O e-mail do chefe parecia urgente. Mas, a mensagem não era clara. Para quando ele precisava dos materiais? Slides ou pontos de discussão? Qual era o prazo? Não demorou muito para que os funcionários entrassem em desespero.

Como o líder daquele departamento de marketing era novo na empresa, ninguém quis tirar as dúvidas diretamente com ele — o receio era de parecer desatento ou estúpido. Todos acharam melhor tentar decifrar o pedido lendo nas entrelinhas. E aí uma troca ensandecida de e-mails começou a circular entre a equipe. Ao cabo de uma hora e meia, apenas uma única funcionária, chamada aqui de Rita, havia lido nada menos do que 34 mensagens disparadas pelos colegas.

O caso real é usado pelos neurocientistas americanos Rob Cross e Karen Dillon como exemplo do que eles chamam de microestresse — pequenos momentos de angústia que, insidiosos, se infiltram em nossas vidas, minando a produtividade e o bem-estar. Cumulativos, costumam passar despercebidos até ser tarde demais. Seus efeitos podem ser devastadores, explodindo em quadros de depressão, ansiedade e burnout.

Para os estudiosos, o mundo vive hoje uma epidemia de microestresse. Um compromisso atrás do outro, a hiperconectividade, os alertas incessantes dos celulares, as notificações das mídias sociais, o trânsito, as demandas do dia a dia doméstico... enfim, uma rotina que todos conhecem bem.

Relativamente novo, o conceito está esmiuçado em O efeito microestresse: Quando pequenos detalhes criam grandes problemas — e como evitar isso, lançado no Brasil pela Editora Objetiva. O livro foi nomeado “ideia revelação” de 2023, pela ONG global Thinkers50, dedicada a identificar e compartilhar as melhores práticas de gestão.

Rob é professor de liderança global na Babson College, autor consagrado e cofundador da Connected Commons, consultoria especializada no desenvolvimento de processos que combinam desempenho organizacional com bem-estar individual.

Karen, por sua vez, é editora colaboradora da Harvard Business Review, professora da escola de lideranças Intermountain Leadership Institute e coautora de três livros — entre os quais Como avaliar sua vida?, best-seller do jornal The New York Times. Ela já foi eleita pela rede de empreendedorismo social Ashoka como uma das mulheres mais inspiradoras do mundo.

Em O efeito microestresse, os autores desvendam a ciência por trás dos pequenos episódios de tensão, como identificá-los e preveni-los. “Microestresse não desencadeia a resposta normal ao estresse em nossos cérebros para nos ajudar a lidar com ele”, explicam. O fenômeno escapa aos circuitos cerebrais de alerta e proteção, responsáveis por reações de defesa, como as de “luta ou fuga”.

Sua fonte também raramente é um antagonista clássico, como um cliente extremamente exigente ou um chefe rigoroso demais. Mas, pode ser deflagrado por amigos, parentes e colegas.

“Como os microestresses vêm das pessoas de quem somos mais próximos, pessoal e profissionalmente, há também camadas de complicações emocionais. Não podemos simplesmente nos livrar deles quando o dia termina. O microestresse se entranha em nossos pensamentos, mina nossa energia e desvia nosso foco. Pouco a pouco, está roubando nossa vida”, escrevem os autores.

“Microestresse não desencadeia a resposta normal ao estresse em nossos cérebros para nos ajudar a lidar com ele”, escrevem Rob Cross e Karen Dillon (Montagem com fotos de Jim Travisano e Evgenia Eliseeva)

Com 240 páginas, o livro custa R$ 79,90. E o e-book, R$: 29,90 (Imagem: Editora Objetiva)

Apesar de indetectáveis e fugazes, essa situações cobram um preço alto. As interações negativas são até cinco vezes mais impactante do que as positivas.

Um dos estudos citados por Rob e Karen mostra: o organismo de uma pessoa exposta a um episódio de microestresse, no curso de duas horas depois de uma refeição, metaboliza os alimentos de uma forma diferente que acaba adicionando 104 calorias ao que foi ingerido. Em um ano, são cinco quilos a mais na balança. E a obesidade está na base das piores doenças da contemporaneidade.

O microestresse também está associado ao aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca e a alterações hormonais e metabólicas. Como mostram os autores, a exposição contínua a essas situações acaba por comprometer ainda o desempenho no trabalho e a esgotar as relações profissionais, familiares e sociais.

Mas há esperança. Pequenas mudanças no modo como interagimos com as pessoas e na forma como lidamos com as demandas do cotidiano podem ter um impacto significativo em nosso dia a dia.

A transformação pode vir, entre outras medidas, do aprendizado de como e quando dizer “não”, do gerenciamento da tecnologia e da busca por evitar as interrupções constantes — afinal, a dificuldade de foco e concentração é causa e efeito do microestresse.

Um passo importante, defendem Rob e Karen, é a pessoa estar atenta às pressões que ela própria causa nos outros. Afinal, como dizem os neurocientistas, o que se vivencia tende a ser passado adiante. Pressionar menos significa receber menos pressão, quebrando o ciclo de transmissão de tensões.