Em quase 40 anos de carreira, o economista Paulo Hartung acumulou uma longa bagagem em diversas esferas do mundo político. Foi prefeito de Vitória (ES) e, por três vezes, governador do Espírito Santo, além de ter sido eleito deputado estadual, deputado federal e senador.

Nas eleições presidenciais deste ano, seu nome chegou a ser cogitado com um dos possíveis candidatos ao pleito, o que não se confirmou. Mas se Hartung não participou diretamente dos debates dessa corrida, ele não se furta a falar das suas expectativas para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva e a fazer alguns alertas.

“Toda eleição dá uma autorização e manda recados ao eleito. A autorização que vem dessa eleição é muito limitada. Quem perdeu, perdeu forte, e representa uma parte significativa do País”, disse Hartung, durante o Fórum de Investimentos promovido na manhã desta sexta-feira, 4 de novembro, pela Bradesco Asset Management.

“A minha impressão é que o atual presidente já entendeu o jogo e foi para uma posição que qualquer um que conhece o manual da política iria”, prosseguiu. “Mas acho que o futuro presidente tem que descer do palanque. Se não fizer isso, vai tropeçar nas próprias pernas, porque o país está muito dividido.”

Para justificar esse “conselho”, Hartung ressaltou que há fundamentos que sinalizam um contexto desafiador para o Brasil em 2023 e 2024. E ambas as campanhas foram “marcadamente populistas” e abordaram superficialmente essas questões.

“Além de reunificar o país, pelo menos em parte, há uma tarefa de reancorar expectativas”, observou. “Existem contas rodando que não cabem no orçamento de 2023 e um ambiente externo que não é o que eu, como governador, e o Lula, como presidente, experimentamos em 2003.”

Dentro desse pacote, Hartung ressaltou o fato de que o Brasil retrocedeu em relação à questão fiscal e herdou um ensinamento errado da pandemia, expresso em uma disposição para “gastar com entusiasmo” e, posteriormente, arranjar uma solução para financiar essas políticas.

Um dos pontos que embasaram esse ponto da discussão foram os primeiros sinais dados a partir da articulação da equipe de transição do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva para a aprovação de uma proposta de Emenda à Constituição (PEC) para assegurar os R$ 600 do Auxílio Brasil.

“Ninguém quer discutir a reorganização de programas sociais. Todo mundo quer fazer despesa nova. Nós podemos estar iniciando esse novo governo repetindo isso”, disse Hartung. “A questão social virou um mantra para apertar o botão do gasto. O fato é que a responsabilidade social precisa estar colada na responsabilidade fiscal.”

Ao mesmo tempo, ele disse acreditar que a eleição com a margem extremamente apertada e o fato de Jair Bolsonaro sair forte do pleito podem estabelecer um freio para a irresponsabilidade fiscal. Ainda mais em um contexto no qual Jair Bolsonaro sai forte e com uma nova eleição em quatro anos.

Em contrapartida, Hartung ressaltou alguns pontos positivos a partir da definição do resultado do pleito, no último domingo. Entre eles, a repercussão internacional que, em sua visão, só encontra um paralelo na política brasileira em 1985, com a eleição de Tancredo Neves.

“Nós temos a COP 27 começando agora e uma agenda ambiental, a descarbonização, que podem nos colocar de volta ao jogo”, afirmou. “Há muita oportunidade em cima da mesa, mas os desafios que são postos exigem um exercício de uma liderança responsável.”