O leilão de títulos do Tesouro Nacional realizado na terça-feira, 3 de dezembro, voltou a dar sinais preocupantes sobre a falta de credibilidade do governo com o mercado, que exigiu uma compensação ainda maior para a dívida atrelada à inflação.

Os títulos com vencimentos em 2027 e 2032 saíram com taxas superiores a 7% ao ano, acrescidas da variação do IPCA no período. A maior taxa foi a do título com vencimento em três anos, que ficou em 7,33%, 29 pontos-base acima do último leilão, realizado há duas semanas. Os patamares são os mais altos desde o período que marcou o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, quando a taxa chegou a 7,83%.

A piora na precificação dos títulos ocorreu pouco depois da frustração com o pacote de corte de gastos apresentado pelo governo. A avaliação dos investidores é de que, embora as medidas reduzam os gastos nos próximos anos, elas não asseguram a sustentabilidade da dívida no longo prazo. O resultado são preços mais altos para novas emissões, refletindo a percepção de risco.

Enquanto o pessimismo com as contas públicas tem elevado o custo da dívida indexada e pré-fixada, a busca por títulos pós-fixados segue firme, com forte demanda no leilão desta terça-feira, 3. A taxa do título pós-fixado com vencimento em três anos saiu levemente abaixo do consenso, em CDI + 0,04%.

“Essa maior busca pelos pós-fixados é totalmente plausível, dada a crise de credibilidade que temos vivido na questão fiscal e que impacta a colocação dos títulos do Tesouro”, afirma André Leite, economista-chefe da TAG Investimentos.

Os títulos pós-fixados são considerados menos arriscados, já que os indexados e pré-fixados têm maior exposição à marcação a mercado, o que pode acarretar perdas significativas caso o cenário fiscal continue piorando. No leilão realizado na última semana de novembro, por exemplo, a baixa demanda fez com que nem todos os lotes de títulos pré-fixados fossem vendidos.

Esse desbalanceamento na demanda coloca em risco o cumprimento do Plano Anual de Financiamento (PAF), que determina a composição da dívida pública por indexador. No início do ano, o plano previa um percentual mínimo de 24% da dívida em pré-fixados.

Em setembro, a meta foi revista para 22%. Ao fim de outubro, o percentual estava em 22,12%. Com as emissões entre novembro e dezembro, mesmo após a revisão, é provável que o Tesouro termine o ano abaixo do mínimo estipulado.

Por outro lado, os pós-fixados, que representavam 39,66% da dívida no fim de 2023, caminham para encerrar o ano acima de 46%.

André Leite alerta que essa dependência crescente de títulos pós-fixados traz efeitos adversos para a economia, dificultando a gestão de caixa do Tesouro e comprometendo a eficácia da política monetária.

“Estamos com quase 50% da dívida em títulos pós-fixados. Então, quando a taxa de juros aumenta, em vez de gerar um 'efeito pobreza' na sociedade, ajudando a controlar a inflação, ocorre o oposto: coloca mais dinheiro no bolso da população, já que eleva a remuneração dos títulos pós-fixados”, afirma o economista-chefe da TAG.

“Definitivamente, não estamos caminhando para uma composição de dívida interna ideal. Os prazos estão sendo encurtados, e a dívida está ficando cada vez mais pós-fixada. Isso é ruim, mas condizente com a falta de credibilidade”, complementa.