nos últimos 20 anos, estamos em um raro momento em que as políticas monetárias estão coordenadas. Todos os bancos centrais reduziram suas taxas durante a pandemia e voltaram a aumentar em seguida”, observa Angelo Polydoro, economista da ASA Investments.
Ao NeoFeed, Polydoro lembra que a coordenação das políticas dos bancos centrais acontece porque a inflação surgiu, pós-pandemia, por escassez de bens com o aumento da demanda, quando fábricas da China pararam a produção na fase aguda da Covid-19.
Ele pondera que os bancos centrais saíram de um estágio em que avaliavam que as pressões inflacionárias eram temporárias, avançaram ao estágio em que acreditavam que o ajuste de juros não causaria danos à atividade e chegaram ao estágio atual em que não há como negar que haverá danos às economias.
Polydoro avalia que os bancos centrais perderam sua capacidade preditiva de inflação pela dimensão dos eventos ocorridos nos últimos anos.
“A bússola dos bancos centrais quebrou com os choques ocorridos com preços das commodities, que hoje recuam, mas tiveram forte alta; na avaliação dos preços de bens e mesmo de preços no setor de serviços que foram puxados pela demanda com a reabertura das economias”, afirma.
Pela dificuldade de as autoridades monetárias vislumbrarem o futuro, o economista da ASA considera arriscado acenar com o “destino final” do aumento de juros, uma vez que os bancos centrais estão revendo os orçamentos de aperto monetário e têm dificuldade, inclusive, de saber quais serão suas próximas decisões sobre a taxa de juro.
“Se a credibilidade dos BCs não ficar arranhada, a tendência será de, em algum momento e em função da desinflação, se voltar à taxa neutra de juros que, na prática, corresponde ao nível de juro em que a economia investe”, explica.
Ele alerta, porém, que mesmo a taxa neutra deverá ser mais elevada do que se viu no passado porque há disputa por capital entre os países.
“Estamos em um momento em que os países precisam investir em segurança energética, na transferência de cadeias de produção mais próximas para evitar desabastecimento devido a questões geopolíticas e também pela demanda por mais investimentos em fontes renováveis dentro da agenda ESG", diz. "Há, portanto, uma competição por capital."
Polydoro também chama atenção para os bancos centrais de países emergentes como Brasil, Chile, Colômbia e México, que acabaram tendo que agir antes dos demais e serem mais proativos, dada a necessidade de não perderem credibilidade e evitarem a indexação.
“A credibilidade não pode ser perdida, porque sem ela haverá indexação na economia”, afirma o economista, para quem todos os países emergentes, cuja história do sistema de metas de inflação é curta, estão particularmente atentos a esse risco.
Ele explica que, historicamente, quando os emergentes sofrem choques inflacionários, as expectativas de inflação de um ou dois anos são atingidas “porque os agentes entendem que essas economias ainda têm resquícios de indexação. O Brasil não é diferente de outros países em que o regime de metas está em construção”.
Em discurso em Frankfurt, a presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, indicou nesta terça-feira, 20 de setembro, que a instituição pode levar o juro para um patamar restritivo se houver evidência de que a inflação poderia desancorar as expectativas.
A inflação na Zona do Euro está em 9,1% e Lagarde diz que o BCE “vai fazer o que for preciso” para trazer o indicador ao patamar de 2%. A instituição também prevê que a economia do bloco “vai contrair no próximo ano e se recuperar em 2024”, informa a agência Reuters.
No Brasil, preveem a maioria dos analistas, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC deverá manter a Selic inalterada em 13,75% também nesta quarta-feira, 21 de setembro.
Entretanto, nos últimos dias o mercado passou a atribuir probabilidade de 25% de aumento da taxa em 0,25 ponto percentual, para 14%, informa Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra.
“Entendemos que o racional que motiva essa estimativa é atuar no canal das expectativas do mercado, porém, acreditamos ser mais efetivo um compromisso inequívoco do BC, mais duro, com a trajetória da taxa de juro real futura. Assim, vemos como provável a manutenção da Selic”, diz o economista.
Para o Fibra, apenas o cenário de moderada recessão econômica global e a consequente desinflação generalizada de preços poderia antecipar o ciclo de corte da taxa pelo Copom. Por ora, Oliveira vê a redução da Selic apenas em 2024.