O governo chinês está dando mostras de que não medirá esforços para retomar o crescimento da economia do país, cujo PIB avançou 3% no ano passado, a segunda pior taxa desde 1976.

Depois de suspender abruptamente a política de tolerância zero à covid no início do ano, o governo do presidente Xi Jinping decidiu recuar das medidas adotadas em 2020 para limitar a alavancagem do setor imobiliário, cujos efeitos paralisaram o mercado de construção e venda de imóveis nos últimos anos.

Para reanimar o setor, governo está criando uma espécie de “Minha Casa, Minha Vida” chinês. Entre outras medidas, autorizou agentes econômicos a retomar vários modelos de financiamentos imobiliários.

Além disso, o governo chinês anunciou mais de US$ 100 bilhões de novos empréstimos para as incorporadoras concluírem as obras paradas, estimadas em 2,4 milhões de unidades.

O estatal Banco de Comunicações, o quinto do país, não perdeu tempo e anunciou, na sexta-feira, 17 de fevereiro, uma promoção inédita: os candidatos a mutuários de 70 anos de idade podem contrair empréstimos imobiliários com duração de 25 anos, ampliando o limite máximo de idade para saldar hipotecas para 95 anos.

De acordo com o jornal Beijing News, o principal alvo da medida não são os idosos, mas os mutuários de meia-idade, entre 40 e 59 anos, que poderiam obter uma hipoteca por 30 anos – a duração máxima permitida na China.

Segundo dados oficiais, as vendas de novos imóveis residenciais caíram 28% em 2022 para o menor nível em cinco anos. “Salvar o mercado imobiliário é salvar a economia”, disse Han Xiuyun, professor de economia da Universidade de Tsinghua, citado pelo jornal.

Furo da bolha

A promoção inusitada ilustra a guinada do governo chinês para a recuperação do mercado imobiliário, que responde por 30% do PIB (Produto Interno Bruto) e um quarto dos financiamentos bancários da China.

Os preços das moradias, que aumentaram 80 vezes em duas décadas, caíram por 15 meses consecutivos até dezembro – fruto da quebradeira do setor, que deixou US$ 1,3 trilhão em dívidas das incorporadoras desde 2020, além de milhares de obras inacabadas.

O estouro da bolha imobiliária chinesa - um processo de contínua valorização dos terrenos e dos imóveis até atingir um nível insustentável - abalou a confiança da população, em um país onde a propriedade representa 70% do patrimônio líquido das famílias chinesas.

Em Pequim, por exemplo, a proporção entre os preços médios dos imóveis e a renda familiar chegou a 25 no final de 2021, ante apenas sete nos EUA, segundo a Nordea Corporate.

O governo tem parte de culpa pela crise imobiliária, por fazer vistas grossas para o modelo de negócio adotado pelas incorporadoras para atender a demanda.

Cerca de 80% das vendas de unidades novas da última década foram de propriedades parcialmente construídas, que as incorporadoras prometeram entregar num prazo de um a três anos. A receita dessas pré-vendas se tornou a maior fonte de financiamento para novos lançamentos.

Com o início da pandemia, o ritmo das obras caiu - e as dívidas das incorporadoras subiram rapidamente. Em julho de 2020, órgãos reguladores chineses impuseram restrições aos empréstimos para reduzir os riscos financeiros e pelo menos 30 das grandes incorporadoras do país ficaram inadimplentes.

O caso mais dramático foi da gigante Evergrande, a segunda maior empreiteira da China, com mais de 1.300 projetos em 280 cidades. Desde 2020, a empresa acumulou US$ 300 bilhões em dívidas, 10% com das quais com bancos e fundos estrangeiros.

A crise se agravou no ano passado com a revolta das hipotecas, movimento dos mutuários que passaram a boicotar o pagamento das mensalidades de cerca de 300 projetos imobiliários que tiveram as obras paralisadas.