A terceira semana de janeiro será “curta” para o porte dos eventos previstos. A posse de Donald Trump na presidência dos EUA na segunda-feira, 20 de janeiro, é o ponto alto da agenda global e repercutirá particularmente no Fórum Econômico Mundial que tem início, em Davos, Suíça, no mesmo dia e se estende até a sexta, 24, com a participação de líderes do mundo inteiro – 60 chefes de Estado e de governo.
Na terça-feira, 21, o catalisador das atenções no Brasil será a reunião ministerial anunciada pelo presidente, caso se confirme. A expectativa de que Lula promova uma reforma no gabinete ainda em janeiro aumenta a relevância do encontro que contará com a estreia de Sidônio Palmeira, o novo ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, que já enfrentou sua primeira batalha com fake news sobre o Pix.
Até o fechamento da Coluna, segundo o Ministério da Fazenda, não havia uma posição oficial sobre a participação de Fernando Haddad no Fórum Econômico que será pautado pela “Colaboração para a Era Inteligente”. A inteligência artificial terá destaque. Mas guerras, pressões geopolíticas e clima extremo recheiam a pauta neste ano em que o Brasil lidera os Brics e a COP 30 – e não deveria estar sub-representado em Davos.
O megaevento terá a participação virtual de Trump na quinta-feira, 23 de janeiro à tarde, informam os organizadores do Fórum. Em 2018, logo após eleger-se ao primeiro mandato, dirigindo-se presencialmente a chefes de Estado, empresários, banqueiros, acadêmicos e lideranças da sociedade civil, Trump assegurou que a América estava competitiva mais uma vez ao informar a redução de imposto cobrado de empresas.
Sete anos depois, a atenção do mundo corporativo e financeiro global se volta, entre outras questões, ao tema taxação que Trump poderá lançar a parceiros comerciais.
“Tarifa já era tema presente no primeiro mandato de Trump. Mas o tom, agora, é diferente. Em 2018, o foco era econômico. Em 2025, a tarifa ganha contorno de instrumento de negociação política com uso mais amplo”, avalia Gino Olivares, economista-chefe da Azimut Brasil Wealth Management e professor do Insper.
Também por esse motivo é mais difícil calcular, a priori, a dimensão da política tarifária que Trump deve propor, diz o economista para quem está claro que a China será taxada, mas Canadá e México também são candidatos. “Talvez no contexto do NAFTA que o próprio Trump renegociou no passado. Mas, a considerar agora, uma outra realidade no comércio mundial, o nearshoring, com empresas chinesas instaladas no México para atender aos EUA. A ver, portanto, como a taxação vai se processar.”
Endividamento acelerado tem “preço”
Especialista em economia internacional e regimes cambiais, Olivares, em entrevista ao NeoFeed, observa que Trump também assume a Casa Branca em novo contexto. “Mais convicto das próprias ideias e sem a possibilidade de se reeleger, Trump poderá querer fazer em quatro anos tudo o que não fez nos quatro anos anteriores que ele julga terem sido roubados”, diz Olivares que não considera trivial o fato de o mandatário estar ladeado por um grupo diferente de apoiadores.
“O grupo mudou. No primeiro mandato era muito radical. Agora, há radicais na economia e na política, mas não radicais de extrema-direita. Desta vez, Trump está acompanhado por um grupo pragmático representado por Elon Musk e empresários do Vale do Silício. Um grupo que não parece se mover por ideologia. São homens de negócio que vão pensar no melhor para a América e para eles mesmos.”
A imigração – destaque na plataforma de Trump – cobra atenção por implicações humanitárias e econômicas. “Trump acena com deportação, mas a ameaça será concretizada na dimensão que ele indica? Em caso positivo, será de complexa realização, inclusive, por envolver várias etapas. Segregar as pessoas, prendê-las, organizar a partida e o transporte. E para onde? O desafio logístico é uma dificuldade.”
No mercado de trabalho, pontua o economista, os imigrantes ajudaram a conter a pressão inflacionária. “Estarão os EUA prontos para tirar esse ‘amortecedor’ da inflação? “Estarão os EUA preparados para um choque reverso? Tenho a impressão de que o grupo pragmático de assessores de Trump tende a propor outro termo para lidar com os imigrantes. É improvável que esse grupo esteja disposto, por exemplo, a abrir mão dos ‘cérebros’ que partiram de vários países em direção aos EUA nos últimos anos.”
Outra questão que Trump enfrentará é o endividamento do país que não é comparável ao primeiro mandato em montante ou custo de financiamento que era praticamente zero. “Um cenário que perdurou de 2008 até a pandemia, quando todos os governos se endividaram. Não poderia ser diferente, mas a conta chegou. E a exemplo do que assistimos no Brasil, nos EUA o tema fiscal está na ordem do dia.”
Olivares lembra que o endividamento parece preocupar menos, enquanto a economia está crescendo – outro ponto comum entre EUA e Brasil – porque as receitas estão garantidas. “Entretanto, se a atividade arrefecer, inclusive por força da resposta de política monetária à inflação, problemas surgirão”, observa.
“A robustez da economia americana tem custo: a inflação por lá parou de cair. No Brasil, está subindo. E a ação dos bancos centrais levará à expansão mais rápida da dívida. Se Trump cortar impostos, reprisando a receita dos republicanos, os mercados irão reprecificar a dívida, com juros a cerca de 5% e implicações deletérias para os emergentes.”
Olivares acrescenta que a América já tem a seu favor o crescimento elevado e um provável ganho de produtividade advindo da inteligência artificial. “Condição que torna o dólar mais forte. A contrapartida é a perda de valor das outras moedas. Assim, os EUA exportam inflação para o resto do mundo, o que torna o cenário para os emergentes mais desafiador. Se incluirmos as tarifas, o quadro ficará ainda mais desafiador”, alerta.