Depois de abrandar de forma rápida e radical a política de tolerância zero para a Covid-19 nas últimas semanas, após constatar uma queda recorde de exportações em novembro e outros sinais de contração econômica, o governo chinês emitiu mais um claro sinal de que pretende retomar o crescimento da economia a todo custo.
Conforme revelou nesta quinta-feira, 15 de dezembro, o The Wall Street Journal, citando uma fonte em Pequim, o presidente Xi Jinping encarregou He Lifeng - dirigente recém-nomeado ao principal órgão de formulação de políticas do Partido Comunista, o Politburo – de preparar um plano de crescimento “de mais de 5%” do PIB chinês para 2023.
Como chefe da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, o principal órgão de planejamento econômico da China, He já vinha estudando medidas para facilitar os controles da Covid-19, impulsionar o setor imobiliário e restabelecer a confiança entre os empresários.
He seria uma versão chinesa do ministro Paulo Guedes, o “Posto Ipiranga” do governo Bolsonaro, com a diferença de que o chinês é o responsável em colocar em prática o pensamento econômico de Xi, batizado pela mídia ocidental de “Xiconomics”.
A princípio, segundo o jornal americano, três setores da economia teriam prioridade na retomada do crescimento chinês: imobiliário, tecnologia e educação.
A expectativa de uma aceleração econômica chinesa ficou evidente no início do mês, quando foi anunciada uma queda de 8,7% das exportações do país em novembro, o pior resultado em dois anos. Outra má notícia foi a redução da produção industrial e do consumo, devido aos lockdowns impostos pelo governo ao longo do ano nas grandes cidades.
Outros indicadores divulgados nesta quinta-feira reforçaram o péssimo ano chinês. Entre eles, a queda de 5,9% nas vendas no varejo em novembro, em relação ao mesmo mês do ano anterior, e o aumento do desemprego nas grandes cidades, que subiu de 5,5%, em outubro, para 5,7% no mês passado. Enquanto isso, o investimento na construção civil, em máquinas e outros ativos fixos desacelerou.
Por causa da Covid-19 no país e da retração econômica mundial, em virtude da guerra na Ucrânia, o PIB chinês deve fechar 2022 com avanço inferior a 3%. No início do ano, a previsão era de um crescimento de 5%.
Sinais no ar
Nos últimos dias, já prevendo uma reação forte do governo chinês após o abrandamento da política contra a Covid-19, vários bancos e instituições financeiras internacionais começaram a revisar para cima suas projeções de crescimento do país para 2023.
O Standard Chartered Bank prevê um crescimento de 5,8%, enquanto os economistas do Citibank projetam que o PIB chinês avance 5,3% no próximo ano. Já o Deutsche Bank estimou um aumento do PIB econômico da China menor, de 4,5% em 2023.
O Morgan Stanley revisou sua projeção de 5% para 5,4%, mas advertiu que o crescimento de curto prazo pode ser comprometido caso a Omicron se espalhe na China após a liberação das restrições.
A rigor, independentemente do índice, a retomada chinesa só deve se materializar a partir do segundo semestre. A mensagem do governo, ao deixar vazar até um nome responsável pelo planejamento do crescimento chinês, é de que o objetivo é tentar antecipar esse avanço.
Helena Veronese, economista-chefe da B.Side Investimentos, afirma que a retomada econômica chinesa pós-Covid deve seguir o caminho percorrido pelos países ocidentais: aumento do consumo com crescimento do número de casos, à medida que as atividades são retomadas.
“O setor de serviços deve ser o primeiro a crescer de forma mais rápida", diz Veronese. "O mercado imobiliário também deve ter uma melhoria, pois a população consumiu pouco e tem recursos guardados para investir em ativos fixos.”
Em sua avaliação, a retomada do setor industrial, porém, ainda é uma incógnita, pois há gargalos na cadeia de suprimentos. A retração de exportações por causa da crise econômica no Ocidente afetou o setor industrial e a retomada deve ser lenta. A importação de commodities, por outro lado, deve crescer, beneficiando países como o Brasil.
Vários economistas temem que um boom de importação chinesa de gás natural, petróleo bruto e outras commodities para alimentar sua expansão possa causar um efeito negativo no Ocidente, com crescimento da inflação. Veronese não acredita nessa possibilidade, ao menos por enquanto.
“Só o mercado chinês não é suficiente para causar uma grande inflação global num primeiro momento", diz ela. "Os bancos centrais dos países do Ocidente estão adotando uma política monetária rígida para controlar a inflação e saberão agir.”