Um dos pioneiros foi o inglês Richard Branson, dono do Virgin Group. O cofundador da Microsoft Bill Gates e o cineasta Francis Ford Coppola têm os seus. Já o francês Bernard Arnault, do conglomerado de luxo LVMH, está na disputa por um. Enquanto Larry Ellison, da Oracle, acaba de adquirir mais um exemplar para sua coleção de... hotéis.
É cada vez maior o número de “forasteiros” na indústria do turismo. Vindos dos mais diversos setores, alguns dos empresários mais bem-sucedidos do mundo descobriram na alta hotelaria um tipo promissor de investimento. E, em muitos casos, também o caminho para a realização projetos pessoais. Por que não comprar aquele hotel que traz tantas lembranças boas? Ou aquela propriedade que se presta a iniciativas de conservação ambiental? Dinheiro não lhes falta.
O lance mais recente desse movimento cabe a Ellison. Ele desembolsou estimados US$ 277 milhões pelo Eau Palm Beach Resort & Spa, resort de luxo à beira mar na Flórida. A propriedade pertencia à britânica Lewis Trust Group, que adquirira o hotel, em 2003, por US$ 67,5 milhões — valorização de 140%, já considerando a inflação ao longo dos últimos 21 anos.
O Eau Palm Beach não é a primeira investida do empresário em uma companhia de hospitalidade. Com um patrimônio avaliado em US$ 190,5 bilhões, o terceiro homem mais rico do mundo tem outros seis hotéis espalhados pela Califórnia e o Havaí, além da Flórida.
A chegada de novos players à alta hotelaria está associada, em grande parte, ao crescimento vertiginoso do turismo de luxo ao longo da última década. Avaliado em US$ 2 trilhões, o mercado global está previsto evoluir a uma taxa anual composta de 10,2%. E, em 2032, o segmento deve movimentar US$ 3,7 trilhões.
O boom vem, naturalmente, elevando as tarifas dos quartos a níveis recordes em todo o mundo, de acordo com a FCM Consulting. Somente em Cingapura, aponta o estudo, as diárias subiram, em média, 27%, no último ano.
E, no processo de adaptação aos novos tempos, enquanto a maioria dos hoteleiros tradicionais se preocupa com custos, os recém-chegados vêm com orçamentos gigantes e tempo para deixar tudo como sempre sonharam.
"Expressões de amor"
Branson, por exemplo. Seu último lançamento hoteleiro é de 2023, quando inaugurou o Son Buyola, na ilha espanhola de Mallorca — uma quinta do século 16, na cordilheira de Tramuntana, patrimônio mundial da Unesco. O empresário conheceu o lugar, cerca de 50 anos atrás, por causa de uma namorada da juventude. Comprada há mais de 20 anos, apenas no ano passado, a propriedade ficou do jeito que ele imaginara.
Mas Branson estreou na indústria do turismo, em 1979, ao comprar a Necker Island, nas Ilhas Virgens Britânicas. Em viagem de férias com a família, o empresário se apaixonou pelo lugar. De lá pra cá, muita água rolou e o império do inglês só fez crescer.
Com uma fortuna avaliada em US$ 2,7 bilhões, o empreendedor serial tem, entre ouros tantos negócios, duas empresas hoteleiras. A Virgin Hotels é composta por nove propriedades urbanas. Já a Virgin Limited Edition integra nove lodges ultraexclusivos, em lugares remotos — em julho, graças a uma parceria estratégica, os complexos entraram para o portfólio da Preferred Hotels & Resorts.
“Nós nunca ganharemos muito dinheiro com esses projetos”, comentou, no lançamento do Son Buyola. “Eles são expressões de amor.”
OK, mas dá para fazer um “dinheirinho”. As 18 propriedades das duas marcas hoteleiras de Branson registraram ganhos de US$ 20 milhões, em 2021 — o equivalente a cerca de 13,5% do lucro de US$ 150 milhões de todo o Virgin Group.
Gates, o hoteleiro
Para se ter ideia do impacto dos “forasteiros” na alta hotelaria, basta analisar a composição acionária da rede Four Seasons. Fundada em 1961, em Toronto, uma das maiores redes de hotéis de luxo do mundo é hoje controlada por Gates.
Acionista da companhia desde 1997, em 2021, por meio da Cascade, seu family office, o cofundador da Microsoft pagou US$ 2,2 bilhões ao príncipe saudita Alwaleed bin Talal e sua participação na Four Seasons passou de 47,4% para 71,25%.
Com uma fortuna avaliada em US$ 10,1 bilhões, Tilman Fertitta, CEO da Landrys e dono do time da NBA Houston Rockets, também chegou ao mercado de turismo. No fim de 2022, ele incorporou a seu portfólio de hotéis o Montage Laguna Beach, na Califórnia, em um negócio avaliado em US$ 650 milhões. “Viajo para Laguna Beach há mais de 30 anos. É um dos meus lugares favoritos”, disse ele, na ocasião.
E tem mais. O homem mais rico da Ásia, com um patrimônio de US$ 113 bilhões, Mukesh Ambani, dono do conglomerado Reliance Industries, 86ª colocada na Fortune 500, pagou US$ 98 milhões por 73% do luxuoso Mandarin Oriental New York.
Depois dele, pelo menos outros 10 bilionários asiáticos começaram a investir em hotéis, sobretudo em Cingapura, onde as chegadas de visitantes dobraram, impulsionadas sobretudo pelo retorno (e altos gastos) de viajantes chineses. Um deles é o indonésio Sukamato Tanoto, proprietário da Royal Golden Eagle, controladora da Bracell, uma das maiores produtoras globais de celulose.
Lance de US$ 300 milhões
Quem também quer avançar no turismo de luxo é o francês Bernard Arnault, presidente e diretor do LVMH. Ele acaba de entrar na corrida para adquirir, na pessoa física, o emblemático Bauer Hotel. Datada do final do século 19, a propriedade tem frente para o Grande Canal, de Veneza.
Os lances ultrapassam os US$ 300 milhões — “quase nada” para o homem mais rico do mundo, cujo patrimônio líquido está hoje em US$ 172,9 bilhões.
Outra personalidade que se rendeu aos encantos (e rendimentos) da alta hotelaria foi o cineasta Coppola. Em 1981, ele comprou um lodge abandonado em Belize para passar férias com a mulher Eleanor e os filhos. Uma década depois, decidiu abri-lo ao público. Batizada Blancaneaux, a propriedade fica em meio à selva da reserva florestal Mountain Pine Ridge.
Deu tão certo que a coleção da The Family Coppola Hideaways conta hoje com outros seis hotéis, todos administrados (com todo o zelo) pela própria família. O Jardin Escondido, em Buenos Aires, por exemplo, Coppola conheceu durante as filmagens de Tetro, de 2009.
Quando questionado sobre o motivo de investir no setor, o diretor costuma recorrer a uma das frases de Michael Corleone, personagem de Al Pacino, no magistral O Poderoso Chefão (“Não é nada pessoal, Sonny. É estritamente profissional”), para garantir: “Meus hotéis não são um negócio profissional. São algo pessoal”. Uma paixão que, até agora, tem se revelado bastante profícua.